Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

A última do Larry

Hoje o nosso ‘amigo’ Larry do NYT cometeu mais uma aberração, comentando o filme do Walter Salles sobre a aventura de Guevara e seu amigo, décadas atrás, pela América Latina. Vai ver ele não é desonesto nem mal-intencionado. Vai ver ele apenas escreve respeitando a ‘visão’ do americano médio, e confirmando pauta pré-estabelecida pelo editor. Vai ver ele é apenas um gringo defendendo o seu salário.

Ele diz que o filme do Valtinho confirma a impressão de que Che Guevara era apenas um aventureiro. Ou ele não viu o filme ou – mais provavelmente – estava bêbado. O que ele não viu é que a América Latina que o Guevara visitou continua tão – ou mais – pobre como décadas atrás. Mucha tequilla e marijuana porsupuesto, como está no clichê.

José Roberto Filippelli

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Che Today? More Easy Rider Than Revolutionary – Larry Rohter [em inglês]

Che Guevara: mais um aventureiro do que um revolucionário? – Larry Rohter [tradução do iG]



Falta de sensibilidade

A imprensa brasileira omitiu-se sobre a falta de ética profissional do repórter Larry Rohter, assim como não classificou a falta do jornal NYT como deveria. Ricardo Setti classifica de boa reportagem o serviço apresentado e baseia-se numa série de teorias e exemplos domésticos para dar validade ao seu extenso artigo, que demonstra sua falta de sensibilidade diante da esmagadora maioria da opinião pública. Larry Rohter colheu aqui pareceres e informações que remeteu à redação para, no momento que julgaram oportuno, publicar insultuosa matéria que prejudica a figura do nosso presidente da República, em franco atropelo das mais elementares regras da do jornalismo e da diplomacia, e caindo no esgoto da grosseria.

Enumerou diversos casos de reportagens sobre homens públicos nacionais que foram alvos de matérias que desmascaravam suas faltas, mas esqueceu-se de mencionar pormenores que elucidavam melhor os casos. Tocou por alto nos assuntos. O homem público fica mais exposto aos olhos de todos, mas cidadão algum tem o direito de esculhambar a vida dele, muito menos se for o presidente da República, pior ainda quando agride o pai do presidente. Para um jornalista que se preze, acima de tudo está sua idoneidade moral, que fica estampada no que escreve e lhe servirá como carta de apresentação para o resto da vida.

Marcos Pinto Basto, São Vicente, SP



Ricardo A. Setti responde

O prezado leitor Marcos Pinto Basto leu um artigo diferente do que escrevi. Em nenhum momento o objetivo do artigo foi analisar o comportamento ou a reportagem de Larry Rohter, o que, como o texto opina, a imprensa brasileira fez de maneira extensa e adequada. (R.A.S.)



Estilo Celebridade

Lendo o artigo do jornalista Ricardo Setti, e se entendi bem o que foi escrito, causou-me preocupação se isso é opinião geral e corrente entre os profissionais da área. Em primeiro lugar é preciso dizer que a imprensa não saiu engrandecida de modo algum desse caso. Aliás, ninguém saiu ganhando. Todos tiveram sua parcela de perdas, e grandes. O governo, os marqueteiros da Folha e da Veja, o cidadão comum, que teve que ‘engolir’ essas baixarias, e até mesmo a imprensa, onde faltou senso crítico. Alguns jornalistas, é certo, numa compreensível atitude corporativista, tentaram (e só tentaram!) engrandecer a classe de forma autopromocional, com o claro intuito de querer reverter o conceito que a opinião pública formou a respeito desse fantoche do NYT travestido de jornalista e estendendo a todos os outros que o apoiaram.

Também, ao meu ver, não houve ‘boa cobertura’ do episódio. O que se viu, e se leu, foram repasses de informações e retransmissões geradas na sede, o NYT, indignados que estavam com a (corajosa!) expulsão de seu pupilo. Como grande parte de nossa imprensa é ianquecentrista, serviu apenas de canal para disseminar o desdém que ‘os do norte’ têm para conosco. Se isso é cobertura, então os conceitos devem estar descontextualizados.

Agora, com respeito às investidas na privacidade das pessoas públicas, notadamente na dos políticos, certa vez ouvi de um jornalista amigo meu a noção de que os profissionais da área devem fazer uma distinção ‘do que é e do que não é notícia’. Segundo ele, tudo é informação, mas nem tudo é notícia. O profissional de jornalismo deve se preocupar com a segunda coisa. Traduzindo: consegue-se separar um bom jornalista de um vil fofoqueiro por aquilo que publica.

Pela ótica do jornalista (e espero continuar chamando-o de jornalista) Ricardo Setti, e se foi o que entendi, qualquer assunto a respeito de alguém público é notícia. Há uma linguagem subliminar no dia-a-dia das personalidades e seus entornos e isso deve ser divulgado, pois mais à frente teremos o desdobramento disso. Daria, se fosse relevante, para fazer um bom trabalho sob uma análise de Foucault em cima dessas declarações, baseado nas relações de poder que isso insere. Dessa forma, e me perdoem milhões de vezes a falta de compostura, mas até a maneira como o presidente faz xixi, ou arrota à mesa, cabe numa pauta de um jornal, ‘pois nunca se sabe quais seriam essas implicações no governo e nos destinos do país’.

Se essa forma de ver jornalismo é liberdade de expressão, então a (ridícula!) novela Celebridade da Globo é mais do que um retrato da realidade.

Alexandre Carlos Aguiar, biólogo, Florianópolis



Ricardo A. Setti responde

O prezado leitor Alexandre, com sua formação científica e a inevitável citação a Foucault, infelizmente deixa vir à tona duas tristes características de qualquer debate no Brasil que, de alguma forma, envolva política: a contaminação pelo viés – quando não o ódio – ideológico, e a tentação de desqualificar o interlocutor. Imaginemos qual seria sua reação se, numa discussão em sua área, alguém lhe dissesse que ‘espera’ continuar podendo chamá-lo de biólogo. Ele até merece enfrentar uma situação do tipo como experiência mas, como sou uma pessoa civilizada, espero que tal não lhe aconteça. (R.A.S.)

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Lula, o NYT e a privacidade dos políticos – Ricardo A. Setti



Peso morto

A mídia em geral se mobiliza horizontal e verticalmente quando se vê atingida. E esquece que o cidadão-povão agiria exatamente como o presidente, se presidente fosse. Aliás, na maioria das ocasiões não lhe interessa o que o cidadão-povão acha. Ele é apenas povão, não faz parte da elite (da qual a imprensa faz parte) que se reveza no poder. A mídia poderia ter realçado e aprofundado que para ‘liberdade ameaçada’ existe apelo às outras instituições democráticas, o que ajudaria a formar cidadãos mais esclarecidos.

Regina Célia de Araújo Ferreira, revisora de texto, Niterói, RJ