Tuesday, 16 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

O 11 de Setembro nos jornais do Rio

[do release da editora]

Após quatro anos desde o atentado às torres gêmeas do World Trade Center, o jornalista Alexandre Monteiro Barboza lança o livro Imprensa histérica, informação prejudicada – Uma análise da cobertura carioca no 11 de setembro. Durante dois anos de pesquisas o autor focou o estudo nas edições extras publicadas por dois dos principais jornais brasileiros – O Globo e Jornal do Brasil. Com depoimentos inéditos de jornalistas como Ricardo Boechat, Eliane Cantanhêde, Nilson Lage, Bernardo Ajzenberg, entre outros, o livro, em formato de reportagem, levanta a questão de como a imprensa preferiu as informações oficiais e de agências de notícias, cuja campanha ideológica apontava o principal culpado, Osama bin Laden, e a suposta vítima, EUA, em vez de contextualizar e analisar os fatos, e não sua reprodução espetacularizada.

Será que a imprensa se mostrou deficiente na cobertura do 11 de setembro, mais especificamente nas edições extras? Os jornais também não conseguiram responder uma das principais perguntas: como os terroristas conseguiram furar o bloqueio da segurança portando objetos como facas, canivetes, estiletes etc?

Com base em artigos de intelectuais que criticaram a intenção da imprensa em promover gritos de guerra, poderemos acompanhar o comportamento dos jornais, influenciados pela mídia americana, e como uma posição ideológica, em seus editoriais, foi favorável à retaliação dos supostos países envolvidos no atentado.

Qual é o papel do jornal diante dessa enxurrada de informações publicadas pela TV e internet?

Essas e outras histórias estão no livro Imprensa histérica, informação prejudicada – Uma análise da cobertura carioca no 11 de setembro, com lançamento em 13 de setembro, às 19h, na Livraria Armazém Digital, Rua General Severiano, 97 – Loja 108 – Botafogo (RJ). Informações: (21) 9966-1418



Introdução

Um dos aspectos mais relevantes na análise do jornalismo é em relação aos cadernos especiais publicados no 11 de setembro de 2001. Mas outras questões foram contempladas no desenvolvimento do trabalho, considerando a abrangência dos métodos de investigação utilizados.

O estudo foi dividido em pesquisa bibliográfica e entrevistas por email, com profissionais da área de jornalismo e de ciências sociais. Ao todo, foram entrevistados sete jornalistas de alguns dos mais renomados veículos de comunicação do país e um sociólogo. Além deste conteúdo, serviram de base para a análise obras sobre jornalismo, comunicação social, história, uma enciclopédia, um dicionário de propaganda e jornalismo, e também, jornais, artigos publicados na internet e revistas. A intenção é a de não restringir o campo aqui analisado, mas permitir vislumbrar outras possibilidades de interpretação para o fenômeno investigado.

O livro foi composto de três momentos: num primeiro, há a tentativa de fazer uma retrospectiva da tragédia, suas conseqüências, detalhes sobre o atentado e informações que não foram divulgadas pela imprensa naquele dia. Também é apresentado o ambiente das redações e como um acontecimento de grandes proporções – caso do ataque às torres gêmeas – mobilizou jornalistas de todas as editorias, tradutores e articulistas, para que fosse produzida uma edição extraordinária. Além, é claro, de ter sido feita uma análise das matérias publicadas pelos jornais, dos títulos que incitavam uma guerra contra o terror e textos publicados de agências de notícias. Com base em artigos de intelectuais que criticaram a intenção da imprensa em promover gritos de guerra, poderemos acompanhar o comportamento dos jornais brasileiros, influenciados pela mídia americana, e como apresentaram uma posição ideológica, em seus editoriais, favorável à retaliação dos supostos países envolvidos no atentado.

Dos editoriais contundentes ao código de ética do profissional de jornalismo, as edições extraordinárias também mostraram as deficiências da imprensa carioca em procurar apresentar os dois lados: a vítima e o suposto culpado. Nesse segundo momento, os jornais podem ter se esquecido de contextualizar os fatos. Na verdade, o que havia sido publicado até aquele momento era o fato de o terrorista saudita Osama bin Laden ser o principal suspeito. Informações históricas sobre a cultura e pessoas passando fome nos países árabes, futuras perseguições aos residentes árabes nos EUA, e até mesmo um paralelo com a Guerra do Golfo, entre outros possíveis temas, não foram mencionados pelos jornais aqui analisados. A imprensa americana parece ter promovido uma campanha de vingança, e os jornais brasileiros acompanharam esta propaganda ideológica. Outro caso que chamou muito a atenção foi a manipulação de informações por parte da imprensa americana e o peso que ela exerce no Estado e conseqüentemente no mundo.

Na terceira parte deste trabalho, profissionais de comunicação, jornalistas e sociólogo discorreram, por meio de entrevistas pessoais, sobre os atentados ao World Trade Center e analisaram a postura da imprensa no fatídico 11 de setembro de 2001. Algumas declarações são bem significativas sobre como o tema pode ser controvertido. Perguntado sobre o porquê de uma edição extra, já que a Guerra do Golfo e a queda do Muro de Berlim não tiveram o mesmo tratamento, o jornalista Ricardo Boechat foi categórico: ‘A guerra do Golfo não se compara, em importância histórica, ao 11 de setembro. A queda do Muro de Berlim foi um dos capítulos da vitória capitalista sobre o comunismo, não seu fato detonador ou determinante. Talvez simbolize teatralmente o desfecho da luta entre os dois blocos que dividiram o poder global no século XX (mas outros episódios também carregam essa marca dramática, como o fi m da União Soviética, por exemplo). Já a Segunda Guerra não mereceu uma edição extraordinária, mas provavelmente centenas delas em todo o mundo, algo absolutamente justificável diante da magnitude do conflito. A bomba de Hiroxima, por sua vez, não terá recebido atenção menor da imprensa, quer ao seu tempo, quer por décadas seguidas, representando o encontro da Humanidade com a descoberta de sua capacidade de autodestruição total.

No caso do JB e do O Globo, não sei se foram feitas edições extras dedicadas ao confl ito 1939/1945, mas é bom lembrar que O Globo era um jornal vespertino naquela época e que, portanto, edições extraordinárias não faziam tanto sentido, já que toda a jornada do dia estava coberta por tiragens de veículos concorrentes, que saiam de manhã, à tarde e até a noite. Você parece excessivamente interessado num detalhe que até agora não consegui considerar relevante. Afinal, por que as edições extraordinárias de 11 de setembro lhe estimulam tantas dúvidas? Insisto em que sua curiosidade deve voltar-se para os jornais que não tomaram aquela iniciativa, já que todos os que o fizeram esgotaram as tiragens rapidamente, prova incontestável de que o público ansiava por mais informações e análises sobre o acontecimento’.

Segundo o professor Nilson Lage, os cadernos especiais tiveram o seu lado positivo, pois mostraram agilidade industrial. Porém, na opinião de Lage, os jornais apenas colocaram no papel informações que já haviam sido divulgadas pela TV e internet. ‘Há várias maneiras de considerar o assunto. O lado positivo das edições foi que mostraram presença no mercado e agilidade industrial. Edições bastante ricas foram preparadas (com antecedência) para o lançamento do foguete à lua, em 1968 e para outros eventos programados, mas, assim de repente, numa empresa grande como O Globo, uma edição extra é como, para um elefante, dançar o Lago dos Cisnes. O lado negativo é que nada havia efetivamente que ler ou ver, já que televisão e internet faziam a festa e a interpretação ou investigação, que são hoje a essência do jornalismo impresso, não tinham espaço-tempo para se realizar. Mas esse rio tem três lados. O terceiro. Mais importante, é que faltaram edições extras quando os americanos arrasaram o Afeganistão, quarto país do mundo em mortalidade infantil, ou faltam a cada vez que Israel ou a CIA usam helicópteros para assassinar pessoas, sem prova de culpa, sem burocracia e sem passar pelo escritório do xerife. Isso dá a medida da cotação da vida humana na geoeconomia do nosso tempo’.