Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Anatomia de um golpe

Cambodja, Vietnã, Afeganistão, Iraque. A lista dos países que os Estados Unidos invadiram em nome da suposta defesa da democracia é bem conhecida, mas pouco se sabe sobre a gênese dessas intromissões do imperialismo americano na vida de outros povos e as raízes do terror no Oriente Médio, como conseqüência dessas invasões. Uma obra irretocável esclarece como tudo começou.

Todos os homens do xá – Um golpe americano e as raízes do terror no Oriente Médio, do jornalista americano Stephen Kinzer, narra o golpe contra o Irã em 1953, numa trama urdida por americanos e britânicos. Objetiva e fluente, a reportagem pode ser lida como um eletrizante romance de espionagem. Kinzer é um veterano correspondente do New York Times. Trabalhou em 50 países de quatro continentes e cobriu revoluções na América Central nos anos 80.

‘No Irã, quase todo mundo sabe há décadas que os Estados Unidos foram responsáveis pela derrubada do governo democrático de Mossadegh, em 1953, e pela implantação da longa ditadura do xá Mohamed Reza, um regime tirânico que desaguou, cerca de um quarto de século depois, na Revolução Islâmica de 1979’, escreve Kinzer.

Para se ter uma idéia da importância de Mohamed Mossadegh para o seu tempo, ele foi escolhido Homem do Ano de 1951 pela revista Time, desbancando concorrentes como Harry Truman, Dwight Eisenhower e Winston Churchill.

Ironicamente, foram Churchill e Eisenhower, este da parte dos americanos, aquele do lado dos britânicos, que respaldaram o golpe contra Mossadegh. Truman, o homem que autorizou o lançamento da bomba H sobre Hiroxima e Nagasaqui, nutria simpatia por líderes nacionalistas e não mostrou interesse pela derrubada do líder iraniano. Bastou deixar o poder para que a ameaça se materializasse pelas mãos de Eisenhower, seu sucessor na Casa Branca.

Trabalho sujo

‘A Operação Ajax, codinome do golpe organizado pela CIA contra Mossadegh, foi um grande trauma para o Irã, o Oriente Médio e todo o mundo colonial’, relata Kinzer. ‘Era a primeira vez que os Estados Unidos derrubavam um governo estrangeiro. Foi no Irã, em 1953, que o governo norte-americano estabeleceu seu modelo de conduta para os anos vindouros e imprimiu na mente de milhões de pessoas do mundo inteiro a imagem dos Estados Unidos’.

A anatomia do golpe é revelada por Kinzer com pormenores. Vê-se a ação do agente Kermit Roosevelt (neto de Theodore Roosevelt, 26º presidente dos Estados Unidos), da CIA, agindo em Teerã e comprando a peso de alguns milhões de dólares pessoas estratégicas que ajudariam a derrubar Mossadegh. Aclamado herói da Guerra do Golfo de 1991, o general Norman Schwarzkopf surge na história como um emissário do governo americano para tentar dobrar a resistência do xá Mohamed Reza contra a deposição de Mossadegh.

Quem quiser saber os detalhes desse trabalho sujo que lançou a semente da atual política intervencionista norte-americana, capitaneada por George W. Bush e amparada por aliados como Tony Blair (Dwight Eisenhower e Winston Churchill, na versão de 1953), não pode deixar de ler essa magnífica reportagem.

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Formando em Jornalismo pela Universidade Tiradentes (SE) e editor do Balaio de Notícias