Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Livro de Nassar é debatido em relançamento

[release da editora]

‘Diante do enfraquecimento das formas tradicionais de relações públicas e de comunicação, com o objetivo de envolver os empregados e outros públicos, a história organizacional começou a se firmar como uma nova perspectiva para o reforço, principalmente, do sentimento de pertencimento dos empregados, como protagonistas fundamentais das realizações, dos bens, dos serviços e da própria sustentação dos empreendimentos.’

Este trecho, retirado da introdução do livro Relações Públicas na construção da responsabilidade histórica e no resgate da memória institucional das organizações, escrito por Paulo Nassar e cuja segunda edição foi lançada pela Difusão Editora na Livraria da Vila em São Paulo/SP, dá o tom da relevância e da transdisciplinaridade do tema. O evento, ocorrido na noite de 7 de maio, contou com um debate sobre as novas narrativas e a valorização da história e da memória no mundo contemporâneo, com a participação de Cadão Volpato, Luiz Ruffato e Massimo Di Felice.

O impacto das tecnologias digitais esteve no centro das discussões. A perda da centralidade das empresas, neste processo de múltiplos narradores de histórias e produtores de conteúdo instaurado com a internet, mostra que as interações permitem múltiplas versões da história. Questões de veracidade ou idoneidade à parte, trata-se de um momento importante de quebra de paradigmas, que não pode ser negligenciado pelas organizações.

‘Para o bem ou para o mal’

Num cenário de permanente negociação de sentidos, há uma alteração no modus operandi dos comunicadores, como, por exemplo, no enfraquecimento da definição, dos limites e do trabalho de RP via stakeholders. ‘São as novas relações públicas’, conceitua o autor Paulo Nassar. Ele é mestre e doutor em Ciências da Comunicação pela ECA-USP, onde também leciona na graduação e pós-graduação, além de ser diretor-geral da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial – www.aberje.com.br.

Massimo Di Felice, que coordena o centro de pesquisa Cepop/Atopos na USP sobre as transformações da opinião pública nos novos contextos digitais, complementa a abordagem, indicando uma alteração na relevância do conceito de líderes de opinião. Para ele, com o digital passa-se da democracia para a tecnocracia, onde quem tem acesso às tecnologias faz prevalecer sua voz independente de sua relação imediata com as organizações. ‘É uma tomada de palavra generalizada, um fato extremamente importante, uma transformação da esfera pública. Isto altera a forma de organização da sociedade, que não é mais dicotômica, centro e periferia, mas uma grande mistura’, assinala.

O uso do potencial de criação e difusão de pontos de vista na web, aliado com conceitos de memória, vai depender de preceitos éticos. Nassar relata conhecimento de demandas de clientes em que agências de comunicação são contratadas para permear suas estratégias de comunicação com a recriação de histórias passadas, buscando manipular lembranças em busca de uma nova reputação. ‘Como tudo, pode ser usado para o bem ou para o mal’.

‘Me interesso pelo que não ficou’

Seu livro, todavia, prefaciado pela professora e RP Margarida Kunsch, é recheado de bons exemplos. Dividido em quatro capítulos por 206 páginas, traz módulos que tratam da ressignificação do olhar, uma visão abrangente e crítica das relações públicas, RP e mediações organizacionais, RP e construção da memória empresarial e memória e história empresarial no Brasil (com casos como da Petrobras, Vale, BNDES, Bunge, Odebrecht e Votorantim).

O estudo da memória tem avançado em suas interfaces. Nassar relata que do tempo de prevalência da história monumental e dos museus muito já mudou, ainda que continuem sendo formatos válidos. Entre as novas vertentes de estudo e realização de projetos, estão a história com a neurologia e o efeito dos sentidos e da sua ausência, a memória com a antropologia na ligação das pessoas e suas histórias com lugares, a memória involuntária despertada pelas sensações, o vínculo da memória com a história, como no caso do Holocausto e outros acontecimentos, as narrativas publicitárias com mistura de entretenimento e história e ainda a memória e a gestão do conhecimento com a administração dos esquecimentos.

O mineiro Luiz Ruffato destaca que o escritor trabalha invariavelmente com memória. O resgate feito pelos blogs do hábito de escrever é comemorado por ele. No entanto, a suplantação tecnológica leva à obsolescência. Fazendo uma gradação dos avanços na área de música, passando por LP, fitas cassete, CD, MP3 player e os downloads de faixas, o debatedor alerta que toda a aquisição de novas oportunidades de compreender e conviver no mundo faz perder as formas anteriores. ‘Como memorialista, eu me interesso pelo que não ficou. E sobre quem é responsável pela seleção do que vai ficar’, situa.

Centro de Memória

De outro lado, o escritor, músico e jornalista Cadão Volpato não se ressente com a perda gradativa de alguns suportes, sob o benefício da comodidade, da qualidade, da variedade e da democratização de acesso da tecnologia. Primeiramente, dizendo que acha ‘perda de tempo’ a leitura de blogs em geral, para reconhecer logo depois que visita sempre um espaço especializado de cultura da cidade do Porto. Talvez o segredo seja atingir especificidades de interesse, daí jornalistas, escritores e produtores de conteúdo precisarem contentar-se com audiências menores.

Não acreditando na extinção paulatina de mídias, Di Felice lembra que o livro foi uma das primeiras mídias detonada nas previsões com a chegada da internet, o que não se comprovou. ‘Nunca se publicou tanto e nunca se leu tanto como hoje’, enfatiza, dizendo que a história da tecnologia não tem seguido o caminho das visões desenvolvidas pelo homem. O que é interessante para o pesquisador é que ‘o digital permite uma memória externa infinita, com acesso imediato a qualquer época’.

O debate também serviu para divulgar o Dia Internacional de Histórias de Vida, marcado para 16 de maio. Na data, cerca de 80 organizações de 30 países preparam atividades especiais, como mostras de vídeos, exposições e contação de histórias e encontros virtuais. No Brasil, o gerenciamento está sendo feito pelo Museu da Pessoa – www.museudapessoa.net.

A Aberje é pioneira no trabalho com a história e a memória empresarial. Ainda em 1999, preocupada com questões trazidas pelas reestruturações produtivas e patrimoniais brasileiras, entre elas as privatizações e as centenas de fusões e aquisições, promoveu o Encontro Internacional de Museus Empresariais. Já no ano seguinte, a entidade trouxe ao Brasil o historiador inglês Paul Thompson e, desde então, o tema está presente em cursos e encontros, de maneira integrada ou específica com outras áreas de atuação.

Em 2004, foi publicado o livro Memória de Empresa: história e comunicação de mãos dadas a construir o futuro das organizações. Logo depois, inaugurou o Centro de Memória e Referência, reunindo um acervo de documentos, fotos e material audiovisual dos últimos 50 anos da comunicação empresarial nacional, afora uma biblioteca de mais de 1.000 títulos da bibliografia fundamental da comunicação e das relações públicas. O CMR ainda abriga o Instituto Aberje de Pesquisas, que desde 2001 vem realizando estudos sobre o campo.

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Gerenciador do portal Mundo das Relações Públicas (www.mundorp.com.br)