Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Setor livreiro encolhe em 2011

Maior livraria do país, com 143 lojas, a Nobel lançou no ano passado uma nova opção para seus franqueados: além de incrementar a loja com um café e espaço para a venda de brinquedos, eles podem oferecer também objetos de decoração. A Saraiva, que ocupa o segundo lugar, com 102 unidades, apresentou em 2011 um serviço de viagens, outro de cursos e um de artigos esportivos. A Laselva (terceiro lugar, 69 lojas), lançou em 2009 a Laselva Mix, onde vende artesanato, eletrônicos e cosméticos, entre outros.

São medidas que exemplificam tendência apresentada no novo relatório anual da Associação Nacional de Livrarias (ANL), que tem como base 333 livrarias do Brasil: a busca por diversificação em um mercado que tem registrado sucessivas quedas de faturamento. O setor livreiro, que havia crescido 10,46% em 2008, viu esse percentual cair para 9,73% em 2009 e para 9,6% em 2010. No ano passado, cresceu apenas 5,26%, abaixo da inflação no período, de 6,5%. Vários fatores contribuem para esse quadro. O primeiro, a queda no preço do livro – os dados mais recentes mostram que em 2010 o preço médio caiu 4,42% e que a queda acumulada desde 2004 é de 34%. Outro aspecto que afeta o crescimento do setor está relacionado ao primeiro: estabelecimentos menores, nos quais a venda do livro representa de 80% a 90% do faturamento, têm fechado as portas.

O número total de livrarias no país caiu de 3.511 para 3.481. As que não sucumbiram têm buscado se transformar em redes, como ocorreu com a Jalovi, a Escariz e a Maneco, diz Guto Kater, vice-presidente da ANL. As grandes redes (com mais de cinco lojas) representam 19% das lojas no país e detiveram quase metade (43,75%) do faturamento em 2011, que foi de aproximadamente R$ 2,2 bilhões.

Livro digital está presente em 24,24% das livrarias

Na maioria das lojas (70%), a venda de livros equivale a pouco mais da metade do faturamento (56,25%). “É possível traçar um paralelo com o que aconteceu com as lojas de música”, afirma Rodrigo de Castro, diretor comercial da Livraria Cultura. “A gente tem que se transformar para além da livraria. O livro tende a dividir espaço com outras categorias interligadas.” E esse processo, diz Castro, agora vive uma outra etapa: além de diversificar os produtos, busca-se adotar medidas que façam da livraria um ponto de encontro. Uma novidade em duas recentes lojas da rede, em Curitiba e no Rio, é a incorporação à livraria de uma cozinha para realização de cursos e degustações. O espaço está previsto nas três lojas que devem abrir neste ano (no Rio, Recife e a terceira em negociação).

A reinvenção parece fundamental para o setor, principalmente quando se leva em conta o impacto que o livro eletrônico pode gerar nos próximos anos. Nos Estados Unidos, as megastores tiraram de cena as pequenas lojas e, depois, foram elas mesmas vítimas da concorrência com o ambiente virtual. No ano passado, a rede americana Borders, uma das pioneiras no mercado de megastores, fechou suas portas. Restou à Barnes & Noble, que desenvolveu seu próprio e-reader, o Nook, para competir com o Kindle, da Amazon. No fim de abril, a Microsoft anunciou um investimento de US$ 300 milhões no Nook, com a criação de uma nova companhia, a Newco. A varejista conta com cerca de 25% das vendas de livros digitais nos EUA, atrás apenas da Amazon, empresa que deve desembarcar no Brasil a partir do segundo semestre deste ano.

“Acreditamos que aqui o convívio entre o livro digital e o físico será menos dramático que nos Estados Unidos”, afirma Guto Kater, da ANL. “É possível que o livro digital fomente a leitura de livros físicos e vice-versa.” A associação planeja para setembro a distribuição para pequenas e médias livrarias de um sistema que facilite a venda de livros digitais, que poderiam então ser vendidos tanto nos sites das empresas quanto nos próprios estabelecimentos. Segundo a entidade, o livro digital está presente em apenas 24,24% das livrarias. Mas, dentre as que não comercializam o produto, 88,89% pretendem começar a vendê-lo – e, mais da metade delas, ainda neste ano.

“Concorrência predatória”

O comércio eletrônico já está presente na maioria das livrarias (57,58%), embora ainda tenha um impacto muito pequeno no faturamento: não chega a 5%, na maioria dos estabelecimentos (63,17%). É o caso da Nobel. “Nossos clientes possuem ainda um perfil conservador, onde a ida à livraria determina a compra. Em 2010, tínhamos o mesmo percentual (5%). Para 2012, planejamos um crescimento para 10%”, afirma o presidente da empresa, Sérgio Milano Benclowicz.

E há também quem, diante desse cenário, opte pela ousada decisão de apostar no modelo tradicional, como faz a Argumento, que tem duas unidades no Rio. A livraria registrou um crescimento de 22% em 2011, e 80% de seu faturamento veio da venda de livros. A empresa, que pretende reforçar o conceito de livraria de bairro, não planeja abrir novas unidades nem entrar no comércio eletrônico. “Esse tipo de venda requer um investimento grande. Preferimos ter um relacionamento mais pessoal com os clientes”, diz Laura Gasparian, dona da livraria. “Os consumidores de livros têm enorme prazer em passear pelas livrarias e principalmente de conversar sobre livros, seja com os nosso livreiros, seja com outros clientes que frequentam a Argumento. E isso fará muita diferença no futuro.”

Para que essa “bibliodiversidade” do país seja preservada, uma das ideias defendidas pela ANL é a da adoção de uma tabela que estabeleça um preço único para os lançamentos durante determinado período, como ocorreu na França com a adoção da Lei Lang, em 1981. “Há uma concorrência predatória no mercado”, diz Ednilson Xavier, presidente da ANL. Ele cita as vendas diretas de editoras e distribuidoras aos consumidores e os descontos oferecidos por grandes empresas de comércio eletrônico, nas quais o livro serviria como “isca” para que o usuário se cadastre e experimente o serviço. “Isso acaba matando o canal de distribuição.”

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[Amarílis Lage, do Valor Econômico]