Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Transgênicos e dinheiro

Ficou claro, em todos os prós e contras colocados até hoje sobre o assunto ‘transgênicos’, que a coisa não é tão simples como querem fazer parecer. Sinto indignação quando penso em quantas perdas já tivemos por aceitar algo imposto, sem a devida certificação, a respeito da saúde da população (o caso da talidomida, por exemplo, o da vaca louca, outro exemplo!) Agora estamos falando do meio ambiente, da ‘vida’ em nosso planeta, e esse povo só quer saber do dinheiro? Registro minha indignação.

Maria Cleonice Pires



Cartinhas do absurdo

Relembrando o que disse o articulista Olavo de Carvalho: por que se vai perder tempo ouvindo alguém que não perdeu tempo estudando o tema? Exemplo: ‘A homeopatia pode não curar a malária, porque falar homeopatia é muito genérico, mas o remédio homeopata produzido por um sábio (?) e tomado com responsabilidade pelo doente cura, sim’, quando afirmado por professora e pesquisadora de Ciências da Comunicação [ver remissões abaixo]. Sabe ela por que exemplifiquei com a malária? Interessante que esta afirmação não seja comprovada de forma mimética, de forma reproduzível, fora da crença, sem o conhecimento do que isto significa. Claro que contra a fé não há argumento.

Quanto ao estudo da BBC, nada tem de visão quase religiosa, só o desconhecimento e o despreparo escolar podem levar uma pessoa a dizer isso. Não têm nada de autoridade. Afirmou, demonstre. Se falhou, é falso até se obter a demonstração. O teste escolhido pelos editores do programa e acompanhado pela Royal Society foi o mesmo que os homeopatas garantiram que funcionava. Poderiam ter escolhido para demonstrar a cura da malária, da tuberculose, da gonorréia, da Aids, da asma etc. O desafio está aberto. Mas achar que a ciência não é o único método racional recomenda mal o crítico. Seria o da adivinhação e da fé o melhor caminho que deixou o positivismo barato? Ou o uso de pessoas iluminadas? O que demonstra a pouca familiaridade do missivista com o assunto, ao fazer completa confusão entre ciência e sua aplicação, a tecnologia, que enumera exemplos.

Mas isto são afirmações de jornalistas sem preparo da matéria abordada. Quando uma dentista afirma, porém, que a fala de um ator global tem o mesmo peso da opinião de um dentista sobre um assunto odontológico, isso deve nos preocupar a todos. Afirma a profissional que ‘paulatinamente a mídia vem desconstruindo o que ela mesma ajudou a construir: a imagem de que o cientista é o detentor do saber, do conhecimento…’. Quem então o será? O curioso? O irresponsável chutador? O adivinho? A pessoa que, sem estudar, emite opiniões? Claro que estas pessoas se sentem oprimidas pelo que não sabem! Vamos falar sério! Não vá o sapateiro além das chinelas.

Estas pessoas não tem o mínimo entendimento de que o assunto não é questão de ponto de vista, mas somente de demonstrar o que se garante: a cura. Não se usa penicilina porque alguém tem uma ‘visão’ sobre ela, mas porque ela apresenta um efeito verificável, mensurável, reproduzível, que não requer fé. Pedir isto é ofensivo para cientistas?

Paulo Bento Bandarra, médico, Porto Alegre

Cartas – Canal do Leitor [rolar a página]



Estranho problema

É um problema estranho o mencionado na carta ‘Sociedade cética’, sobre o ‘teste da homeopatia’ da BBC/Fantástico. Em primeiro lugar, é sui generis dizer que quem oferece publicamente a chance de ser refutado é ‘dogmático’. Em segundo, por que deveria alguém ser menos severo com as empresas de homeopatia do que com as empresas farmacêuticas convencionais? (E olhe que o teste proposto é bem menos rigoroso do que os testes a que devem se submeter quaisquer novos medicamentos não-homeopáticos). Quando fiz essa pergunta diretamente a um diretor da Anvisa, a resposta que obtive – com o perdão da paráfrase – foi: quantas divisões de jornalistas vocês têm?

Essa dicotomia é insultuosa. Deveria ser denunciada pela mídia, e, não, justificada. Ou possuiria o teste alguma deficiência em seu protocolo? Alguma melhoria possível? Algum viés não controlado? (Por sua própria natureza, o cientista é inquisitivo). Mas essas são questões abertas. Não dependem de crença, dogma ou autoridade. Tanto é assim que o teste da BBC poderia ser reproduzido por qualquer homeopata brasileiro, o qual, em caso de sucesso, teria um milhão no bolso e seria um forte candidato ao Nobel. No entanto, esses homeopatas preferem esconder-se, correr atrás de advogados [www.amhb.org.br/nuke/modules.php?name=News&file=article&sid=181] ou se esforçar para demitir quem os confronta [http://bmj.com/cgi/eletters/326/7396/S151#3544319].

Agora me diga, prezado leitor, quem é o autoritário nessa história?

Em tempo: em certo sentido (bem mais modesto, não nego), o OI ‘furou’ o Fantástico, com meus textos pedindo evidências aos homeopatas de que veneno de cobra diluído cure dengue, ou de que barata esmigalhada seja boa para a asma. Bem, eu devo ser ingênuo. Se eles não respondem quando há US$ 1 milhão na linha, por que responderiam a mim?

Renan Moritz Varnier R. Almeida, professor, Rio de Janeiro

Mídia & Ciência – Canal do Leitor [rolar a página]

Homeopatia, esta injustiçada… será? – Renan Moritz Varnier R. Almeida



Do riso à revolta

Caro Manuel Bulcão, na Veja foi veiculada uma reportagem (‘O stress que faz bem’) que mostra bem as diferenças entre a linguagem científica e a religiosa, tanto na exposição como na interpretação dessas comunicações. Vários estudos experimentais – semelhantes aos do pesquisador Edward Calabrese, da Universidade de Massachusetts, que pesquisa os efeitos da hormese [a idéia de que doses mínimas de substâncias tóxicas fazem bem ao organismo, descrita pela primeira vez em 1888] – estão sendo realizados no mundo.

Um deles observou que os ratos alimentados com ração subcalórica (menos 40% de uma ração considerada normal à manutenção do peso) vivem mais, em cerca de 40%, do que os alimentados normalmente. Observou-se também que houve um aumento de 100% nas proteínas que protegem contra a morte celular, uma das causas do mal de Alzheimer. Há muito tempo e em diversas religiões a gula é considerada um grande mal à humanidade. É um dos sete pecados capitais, juntamente com a inveja (câncer, úlcera, crimes), ira (cortizol, cardiopatias, assassinatos), avareza (gastrite, revoltas, roubos), luxúria (exploração sexual, DSTs), soberba (prepotência, guerras) e preguiça (apatia, miséria, vícios).

Como as religiões são ensinamento de vida, de viver e conviver, elas orientam ao jejum semanal, periódico ou em ocasiões específicas para a ingestão dos alimentos, com temperança e agradecimentos a Deus. Geralmente, em rituais de forte intenção ao sagrado intangível, como mais um ato de renovação à sobrevivência do ser, por mais um novo período de tempo. Lêem-se também no Pentateuco – para falar na obra religiosa mais conhecida no Ocidente – orientações curiosas aos hebreus, como não fazer suas necessidades fisiológicas na área do acampamento, das tendas, e sim fora dos seus limites, em buraco a ser coberto com terra ao concluir. Como gatos e cães. Na seqüência, o legislador em ‘higiene e saúde’ justifica que isso deve ser feito porque o Senhor Deus passeia pelos caminhos do acampamento e nas vielas entre as tendas, vigiando seu povo e protegendo-o, e pode pisar na sujeira deixada por algum descuidado.

Imagino se naquele tempo haveria outra forma de obter a adesão do povo nesse exercício de cuidados mínimos à manutenção da saúde. Observo que muitas outras orientações, que hoje têm uma justificativa ‘científica’, já constavam nos livros ditos sagrados, intuídos por observações empíricas e práticas de resultados. Algumas são tidas apenas como crendices inócuas, outras me parecem apenas formas diferentes de obterem-se resultados semelhantes de acordo com o conhecimento e a cultura disseminados na sua época. Se os chefes ou sacerdotes observavam que comer porco ou mariscos provocavam sintomas ruins que podiam levar à loucura e à morte, proibiam sua ingestão, como vontade de Deus. As análises anacrônicas podem gerar interpretações que variam do riso superior à revolta emocionada.

Nos acampamentos, onde a convivência forçada das tribos podiam gerar inúmeros problemas conjugais e familiares, os adúlteros eram até mortos. Mais recentemente, na conquista do Oeste da América do Norte, onde os cavalos eram imprescindíveis, os ladrões de cavalos eram enforcados sem dó nem piedade. Atualmente, vemos assassinatos e ações degradantes e humilhantes provocados em nome de um direito sagrado à defesa, em guerra preventiva contra os desconhecidos inimigos – de acordo com a interpretação dos donos do mundo –, mesmo que isso resulte morte de milhares de inocentes e extinção de um povo.

José Renato Almeida, engenheiro, Salvador

Sombras do outro mundo – Manuel Soares Bulcão Neto