Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O amadurecimento do método

Texto publicado originalmente em 24/07/2007 na edição 443 do Observatório da Imprensa e republicado nesta edição em homenagem ao pesquisador e jornalista José Marques de Melo morto no último dia 20 de junho.

O Jornalismo percorreu três fases distintas, enquanto objeto de estudo, na sociedade brasileira. [O conceito de Jornalismo aqui empregado é aquele explicitado em minha tese de livre-docência na Universidade de São Paulo (1983), aqui atualizado: ‘O jornalismo é um fenômeno universal, mas suas raízes são européias, concebido como um processo social que se articula a partir da relação (periódica/oportuna) entre organizações formais (editoras/empresas) e coletividades (públicos receptores), através de canais de difusão (jornal/revista/rádio/televisão/cinema/internet) que asseguram a transmissão de informações (atuais) em função de interesses e expectativas (universos culturais ou ideológicos)’.]

A primeira fase corresponde ao período em que a Universidade emerge como instituição nacional, na década de 30 do século XX, quando a imprensa se converte em Fonte para as ciências humanas, como procurei documentar no meu livro Estudos de Jornalismo Comparado (1972) [MARQUES DE MELO, José – Estudos de Jornalismo Comparado, São Paulo, Pioneira, 1972, p. 29-46].

Trata-se de território desbravado por Gilberto Freyre [a trilogia escrita por Gilberto Freyre – Casa Grande e Senzala, Sobrados e Mocambos, Ordem e Progresso – baseada em observações feitas em notícias e anúncios de jornais, inova metodologicamente ao evidenciar suas teses sociológicas], que confessou haver se inspirado no trabalho pioneiro de Pereira da Costa [Pereira da Costa é um dos integrantes da equipe que desbravou o conhecimento comunicacional brasileiro, elucidando enigmas que desafiaram os estudiosos da nossa imprensa no século XIX. Vide: MARQUES DE MELO, José – História do Pensamento Comunicacional, São Paulo, Paulus, 2003, p. 145-151], humanista legitimado por seus pares da intelligentsia hegemônica no século XIX [ANDRADE, Manuel Correia de – Pereira da Costa, o homem e a obra, Recife, CEPE, 2002]. Da mesma forma que fez o solitário de Apipucos, enriquecendo sua obra de estréia, outros cientistas da efêmera Universidade do Distrito Federal, como Arthur Ramos [SAPUCAIA, Antonio – Relembrando Arthur Ramos, Maceió, EDUFAL, 2003; BARROS, Luitgarde Oliveira Cavalcante – Arthur Ramos e as Dinâmicas Sociais de seu tempo, 2ª. ed., Maceió, EDUFAL, 2005], e da emergente Universidade de São Paulo, como Aniela Ginsberg [AZEVEDO, M.L.B. A Obra de Aniela Meyer-Ginsberg: uma contribuição para a História da Psicologia Social no Brasil. Tese de Doutorado, PUC-SP, 2002], valem-se dos jornais diários para demonstrar hipóteses de pesquisa.

A segunda fase pertence à conjuntura da inclusão do Jornalismo como Disciplina universitária. Com a fundação dos cursos destinados a habilitar profissionais para o exercício das atividades informativas no jornal e no rádio, mídia peculiar aos anos 40 do século passado, foi natural que a práxis jornalística despertasse interesse científico.

Avaliações periódicas

As incursões iniciais nesse terreno devem ser creditadas a Carlos Rizzini, que exerceu liderança acadêmica nas duas primeiras escolas de jornalismo do país. Tanto na escola paulista, fundada por Cásper Líbero e implantada na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em convênio com o jornal ‘A Gazeta’. Quanto na escola carioca, reivindicada pela Associação Brasileira de Imprensa – ABI, desde o início do século, mas inserida na estrutura da emblemática Universidade do Brasil, hoje conhecida como Universidade Federal do Rio de Janeiro [MARQUES DE MELO, José – Pedagogia da Comunicação, matrizes brasileiras, São Paulo, Angellara, 2006]. O protagonismo de Rizzini como pesquisador do jornalismo, transferindo para o espaço acadêmico o capital metodológico acumulado na prática da reportagem dentro das redações de jornais e revistas, encontra-se resgatado na biografia escrita por Paulo da Rocha Dias (2004) [DIAS, Paulo da Rocha – O Amigo do Rei: Carlos Rizzini, Chatô e os Diários Associados. Florianópolis, Letras Universitárias, 2004].

Danton Jobim, colega de Rizzini na escola carioca, tentou até mesmo institucionalizar a pesquisa científica como atividade basilar na formação dos futuros profissionais do jornalismo. Durante sua permanência como professor-visitante em universidades francesas e norte-americanos, ele se entusiasma com a legitimação do Jornalismo como objeto de pesquisa científica, tentando criar na UFRJ um instituto especializado em pesquisa jornalística [JOBIM, Danton – Espírito do Jornalismo, Rio de Janeiro, São José, 1960]. Mas foram tantas as barreiras encontradas na tramitação do projeto que Jobim se rendeu às dificuldades, desistindo da iniciativa e até mesmo distanciando-se da vida acadêmica [MARQUES DE MELO, JoséO pioneirismo de Danton Jobim na pesquisa jornalística brasileira, Contracampo, n. 12, Niterói, Universidade Federal Fluminense, Programa de Pós-Graduação em Comunicação, 2005, p. 7-22].

Mais persistente, ousado, sistemático, o pernambucano Luiz Beltrão capitalizou as utopias acalentadas por Rizzini, Jobim e certamente por outros jornalistas-educadores que o precederam. Coube-lhe o mérito de haver introduzido a pesquisa científica como atividade regular na formação profissional dos jornalistas no Brasil [BELTRÃO, Luiz – Aprendizagem das ciências da informação em Pernambuco e Gêneses do Instituto de Ciências da Informação, Anuário Unesco/Metodista de Comunicação Regional, n. 10, São Bernardo do Campo, 2006, p. 237-246]. Para tanto, desenvolveu projetos de iniciação científica, despertando a vocação de jovens pesquisadores da área [FELICIANO, FátimaIniciação Científica em Jornalismo, Idade Mídia, n. 3, São Paulo, UniFIAM, 2003, p. 137-144]. Criou em seguida o Instituto de Ciências da Informação – ICINFORM (1963), primeiro centro universitário da pesquisa comunicacional brasileira, em cuja agenda o Jornalismo figurou como carro-chefe, com difusão garantida através do nosso primeiro periódico científico, a revista ‘Comunicações & Problemas’ (1965) [NAVA, Rosa – Comunicações & Problemas: 40 anos da revista pioneira das ciências da comunicação no Brasil, Anuário Unesco/Metodista de Comunicação Regional, n.9, São Bernardo do Campo, 2005, p. 151-170].

A terceira fase da conversão do Jornalismo em objeto de estudo científico deu-se em 1967, quando a Pesquisa Institucionalizada encontrou locus favorável na Escola de Comunicações Culturais da Universidade de São Paulo. Ao inaugurar seus programas de Jornalismo, tanto na graduação (Bacharelado) quanto na pós-graduação (Doutorado), a ECA-USP passou a desenvolver projetos integrados de ensino, pesquisa e extensão. Sua equipe docente fundadora, trabalhando em regime de dedicação exclusiva, engajou-se compulsoriamente no programa de doutoramento, desenvolvendo trabalhos individuais de pesquisa científica aplicada. A colheita da primeira safra deu-se em 1973, quando a instituição diplomou seus primeiros Doutores em Jornalismo [LOPES, Maria Immacolata Vassalo de – Diversidade & Interdisciplinaridade: teses e dissertações: Ciências da Comunicação, ECA-USP – 1972-2002, São Paulo, ECA-USP, 2003].

Desde então, o Jornalismo vem sendo cultivado cientificamente nas universidades brasileiras. Sua natureza tem merecido avaliações periódicas, como, por exemplo, as que foram feitas por Goldstein (1983) [GOLDSTEIN, Gisela TaschnerA pesquisa sobre jornalismo impresso, In: MARQUES DE MELO, José – Pesquisa em Comunicação no Brasil: tendências e perspectivas, São Paulo, Cortez/Intercom, 1983, p.15-19], Marques de Melo (1999) [MARQUES DE MELO, José – A pesquisa em jornalismo no Brasil – trajetória e perspectivas, In: LOPES, Maria Immacolata V. – Vinte anos de ciências da comunicação no Brasil, São Paulo, Intercom / UNisanta, 1999, – p.117-123], Moreira (2005) [MOREIRA, Sonia Virginia – Journalism Research in Brazil: Trends and New Challenges, Brazilian Journalism Research col. 1, n.2, Brasilia, SBPJOR, 2005, p. 9-24] e Mota (2005) [MOTA, Luiz Gonzaga – A pesquisa em jornalismo no Brasil: paradigmas em confronto, In: LOPES, MARQUES DE MELO, MOREIRA & BRAGANÇA, ORGS. – Pensamento Comunicacional Brasileiro, São Paulo, INTERCOM, 2005, p. 16-33] e Marques de Melo (2006) [MARQUES DE MELO, José – Journalistic Thinking: Brazil’s Modern Tradition, Lecture delivered on November 5th, 2006, in Porto Alegre, Brazil, during the I Journalism Brazil Conference, organized by the Brazilian Society of Journalism Scholars (Sociedade Brasileira dos Pesquisadores de Jornalismo – SBPJor)., Porto Alegre, UFRGS, 2006].

Experiência própria

Neste início do século XXI, o campo acadêmico do Jornalismo vivencia uma conjuntura de fortalecimento dentro do nosso espaço universitário. Evidência disso é o lançamento de livros escritos por pesquisadores situados em diferentes partes do território nacional, difundindo as pesquisas concluídas, bem como a publicação de um punhado de revistas científicas que nutrem o debate sobre questões teóricas e metodológicas. [Estão em circulação 4 periódicos científicos brasileiros, especializados em Jornalismo: Pauta Geral (Salvador), Estudos de Mídia e Jornalismo (Florianópolis), Brazilian Journalism Research (Brasília) e Pensamento Jornalístico Brasileiro (São Paulo)]

Os estudiosos da área contam ainda com um fórum específico para a difusão e a crítica do conhecimento novo produzido nas universidades: a SBPJOR – Sociedade Brasileira de Pesquisadores do Jornalismo. Preservam também espaços segmentados no âmbito das sociedades de ensino e pesquisa que aglutinam todas as disciplinas das ciências da comunicação: o Núcleo de Pesquisa em Jornalismo da INTERCOM – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação – e o Grupo de Estudos em Jornalismo da COMPÓS – Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação.

Essa micro-comunidade cognitiva defronta-se com problemas inerentes à dinâmica da macro-comunidade científica, entre eles a validação dos conhecimentos que produz no cotidiano. Por isso mesmo, para legitimar-se institucionalmente necessita reafirmar a sua identidade intelectual. Por outro lado, para garantir sua continuidade no tempo precisa transferir às novas gerações os ritos e valores que lhe dão sentido.

A circulação de textos destinados a disseminar as experiências acumuladas periodicamente pelos cientistas em ascensão tem a finalidade de motivar os jovens candidatos ao claustro acadêmico. Trata-se de engajá-los de modo consciente nas tarefas investigativas, assumindo uma postura coletiva. Por mais que a criatividade permaneça como requisito indispensável à renovação do trabalho científico, se torna necessário cultivar hábitos que reproduzam os padrões hegemônicos, reguladores da vida em comunidade.

Tal sintonia entre os iniciantes da pesquisa científica e os pesquisadores amadurecidos representa fator decisivo para a formação de novos quadros. Cabe a estes a responsabilidade de atualizar os procedimentos vigentes, instituindo paradigmas capazes de corresponder às exigências da sociedade em processo permanente de transformação.

Contudo, a adoção de novos procedimentos teóricos e metodológicos depende de variáveis aleatórias. Em face disso, cabe aos interlocutores que se assumem como vanguarda produzir exposições eficazes sobre os mesmos, embasadas em argumentos convincentes, periodicamente revistos.

Partindo do pressuposto de que as ‘estratégias metodológicas’ correntes nas pesquisas brasileiras ‘que tomam como objeto o jornalismo’ denotam uma ‘insipiência do discurso sobre o método’, as professoras Marcia Benetti (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e Cláudia Lago (Universidade Anhembi-Morumbi – SP) julgaram oportuno organizar uma coletânea que incluísse ‘autores de formações e campos distintos’.

Cada um deles foi motivado a sintetizar sua própria experiência na construção dos objetos de pesquisa, justificando a conseqüente ‘escolha de técnicas’ capazes de conduzir à coleta de dados e à análise dos resultados. Todos foram instados a tornar transparentes os ‘paradigmas teóricos’ em que se embasam, explicitando de modo indireto as respectivas ‘visões de mundo’,

Romper o gueto

A equipe de autores é constituída por dois grupos intelectuais. Um deles integrado por jornalistas que realizaram estudos doutorais em universidades européias (4) e norte-americanas (2). O outro formado por jovens doutores (7) e mestres (2) titulados por universidades brasileiras.

O produto final corresponde a um leque de depoimentos elucidativos e instigantes sobre as opções feitas pelos pesquisadores no transcurso das respectivas carreiras acadêmicas. Seja para assimilar conhecimentos estocados no âmbito das ciências sociais. Seja para aplicá-los no estudo de objetos jornalísticos. Trata-se de um quadro amplo e polifacético.

Inclui desde acuradas revisões de literatura, úteis aos pesquisadores do Jornalismo para discernir fenômenos típicos da sociedade globalizada, como é o caso de Sônia Serra em relação à Economia Política da Comunicação. Mas também questionamentos metodológicos, como o que apresenta Cláudia Lago sobre a observação participante, focalizando a transposição de recursos típicos da Antropologia para o estudo do Jornalismo.

Pela natureza utilitária e pelo caráter didático, ganham realce, no conjunto da obra, os capítulos escritos por Heloiza Golbspan Herscovitz e por Isabel Ferin Cunha. O primeiro sobre as vantagens e desvantagens da análise de conteúdo como instrumento para fazer inferências a respeito da forma e da essência das representações midiáticas. O segundo sobre o tratamento estatístico de dados coletados no campo como requisito fundamental para a credibilidade científica dos estudos jornalísticos.

São igualmente valiosos os relatos a propósito das apropriações do referencial teórico made in USA, para o exame de fenômenos típicos da realidade brasileira, feitas por Luis Martins da Silva e Alfredo Vizeu.

Martins deglute macunaimicamente o conceito de agenda setting no espaço público para reapresentá-lo com o jeitinho brasileiro do contra-agendamento. Trata-se de um exercício típico do ‘laboratório de mestiçagem’ em que se converteu historicamente o Brasil, no dizer de Arthur Ramos [pioneiro das ciências sociais no Brasil, Arthur Ramos desenvolveu o conceito de ‘mestiçagem’ em livro publicado em Paris, em 1949, durante a época em que dirigiu o Departamento de Ciências Sociais da UNESCO; sua tradução em língua portuguesa esta disponível na Coleção Nordestina – RAMOS, Arthur – A Mestiçagem no Brasil, Maceió, EDUFAL, 2004], permitindo o cruzamento daquelas matrizes cunhadas por McCombs & Shaw e por Habermas, mas temperadas pela noção luso-brasileira de intersubjetividade (construída por Boaventura Santos e reciclada por Eduardo Meditsch) para gerar ‘contra-fluxos’ capazes de remar contra a maré.

Vizeu reflete de modo perspicaz a teoria etnoconstrucionista (newsmaking), discutindo, a partir da sua própria experiência investigativa, os critérios de ‘noticiabilidade’ vigentes no telejornalismo brasileiro. Sua percepção é a de que a ‘trama dos fatos’ decorre de ‘acordos implícitos’ feitos dentro das ‘redações’, constrangendo os jornalistas através de ‘rotinas de trabalho’ que padronizam seus relatos a partir de fontes consensuadas pelos ‘agentes das redes (networks)’.

As interfaces do Jornalismo com a História e as Ciências da Linguagem são explicitadas por Richard Romancini, Marcia Benetti, Luiz Gonzaga Motta, José Luiz Aidar e Sérgio Bairon. Enquanto Romancini inventaria as utilizações do método histórico pelos jornalistas-pesquisadores, Benetti e Motta fazem alentadas incursões nas fontes que abrem caminhos para a compreensão dos relatos jornalísticos na vertente lingüística da Análise do Discurso ou na perspectiva literária da Narratogia. Por sua vez, Aidar e Bairon enveredam por trilhas semióticas para desvendar as representações contidas nas capas da revista ‘Veja’.

Destacam-se, finalmente, os capítulos referentes à pesquisa de ponta, ou seja, ao jornalismo digital.

Zélia Adghirni e Francilene Moraes revisitam o conceito de periodicidade instituído pelo alemão Otto Groth e resgatado pelo português Antonio Fidalgo para avaliar a questão da temporalidade na Internet. Elas chegam à conclusão de que a Internet preserva os relatos jornalísticos convencionais da imprensa, formatados através da pirâmide invertida, ao mesmo tempo em que se mostra permeável a mutações dinâmicas, ampliando o espaço da memória jornalística.

Elias Machado e Marcos Palácios relatam o modelo híbrido construído pelo Grupo de Pesquisa de Jornalismo On-line da Universidade Federal da Bahia, combinando procedimentos quantitativos e qualitativos para compreender e conceituar o processo de produção jornalística no ciberespaço. Além de adotar diretriz de natureza cumulativa (consolidando e revisando o conhecimento registrado) e coletiva (articulando pesquisadores em diferentes estágios cognitivos), o GJOL optou pela estratégia comparativa (atuando em rede e mobilizando grupos situados em distintos espaços nacionais), bem como pela pesquisa aplicada (transferindo imediatamente o conhecimento validado para uso didático em jornais-laboratório ou para teste experimental em agências noticiosas). Trata-se de contribuição relevante para reduzir a distância entre teoria e prática e para sinalizar que a pesquisa universitária pode romper a inércia que a tem relegado ao papel de prisioneira do gueto acadêmico. [O conceito de gueto acadêmico está esboçado em MARQUES DE MELO, José – Jornalismo Brasileiro, Porto Alegre, Sulina, 2003, p. 162-171.]

Conquista de legitimação

Os autores reunidos nesta coletânea fazem parte da geração que, a partir dos anos 90, vem conquistando espaços significativos na vanguarda da academia brasileira. São representantes das diferentes correntes teóricas que disputam a liderança dos estudos jornalísticos. [A propósito dessas correntes teóricas, vale a pena consultar o ensaio ‘Trajetórias da pesquisa em comunicação’, escrito por RUDIGER, Francisco – Ciência Social Crítica e Pesquisa em Comunicação, São Leopoldo, Editora Unisinos, 2002.] A leitura de suas anotações metodológicas ajuda a compreender os rumos que está tomando a pós-graduação na área. Certamente sua publicação servirá de estímulo para que as correntes aqui não representadas tomem idêntica iniciativa, no sentido de explicitar seus enraizamentos epistemológicos e suas estratégias investigativas.

Pois o fortalecimento do Jornalismo como disciplina universitária depende fundamentalmente da sua validação pelos agentes púbicos atuantes em organismos oficiais de credenciamento, avaliação e certificação de qualidade. Esses pares acadêmicos, geralmente ancorados em disciplinas conexas ou distantes, recorrem com freqüência a indicadores universais para emitir parecer sobre o mérito dos projetos de pesquisa ou dos seus relatórios finais.

O propósito deste livro é justamente o de incitar os jovens pesquisadores, especialmente aqueles engajados em programas de mestrado e doutorado, a buscar competência metodológica que os habilite a ascender academicamente, sem perder sua identidade jornalística. Nesse sentido, trata-se de obra lúcida e abrangente, organizada a partir de múltiplas apropriações de objetos de interesse dos profissionais da área, bem como de outros agentes sociais.

As professoras Marcia Benetti e Cláudia Lago estão cobertas de razão ao suscitar a fragilidade do ‘discurso sobre o método’ constante dos documentos produzidos pela nossa micro-comunidade de pesquisadores do Jornalismo.

Não basta fazer pesquisa de qualidade, focalizando temas relevantes e problemas cruciais. É preciso explicitá-la de modo compreensível, favorecendo sua imediata assimilação pelos agentes profissionais que poderão fazer aplicações imediatas no interior do sistema produtivo.

Mas não se pode negligenciar a exposição das estratégias metodológicas e até mesmo das opções taxonômicas feitas no processo de construção das hipóteses de trabalho. Este é um requisito imprescindível para o diálogo com interlocutores externos, muitos deles responsáveis pela tomada de decisões sobre o fomento científico, cujas leituras são feitas de acordo com códigos transdisciplinares.

Apesar de o método científico adequar-se necessariamente ao objeto pesquisado, justificando o fortalecimento das identidades acadêmicas, na verdade a linguagem científica é uma só, validada por colégios invisíveis situados em diferentes quadrantes da geografia.

Ficar atento a esse detalhe constitui o ponto de partida para a obtenção de coeficiente positivo de comunicabilidade entre pesquisadores de uma mesma área, dentro do mundo acadêmico. Mas também para a conquista de legitimação satisfatória por parte de disciplinas ainda em fase de reconhecimento institucional, como é o caso do Jornalismo.