Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1280

Sistema ‘delivery’ de informações ameaça jornais

Nieman

Título do texto de Ken Doctor

O software Uber não está revolucionando apenas o sistema de táxis em todo o mundo. A possibilidade de qualquer motorista cadastrado num site Uber poder fazer uma corrida para um cliente e ser pago por isso está desmanchando o monopólio exercido por cooperativas e donos de frotas de táxis. E não é só isso: está sendo usado como modelo para outras áreas, como revendas de carros e mais recentemente para a imprensa.

Quem primeiro mencionou a possibilidade do uso do sistema delivery para notícias contaminar todo o ambiente jornalístico foi Ken Doctor, especialista em mídias digitais do site Nieman Journalism Lab (Laboratório  Jornalístico da Fundação Nieman) . Doctor afirma que a multiplicação de projetos informativos independentes começa a tirar dos jornais e revistas o monopólio de inúmeros segmentos noticiosos.

Da mesma forma que o Uber minou o monopólio das cooperativas de táxis no transporte de passageiros capturando a simpatia dos usuários pela facilidade, rapidez e conforto, também a imprensa convencional sofreu o impacto do surgimento de sites sobre anúncios classificados, oferta de empregos e prestação de serviços. A informação a pedido e entregue de forma customizada é uma tendência em ascensão constante, a exemplo do que já acontece com os serviços de entrega a domicílio de pizza, refeições, remédios e até prestação de serviços como banho e tosa de animais de estimação.

Depois de muitas décadas de concentração numa única plataforma, a impressa, a informação está se dispersando cada vez mais entre fornecedores independentes que conquistam a simpatia dos usuários pelo fato de serem mais ágeis do que os grandes jornais no atendimento de demandas por informação personalizada e por conhecerem melhor a realidade de sua clientela.

O crescimento dos novos projetos jornalísticos segmentados enfrenta, no entanto, a enorme barreira da credibilidade. Os jornais e revistas herdaram da era analógica um capital de confiança que garante a sobrevida de empresas que estão perdendo a corrida tecnológica para novos empreendimentos digitais. As dificuldades em lidar com instalações e estratégias de gestão desatualizadas retarda a adaptação de títulos tradicionais às novas demandas do público e dá tempo para que os novos projetos criem laços de confiança com a sua clientela.

Os novos gigantes da internet, como Google e Amazon, já identificaram a tendência ao delivery e estão investindo no desenvolvimento de projetos para aproximar pessoas e prestadores autônomos de serviços como eletricista, encanador, bombeiro, informática, massagens, fisioterapia etc. O segredo da aproximação entre quem precisa e quem tem a solução está no uso da tecnologia digital móvel. Ela permite encontrar tanto o motorista disponível mais próximo do local onde você se está, como também o vidraceiro ou o chaveiro mais próximo e a qualquer horário, usando o smartphone ou tablet. Esse tipo de informação, que antes era monopólio do jornal local, agora se transformou na razão se existência de um blog ou página web individual. O site norte-americano Angie’s List foi o pioneiro nesse tipo de atividade cujo potencial de negócios é estimado em até 800 bilhões de dólares nos Estados Unidos.

Reng Chua, diretor executivo da área de mídias na empresa Thomson-Reuters, acredita que os jornais não devem tentar concorrer com os novos empreendimentos porque esta seria uma batalha perdida: “Os novatos são mais ágeis, não têm herança analógica nas costas, têm intimidade total com as novas tecnologias e contam com o apoio de investidores de risco”. Para Reng, o que os jornais locais precisam fazer para sobreviver à economia do delivery é desenvolver uma “ curadoria de informações”, ou seja, orientar os leitores mais do que procurar atender suas necessidades pontuais.

A curadoria de informações se alimenta na confiança entre jornal e seu público desenvolvida ao longo de anos para buscar uma interatividade mais intensa  visando a identificar o que o leitor realmente procura, e não aquilo que as redações acham que ele necessita. A curadoria pode ser a solução delivery para os jornais locais encontrarem uma nova inserção na realidade digital.