Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Deputados se rebelam contra Ministério das Comunicações

Uma improvável aliança entre cinco integrantes de diferentes partidos – PFL, PSDB, PT, PP e PSB – da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados (CCTCI) provocou, na quarta (20/12), uma ação inédita que resultou na rejeição de todos os 82 pedidos de outorga e renovação de outorgas de radiodifusão que estavam na pauta. Entre os processos rejeitados estão as renovações das concessões da TV Aratu, afiliada do SBT na Bahia, e da TV Uruguaiana, do grupo RBS, afiliada da Globo no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina.


Aparentemente trata-se de uma reação à forma como o Ministério das Comunicações e o próprio Palácio do Planalto têm processado esses pedidos, que chegam ao Congresso repletos de irregularidades. Recentemente a outorga de uma emissora de rádio comercial FM na cidade de Panorama (SP), que já havia sido aprovada na CCTCI, teve a sua tramitação sustada na Comissão de Constituição e Justiça quando veio a público uma série de denúncias de irregularidades fiscais contra a entidade concessionária, a Igreja Renascer.


A expectativa é que a ação ocorrida na quarta-feira inaugure uma nova fase na CCTCI. Fala-se no estabelecimento de critérios que apliquem os princípios estabelecidos no Artigo 221 da Constituição. Considerada a rotina de tramitação que prevaleceu até hoje, sem a rejeição de qualquer processo encaminhado pelo Executivo, a adoção desses critérios para a avaliação dos pedidos de outorga e renovação de concessões de radiodifusão representaria um avanço histórico para o setor.


São os seguintes os pedidos rejeitados:


TV Uruguaiana (RS); TV Aratu (BA); Rádio FM Sara Nossa Terra, em Itaguaí (RJ); Emissora Planalto AM em Paulínia (SP); rádio FM JR, em Água Branca (AL); Rádio FM Marumby, em Campo Largo (PR); Rádio FM Pranchita, (PR); Rádio FM Pérola do Vale, em Jaraguá do Sul (SC); Santa Cruz FM, em Santa Rita do Passa Quatro (SP); Rádio FM Araxá (MG); Rádio Atalaia AM em Londrina (PR); Rádio Pirâmide Musical (FM) em São João (PR); Rádio Matozinho FM, em Três Rios (RJ); Rádio Igrejinha FM (RS); Rádio Difusão Sul (AM) em Erechim (RS); rádio Sociedade Cerro Azul AM (RS); Metropolitana FM em Ascurra (SC); Rádio FM em Lagoa da Pedra (MA); Rádio Marinha FM, em Bento Gonçalves (RS); Rádio Difusora Londrina (AM), em Londrina (PR); Rádio Brasil Novo (AM), em Jaraguá do Sul (SC); Rádio Difusora Ouro Verde (AM), em Curitiba (PR); Rádio FM Princesa, em Itabaiana (SE); Rádio Schappo (FM), em Imperatriz (MA); Rádio FM, em Goiatuba (GO); Rádio Continental AM, em Campo Verde (MT); Rádio Rolante FM (RS); Rádio Atalaia de Belo Horizonte AM (MG); Rádio FM Litoral, em Paranaguá (PR); Rádio Sol da América (FM) em Vista Alegre (RS); Rádio Integração Sul FM em Santana do Livramento (RS).


Foram também rejeitadas as outorgas para 49 rádios comunitárias e duas rádios educativas.


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Comissão de Comunicações confronta Hélio Costa


[Copyright TelaViva, 20/12/2006]


Na reunião ordinária desta quarta, 20, a última desta legislatura, a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados rejeitou 82 processos de TVRs (sigla que identifica as mensagens de outorga ou renovação de emissoras de rádio e televisão) submetidas ao plenário da comissão, mesmo estando todas elas com parecer favorável de seus relatores. Esta é a primeira vez que uma rejeição em massa acontece, desde que o Congresso Nacional passou a apreciar as outorgas e as renovações de emissoras de radiodifusão depois da Constituição Federal de 1988. Normalmente, a renovação é quase automática, com pouca ou nenhuma contestação ou discussão.


A rejeição dos 82 processos foi confirmada com a votação de pareceres contrários emitidos por cinco deputados presentes à sessão: Júlio Semeghini (PSDB/SP); Jorge Bittar (PT/RJ); Ricardo Barros (PP/PR); Luiza Erundina (PSB/SP) e Vic Pires Franco (PFL/PA), presidente da Comissão.


Queda de braço


A atitude dos deputados está diretamente relacionada ao descontentamento com o que os parlamentares classificam como falta de atenção do ministro Hélio Costa com o tema e com os trabalhos da comissão. Recorde-se que o ministro das comunicações resolveu bater de frente com a casa quando solicitou a retirada das 225 mensagens de RTVs que estavam paradas há anos na CCTCI sem que fosse possível aprová-las por falta de documentação. Hélio Costa retirou as mensagens e depois não deu mais satisfação aos deputados, apesar dos reiterados pedidos de informação. No começo de dezembro, estava prevista a realização de uma audiência pública com o ministro justamente para discutir os critérios para renovação das outorgas, audiência proposta pela sub-comissão especial que tinha como tarefa justamente revisar estas regras. O ministro não confirmou sua presença e a audiência foi cancelada. Há duas semanas, esta rejeição inédita só não aconteceu por um detalhe regimental. Formalmente a rejeição se deu pela dificuldade em obter informações atualizadas sobre a regularidade fiscal e social das entidades outorgadas ou que teriam suas outorgas renovadas.


E agora?


Se as propostas tivessem sido aprovados, elas seguiriam para a Comissão de Constituição e Justiça e depois para o plenário. Depois iriam ao Senado para tramitar pela Comissão de Educação e depois pelo plenário daquela Casa. Só então seriam elaborados os decretos legislativos para conceder a outorga ou a renovação. Enquanto isso, no caso de renovações, as empresas continuam a funcionar normalmente. Como as mensagens foram rejeitadas, elas vão diretamente para o plenário da Câmara, que deverá aceitar ou reformar a decisão da comissão de mérito. Para que a rejeição seja mantida, é necessário que ela seja aprovada por dois quintos dos deputados em votação nominal, conforme determina a Constituição Federal. Esta situação vai criar uma enorme dificuldade para o começo da próxima legislatura. É possível imaginar a necessidade de votar uma por uma as 83 propostas sempre em votação nominal.


Quem foi afetado


Curiosamente, mais da metade (49) das 83 mensagens rejeitadas eram de emissoras comunitárias. Catorze referiam-se a novas outorgas de emissoras de rádio sendo onze de FM comercial, duas de FM educativa e uma de OM comercial. Dezoito referiam-se a mensagens de renovação de emissoras de rádio, sendo nove FMs comerciais, oito OMs comerciais e uma única FM educativa, a que é operada pelo Governo do Distrito Federal. E finalmente, apenas duas referem-se a renovação de emissoras de televisão: TV Aratu de Salvador/BA e Televisão Uruguaiana, de Uruguaiana/RS.

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Pesquisador sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política (NEMP) da Universidade de Brasília e autor, entre outros, de Mídia: crise política e poder no Brasil (Editora Fundação Perseu Abramo, 2006)