Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Do que estamos falando

É impossível fazer uma boa reportagem – seja ela policial, de economia, um relato de guerra ou um serviço informando o que abre e o que fecha no feriado – tendo feito entrevistas ruins: boas entrevistas sempre rendem boas reportagens. O mesmo princípio vale para entrevistas ruins: é inevitável que acabem em reportagens igualmente ruins.

Boas entrevistas para jornal, no entanto, são diferentes de boas entrevistas para televisão. Da mesma forma que entrevistas ‘em pé’ não têm nada a ver com entrevistadas ‘sentadas’ – abordar o presidente da República na saída de um evento, por exemplo, ao lado de um batalhão de colegas, requer perguntas, táticas e postura bem diferentes das exigidas em uma conversa agendada no Palácio do Planalto.

Uma entrevista também pode tomar rumos muito diferentes, dependendo das razões que levaram o entrevistador a procurar o entrevistado. Se o segundo é um especialista em uma doença, digamos, ou no estudo de um determinado fenômeno social, e esse é o motivo da conversa, a tarefa do repórter será a de tentar extrair dele análises, números, estudos, exemplos de casos – ou seja, informação. Se, ao contrário, o entrevistado é um escritor, diretor de cinema ou qualquer um que possa despertar a curiosidade do leitor por sua obra ou gênio, as questões – e a maneira de abordá-las – serão outras. Aqui, a tarefa do repórter não é mais a de extrair informação, mas, sobretudo, a de mostrar quem é o entrevistado e o que ele pensa.

A base da reportagem

O jornalista Nilson Lage, professor da Universidade Federal de Santa Catarina, em seu livro A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística, classifica a entrevista, do ponto de vista do objetivo, em quatro categorias: ‘ritual’ (brevíssima, feita ‘em pé’ e que, embora possa resultar em declarações surpreendentes, quase sempre não passa de mera formalidade), ‘temática’ (em que o entrevistado fala sobre um assunto que, supostamente, domina), ‘testemunhal’ (quando ele discorre sobre algo de que participou ou assistiu) e ‘em profundidade’ (aquela em que o foco está na figura do entrevistado, na atividade que desenvolve ou na sua personalidade). É uma divisão clássica e, em certa medida, bem resolvida. Aqui, preferi simplificar e dividir a entrevista em apenas duas categorias: a de informação – que pode ser breve, longa, testemunhal ou temática – e a de perfil – aquela em que se procura, por meio de perguntas e respostas, mostrar quem é o entrevistado.

Reuni a minha experiência na profissão, quase toda baseada no jornalismo impresso, as palestras que tenho dado sobre o tema desde 2003 e a generosa contribuição de 11 jornalistas talentosos para descrever os encantos, segredos e ciladas daquilo que é a base da reportagem e, na minha opinião, seu momento mais prazeroso.

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A autora

Thaís Oyama é jornalista e está na revista Veja desde 1999. Já trabalhou na TV Globo (sucursal de Brasília), nas revistas Marie Claire e República (já extinta) e nos jornais Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo. Desde 2003, dá palestras sobre técnicas de entrevista para jornalistas e estudantes de Jornalismo.

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Jornalista