Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Sobral Pinto e a Justiça

Ferdinando I, de Habsburgo (1502-1564), tem uma frase que por si só vale por uma Constituição democrática: ‘Faça-se justiça e pereça o mundo.’ O Judiciário brasileiro, herdado da escravidão, só tem olhos para punir os humildes e desamparados que, no Brasil, somam 1/3 da população. Quem não tem dinheiro perde qualquer questão justa. Além disso, o sistema Judiciário está atolado em quase 100 milhões de ações, que apodrecem nos arquivos dos cartórios.

As reformas judiciárias entre nós são pura cópia do que se pratica nos países adiantados. Aqui, fracassam. Em artigo recente, o jurista Roberto Dias, mestre em Direito do Estado e professor de Direito Constitucional (SP), lembra que a Constituição de 1988 fala na justiça em termos já superados. E faz referência a um julgamento de 1991, sob o título ‘Supremo na redoma’, porque alguns de seus eminentes magistrados pretendem reconstruir o edifício do Supremo Tribunal Federal (STF), que terá vidros à prova de bala e todas as medidas de segurança possíveis.

Todos entendem perfeitamente que juiz, juízes, tribunais e a Suprema Corte não podem julgar a portas fechadas, em segredo. Nada melhor que a sociedade participar das discussões. Logo, o julgamento na televisão (Justiça na TV) deu a primeira oportunidade de se fiscalizar as decisões do STF. Blindar o judiciário é um crime contra a nossa gente. Trata-se de medida que esconde grave armadilha antidemocrática. E anula decisões da Suprema Corte, como a que foi sentenciada pelo STF em 1991, que decidiu, citando o filósofo Norberto Bobbio, que ‘o modelo político-jurídico não admite o poder que oculta e o poder que se oculta.’

Contra a degradação da Suprema Corte

Realmente, a mídia em geral, esta sim, não pode ocultar a verdade, doa a quem doer, tem o dever de discutir o assunto amplamente, para evitar que a Suprema Corte seja fechada numa redoma. Modernizar o Judiciário, sim, porque é um escândalo cada juiz julgar mais de 10 mil a 20 mil ações por ano. A justiça ‘escondida’ é uma tragédia. A menos que se queira, à moda dos regimes de Hitler, Stalin, Mao Tse-tung e outros sistemas totalitários e populistas, cassar mandatos, julgar de portas fechadas, torturar, matar e exilar, como aconteceu no Brasil durante a ditadura Vargas (Estado Novo, 1937-1945) e a ditadura de 1964. Muitos podem até dizer que há tempos em que a violência é o melhor caminho para garantir a justiça social. Nesse caso, parece triunfante. Os atuais candidatos às eleições de 3 de outubro próximo não cuidaram do assunto. Foi sempre assim. Agora tudo mudou e nada combina com nada. O Poder Judiciário nestes tempos de mutação não tem princípios rígidos nem autonomia.

Só tenho uma sugestão: republicar o livro Por que defendo os comunistas (Editora Comunicação – PUC MG, de 1979, editado pelo jornalista André Carvalho e capa de Carlos Ferreira, textos organizados por Ary Quintela). Sugiro colocar na primeira capa o diálogo entre Quintela e Sobral. ‘Como é que o senhor defendia um inimigo de sua igreja? Sobral: ‘Por uma razão muito simples: o princípio que todo católico tem de seguir é o que está no Evangelho e que Santo Agostinho definiu nessa fórmula maravilhosa: odiar o pecado e amar o pecador. O comunismo nega Deus, afronta Deus. Mas eu compreendo que o comunista fala isso por ser pecador. Nós somos frágeis, logo podemos pecar por fragilidade. Dentro dessa orientação, eu é que estava certo, tanto que, quando se anunciou que eu ia fazer a defesa do Prestes e do Berger, sendo eu a segunda pessoa da Ação Católica Brasileira (ACB) – a primeira era o Alceu Amoroso Lima –, houve muita discussão. Mas eu nunca deixaria de fazer a defesa.’

Naquela época, Sobral Pinto declarou: ‘O comunismo está mais perto do catolicismo que do capitalismo.’

O advogado Roberto Dias faz ressurgir a necessidade de todos entrarem na luta contra a degradação da Suprema Corte. Só com uma Justiça correta e rápida podemos conviver na paz na fraternidade e na esperança.

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Jornalista