Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A agenda do debate ético

Elementos de Jornalismo Econômico, de Sidnei Basile (1946-2011), é muito mais do que sugere o título. O livro tem uma alentada seção sobre técnicas, sim, e sua leitura será útil a estudantes e profissionais, uma vez que elas derivam da experiência de mais de 40 anos de um dos mestres do jornalismo econômico, com passagens pela Folha de S.Paulo, pela Gazeta Mercantil e pelo Grupo Abril.

Não se trata, no entanto, apenas de um manual. A obra, no que tem de melhor e mais polêmico, propõe uma agenda para o debate da ética no jornalismo.

O autor parte do pressuposto de que, se a imprensa não é um tribunal, na prática cria as condições para o julgamento de reputações, o que torna incontornável o debate sobre a ética jornalística.

Códigos de conduta

“O problema que me parece subjacente a toda a questão ética do exercício da liberdade de expressão”, escreve Basile, “é o de que estamos enfatizando nossa liberdade de informar, enquanto não temos refletido suficientemente sobre os valores democráticos em risco quando, no afã de informar, não nos damos conta do conjunto dos demais valores fundamentais que devem reger a vida gregária.”

O autor se refere aos direitos constitucionais, como o direito à vida, à integridade pessoal e à intimidade. A pergunta é: como garantir o respeito a tais direitos sem abrir mão do direito à informação?

Num capítulo que escreveu para a edição atualizada da obra -a original é de 2002-, Basile defende que o caminho que levaria a uma resposta satisfatória passa pela autorregulação.

Até aí o autor está no terreno de um relativo consenso. Basile, porém, rechaça ideias de autorregulação que estão no ar – a zona de conforto não lhe interessa.

Ele é contra um Conselho Nacional de Jornalismo, por sua “identidade autoritária inescapável”. É contra também a adaptação da bem-sucedida experiência do Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária), por ser impraticável no jornalismo.

Basile é contra até a criação de um código de ética, porque a ética encerra uma discussão sobre o bem, e a ideia do bem “é peculiar a cada grupo de cidadãos”.

A saída, para ele, seria a criação de códigos de conduta em cada empresa, cuja observância seria monitorada por conselhos editoriais.

Obra póstuma

Basile argumenta com a lógica da livre iniciativa: empresas mais transparentes tenderiam a ser mais confiáveis para leitores, telespectadores e anunciantes.

O jornalista sabe que não é fácil fundar tal “regime de governança editorial” para disseminar “uma cultura de boa-fé dentro das redações”. O processo levaria anos, ele calcula, o que indica a urgência do primeiro passo.

Ao reunir relatos de experiências internacionais que poderiam nortear o debate, o livro póstumo de Basile é um convite à caminhada.

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[Oscar Pilagallo, jornalista, é autor de A Aventura do Dinheiro (Publifolha)]