Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Fabiano Maisonnave

ELEIÇÕES 2002

“Zeca do PT pede proibição de uso de reportagem; Justiça não aceita”, copyright Folha de S. Paulo, 6/09/02

“O juiz auxiliar Luiz Carlos Santini, do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul, negou dois pedidos de liminar do governador José Orcírio dos Santos, o Zeca do PT, contidos nos pedidos de direito de resposta que ele move contra a Folha.

Nos dois casos, Zeca do PT, candidato à reeleição, requeria que não fossem mostradas no horário eleitoral gratuito reportagens publicadas pelo jornal que descrevem conteúdo de relatório reservado do Ministério Público Estadual apontando supostas ligações entre integrantes do seu núcleo de poder com quadrilha de policiais.

Santini vai julgar os dois pedidos de direito de resposta de Zeca. Os requerimentos dizem respeito a textos publicados no domingo e na segunda-feira passados.

Em sua defesa apresentada ao TRE, a Folha diz que apenas cumpriu seu dever de informar fatos de interesse público.

Além disso, na terça o jornal publicou ampla e destacada defesa de Zeca, inclusive com a íntegra de carta em que ele rebate os pontos do relatório. Com isso, sustenta a defesa, perde o sentido a necessidade do direito de resposta.

Ontem, Santini negou quatro representações com pedido de liminar que a coligação de Zeca, ?O Novo Mato Grosso do Sul?, move contra a coligação ?Pra Frente MS?, da candidata tucana ao governo, Marisa Serrano.

Todas requeriam que a coligação deixasse de mostrar, nas inserções diárias de propaganda eleitoral, trechos da reportagem.”

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“Zeca do PT nega ter ligação com quadrilha”, copyright Folha de S. Paulo, 3/09/02

“O governador José Orcírio dos Santos, o Zeca do PT, enviou ontem uma carta em que contesta a reportagem publicada anteontem pela Folha descrevendo relatório reservado do Ministério Público de Mato Grosso do Sul que aponta supostas ligações dele e de integrantes do seu núcleo de poder com quadrilha de policiais especializada em roubo e receptação de camionetes.

Segundo a carta de Zeca, dividida em 16 itens, a reportagem contém ?inverdades e uma clara má vontade em relação à busca da verdade referente aos fatos nela suscitados?.

O governador informou também que pediu a seus advogados que abram ?procedimento judicial na esfera cível e criminal contra o jornalista autor da matéria, o veículo Folha de S.Paulo e os promotores públicos estaduais, autores do referido relatório, a fim de apurar o grau de responsabilidade de cada um?.

Zeca afirma que desconhecia o relatório e que o repórter ?negou-se a entregar, ou mostrar o ?tal relatório?, para que pudéssemos respondê-lo e dissipar qualquer dúvida reinante, esclarecendo todas as questões colocadas?.

Em contato por telefone no começo da tarde de quinta-feira, a Agência Folha informou ao superintendente de Comunicação do governo, Bosco Martins, sobre o teor do relatório e solicitou uma entrevista com Zeca. O pedido foi reiterado no mesmo dia ao secretário de Governo, Marcos Alex.

Na sexta-feira, Martins solicitou que as perguntas fossem enviadas por escrito. Depois de recebê-las, informou à Agência Folha que Zeca não as responderia e leu uma nota, cujo conteúdo foi publicado no domingo. Todas as conversas foram gravadas.

Diferentemente do que alega, o governador teve oportunidade de expressar seu ponto de vista e preferiu não fazê-lo, desqualificando o relatório por meio de Martins.

Investigação

Zeca diz que não há nenhuma investigação em curso para apurar ligações entre ele e pessoas do seu governo com a quadrilha de policiais, condenada em primeira instância no final do ano passado.

Não há investigação formal, como a própria reportagem deixa claro, até porque os promotores a requisitaram à Procuradoria Geral da República. Mas, para elaborar o relatório, os promotores efetivamente fizeram uma investigação que resultou em mais de mil páginas de texto.

Na nota, o governador petista contesta também várias informações do relatório dos promotores que foram descritas pela reportagem.

Insinua que a reportagem o acusa de elo com o crime organizado, o que não é verdade. A suposta ligação está no relatório enviado a Brasília, e todas as contestações possíveis dos personagens do texto foram publicadas.

Também de acordo com Zeca, uma cópia do relatório foi enviada em março deste ano ao procurador-geral da Justiça de Mato Grosso do Sul, Sérgio Morelli, que ?analisou-o e determinou seu arquivamento por inconsistência?.

A versão de Morelli nega a do governador. Em entrevista coletiva ontem sobre o caso, Morelli disse que, apesar de ter recebido o relatório, não houve nenhum pedido de procedimento investigatório ao Ministério Público Estadual, já que, por envolver o governador, a competência é da Procuradoria Geral da República. Logo, o documento acabou sendo enviado a Brasília.

Zeca diz que pedirá à Justiça Eleitoral um direito de resposta.”

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“Petista nega, em carta, todas as acusações”, copyright Folha de S. Paulo, 3/09/02

“Leia a seguir a íntegra da carta divulgada pelo governador José Orcírio dos Santos (MS), o Zeca do PT.

Senhor Diretor de Redação,

?Ética – O jornalista deve assumir compromisso apenas com a isenção na cobertura dos fatos, a liberdade de expressão, o direito de informar e o acesso do leitor a toda informação ou opinião importante. Deve procurar conhecer todas as versões de um fato e registrá-las com fidelidade. Ele tem responsabilidade moral pelas informações que coleta e transmite, as quais devem ser sempre exatas e comprovadas…? Novo Manual da Redação – Folha de S. Paulo, 5? ed., p.17.

Sempre tive o jornal Folha de S. Paulo como uma referência ética e democrática da imprensa no Brasil, mas causou-me tristeza e indignação a matéria publicada nas páginas 8 e 9 do caderno Eleições, do último domingo (1/ 09/02), que na sua chamada, inclusive de capa, coloca-me sob suspeita de ser ?ladrão de carro?. Li atentamente a matéria, para tentar encontrar nos fatos ali narrados algo que justificasse seu título ou a chamada de capa, mas nada encontrei. Além disso, ao longo do texto encontrei várias inverdades e uma clara má vontade em relação à busca da verdade referente aos fatos nela suscitados.

Em respeito a esse jornal, o que a mim foi negado no material publicado, gostaria de responder ponto a ponto, o que foi inveridicamente e equivocadamente levantado envolvendo meu governo, minha pessoa e meu partido.

1 – Não conheço, não li e não vi nenhum relatório, nem dele tomei conhecimento, até a presente matéria, e o jornalista negou-se a entregar ou mostrar o ?tal relatório? para que pudéssemos respondê-lo e dissipar qualquer dúvida reinante, esclarecendo todas as questões colocadas. Aliás, no meu entendimento, matéria de tamanha gravidade, quando publicada, admite a premissa de que o dano por ela causado torne-se impossível de ser reparado.

2 – Não há uma única investigação em curso sobre o inverídico envolvimento da minha pessoa e de meu governo, como querem e dizem o título e a chamada de capa da matéria. Aliás, é bom que se diga que quem ratifica esta minha afirmação é a própria matéria da página 9, do caderno Eleições, onde o subprocurador Wagner Gonçalves afirma categoricamente: ?O conteúdo do documento é pouco para envolver o governador?. A própria matéria diz que não há e nunca houve representação formal no Ministério Público Federal, e sim um documento não oficial, chamado de ?dossiê dos promotores?, enviado ao senador do PMDB Ramez Tebet, que diz não conhecê-lo.

3 – É lastimável que, após concluir a não-existência de investigação, o jornalista autor da matéria, contrariando o Novo Manual da Redação, da própria Folha de S. Paulo, tenha insistido na tese de meu envolvimento e de meu governo com pessoas presas e condenadas durante a minha gestão. O jornalista sugere levianamente no box ?Investigação começou em março de 2002? a pretensa investigação. Se o editor do caderno em pauta ou o diretor de Redação lerem atentamente a matéria, observarão que lá está absolutamente claro que o box não trata da inverídica tese, de que estou sob investigação desde 2002. O texto diz respeito a investigação que culminou com a prisão e condenação de 29 pessoas, sendo 17 policiais, por desvio de conduta e prática criminosa. A matéria omite que as prisões ocorreram durante minha gestão e com a colaboração dos aparelhos de segurança de meu governo. O jornalista não diz que o Departamento de Operações de Fronteira (DOF) e sua estrutura existem em Mato Grosso do Sul há mais de dez anos. Estranho a tese de querer envolver com o crime organizado um governador, em cuja gestão foram presas e condenadas 29 pessoas ligadas a seqüestro e outros delitos.

4 – Mais grave ainda é a omissão da não existência de uma única investigação envolvendo Franklin Masruha, Valeriano Fontoura, Wilson Loubet e Horácio Pithan. Sugiro que nos seja apontado um único fato ou indício de envolvimento criminoso dessas pessoas com os presos e condenados.

5 – Se isso não bastasse, o chamado ?elo dos criminosos com o governador? é recheado de equívocos e omissões que estranho o jornalista omitir, já que o mesmo é morador na nossa capital e já exerce há algum tempo sua profissão aqui, portanto conhecedor de vários fatos por ele mesmo omitidos. Apontarei aqui alguns desses equívocos:

a) Valeriano Fontoura é meu advogado desde 1996. Não é articulador político, portanto, ao contrário da suposição do jornalista, não age nos bastidores políticos. Vale dizer que o jornalista sabe disso porque frequenta algumas reuniões do PT e com certeza nunca o viu atuando na esfera política. A ele nunca perguntei e não perguntarei para quem mais advoga. Uma coisa tenho certeza: é mentira que Valeriano tenha feito a sustentação oral para o major Marmo. O próprio jornalista já tinha o conhecimento deste fato e chega inclusive a citar na matéria ?… Rosa confirma que estava detido, mas nega que Fontoura tenha feito a defesa?. Mesmo com essa negativa o jornalista sustenta como verdade absoluta no gráfico ?Quem é quem no dossiê dos promotores? que Valeriano teria feito a sustentação oral negada no curso da própria matéria. Bastava checar no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Para tanto envio certidão, anexa. [não recebida]

b) Horácio Pithan, ao contrário do que foi afirmado pelo jornalista, é desembargador na vaga da OAB-MS conforme norma constitucional. Seu nome compôs a lista sêxtupla da Ordem dos Advogados do Brasil enviada ao Tribunal de Justiça e depois enviada pelo TJ ao governador, em lista tríplice. A escolha do desembargador foi feita pelo governador conforme a Constituição. Todo processo de apresentação do nome do desembargador foi acompanhado pela OAB-MS, detentora da vaga. Horácio Pithan foi presidente da OAB-MS, fato omitido na matéria. A respeito de suas decisões como magistrado não tenho conhecimento, interferência ou envolvimento. O papel de qualquer governo é prender e apresentar os criminosos à Justiça. Não nos cabe interferir nas decisões judiciais.

c) Wilson Loubet foi procurador-geral do Estado entre outubro de 1999 e abril de 2002. A matéria esquece de dizer que Loubet era procurador do Estado quando da prisão do major Marmo e não emprestou sua experiência profissional ao mesmo no caso DOF (conforme inverdade da matéria). Se o autor da matéria tivesse tido o trabalho de solicitar informações ao TJ-MS, descobriria que Loubet advogou em 1992 para o citado Major, mas em uma questão funcional e administrativa. Estranho a insinuação de que, durante e após sua gestão na procuradoria, Loubet tenha advogado para Marmo. Quanto a Adão Leite, Loubet advogou para ele em 1997 e 1998 o que na minha opinião é mero exercício da profissão. Nunca recebi de Wilson Loubet um único pedido escuso e espúrio em relação a este caso ou qualquer outro. A relação pessoal entre Loubet e Pithan não me interessa e nunca se caracterizou como problema ou facilidade (tráfico de influência) junto ao Tribunal de Justiça.

d) Franklin Masruha é atual conselheiro do Tribunal de Contas, eleito pela Assembléia Legislativa e ex-secretário de Segurança Pública de meu governo. Durante sua gestão ocorreram a prisão e a condenação dos policiais militares, inclusive do cabo Manoel Figueiredo, que como policial designado chegou a fazer sua segurança (necessidade inerente ao cargo que exerceu), naturalmente antes de se tomar conhecimento do seu envolvimento com o crime organizado. O cabo Manoel cumpre pena de 24 anos e oito meses, conforme a própria matéria afirma, portanto nunca encontrou de nosso governo complacência ou benevolência. O processo e a sentença sequer apontaram envolvimento, ou omissão do então secretário de Segurança com os criminosos. Nunca ficou comprovada a utilização do carro do secretário para qualquer ato ilícito.

6 – Pergunto ao diretor de Redação: ?Onde está o elo de meu governo com o crime organizado??. O jornalista diz que ?Zeca teria defendido o DOF?. Defendi o DOF (órgão público), como defendo a Polícia Militar, a Policia Civil e qualquer aparelho de segurança. Isso não é compactuar com criminosos investidos em cargos públicos. Nunca critiquei os objetivos da investigação na qual o meu governo e o Ministério Público estadual trabalharam juntos. Critiquei a forma com que investigações sigilosas eram divulgadas à imprensa, prejudicando o curso natural das investigações.

7 – É abominável a afirmação de que mantive relações, inclusive pessoais, com qualquer líder de quadrilha. Pergunto a esse diretor de Redação: ONDE ESTÁ NA MATÉRIA ALGO QUE CONFIRMA ESTA LEVIANDADE? Desafio-o a mostrar-me esta inverdade, como também a mostrar-me a chamada investigação sobre mim e meu governo.

8 – Outra indagação é: por que o autor da matéria não tomou o cuidado de ouvir o procurador-geral de Justiça de Mato Grosso do Sul? Consta-me, após a publicação da matéria, que o procurador-geral de Justiça ao tomar conhecimento, em março de 2002, do referido relatório ofereceu segurança aos promotores, que a dispensaram, alegando não mais dela precisar. O procurador-geral de Justiça de MS, ao receber o documento, analisou-o e determinou seu arquivamento por inconsistência.

9 – Por que um documento ?sigiloso? elaborado por promotores estaduais foi encaminhado a um senador da República e não obedeceu ao trâmite habitual deste tipo de procedimento?

10 – Por que o jornalista não observou o que preceitua o Novo Manual de Redação da Folha de S. Paulo, 5? edição, pág. 44? Lá diz: ?O jornalista deve ter especial cuidado com matéria vazada. Muitas vezes, ela pode apenas ter aparência de vazamento e ser um balão de ensaio ou uma forma de plantar uma informação falsa. É recomendável cruzar com pelo menos duas fontes qualquer informação vazada antes de publicá-la?.

11 – Lamento que episódios como esses reforcem um falso estigma sobre o nosso Estado de que somos apenas ?corredor e domicílio do narcotráfico?.

12 – Lamento também que o teor da matéria em momento algum leve em consideração a independência e organização dos Poderes.

13 – Lamento que o autor da matéria não tenha aguardado meu retorno da viagem que fazia pelo interior do Estado, dando-me assim a oportunidade de responder a todas as questões, infelizmente levantadas na matéria do dia 1.09.02.

14 – Diante de todo o exposto informo que tomo as medidas que me cabem como cidadão e como governador. Nesta segunda-feira, dia 2.09.02, encaminho aos meus advogados, solicitação para que seja aberto procedimento judicial na esfera cível e criminal contra o jornalista autor da matéria, o veículo Folha de S.Paulo e os promotores públicos estaduais, autores do referido relatório, a fim de apurar o grau de responsabilidade de cada um.

15 – Informo ainda que solicitarei também, à Justiça Eleitoral o direito de resposta, com o mesmo tamanho e destaque dados à matéria publicada no dia 1.09.02.

16 – Tenho certeza de que o dano causado por essa matéria é irreparável, mas acredito que é possível o jornalista e o veículo refletirem que a liberdade de imprensa está a serviço da verdade, da ética e da democracia. E ainda que episódios como esse sirvam de exemplo para mudar os nossos procedimentos quando se tratar da honra, da história e da dignidade de qualquer cidadão.”

“Zeca do PT envia nova carta à Folha”, copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 6/09/02

“O governador do Mato Grosso do Sul, José Orcírio dos Santos, o Zeca do PT, não se conforma com a série de matérias publicadas pela Folha de S. Paulo sobre a existência de um relatório do Ministério Público Estadual que investiga seu envolvimento com uma quadrilha de policiais especializada em roubo de veículos. Ele escreveu uma segunda carta para a redação do jornal, criticando a insistência do diário no caso e utilizando, mais uma vez, o Manual de Redação da Folha para criticar o repórter Fabiano Maisonnave, da Agência Folha, de Campo Grande, e a cobertura do diário.

Leia a segunda carta de Zeca do PT à Folha:

?Ao diretor de geral de redação, com cópias para o jornalista autor da matéria, chefe de redação, editor do caderno Eleições, ombudsman da Folha de S. Paulo, imprensa do Mato Grosso do Sul, grande imprensa nacional, Sindicato dos Jornalistas do MS, Associação Nacional dos Jornais, Diretório Nacional do PT e ao companheiro Lula.

Volto a me dirigir a este jornal pois estou ficando estarrecido com a insistência do jornalista local em produzir matérias absolutamente fora de foco. Minha insistência se deve ao fato de acreditar que um jornal com a capacidade de repercussão da Folha de S. Paulo esteja sujeito às mesmas críticas cabíveis a qualquer agente público. O detentor de cargo público ou um órgão de comunicação de caráter público, como este conceituado jornal, estão sujeitos a critica externa e a autocrítica.

Para não parecer reclamação comum de agente público citado negativamente em matéria jornalística, vou socorrer-me ao Novo Manual de Redação da Folha de S. Paulo – 5? Edição para explicar as causas do meu estarrecimento. O título da matéria ?Promotoria estuda novo pedido de apuração?, da página 3 do caderno Eleições, é uma clara contradição ao que preceitua o Novo Manual da Folha de S. Paulo, na pagina 33, no tópico Fato: ?Fato – entre um fato e uma declaração prefira o primeiro. Descrever um fato com correção e inteligência exige sensibilidade…?. Qual é o fato e a declaração nesta matéria?

O fato é a devolução pelo sub-procurador geral da Republica, Vagner Gonçalves, do chamado, pela própria Folha, ?Dossiê dos Promotores?. A declaração é que, diante da devolução, um dos promotores iria analisar e pronunciar somente após receber o ofício do sub-procurador. Está na matéria: o promotor Edgar Miranda se recusou a se pronunciar diante do fato de devolução do chamado ?Dossiê?, mas o jornalista, teimosamente, tem que dizer no título ?Promotoria estuda novo pedido de apuração?. O jornalista não diz que em nota pública o mesmo promotor Edgar Miranda já havia afirmado em 03 de setembro de 2002, em todos os jornais impressos e sites jornalísticos e que ?não existe qualquer investigação a respeito do assunto perante o Ministério Publico Estadual?. Aliás, esta afirmação sequer é citada na matéria da Folha de 04 de setembro de 2002. NENHUMA LINHA! O jornalista ?decidiu? que isso não é relevante.

Talvez alguém diga: ?quem decide o que é relevante é o jornalista?. Ótimo! Então vejamos o seguinte: A matéria de 01 de setembro de 2002, páginas 08 e 09, que desencadeou este conjunto de matérias, diz em seu título, inclusive de capa: ?Elo de Zeca do PT com quadrilha é investigado?. Ora, se esta tal investigação era o fato relevante em 01 de setembro, pergunto: Por que o desmentido de um dos promotores, autor do chamado ?Dossiê dos Promotores?, e a devolução por parte do sub-procurador não são fatos relevantes? Talvez porque estes dois fatos, tidos como irrelevantes para o jornalista, transformem sua matéria de 01 de setembro em uma barriga – publicação de grave erro de informação (página 29 do Novo Manual da Folha, 5? edição).

O jornalista ignora como relevante o que está em sua própria matéria, quando diz que o promotor Edgar Miranda somente ?se pronunciará após receber o oficio?. O jornalista quer, a qualquer custo, que exista a ?tal investigação?. Não pode ele de maneira alguma reconhecer que alardeou o que não existe ou existiu e que foi usado para plantar notícia vazada, conforme recomenda a página 44 do Novo Manual da Folha, no tópico Vazamento. Vou mais longe ainda e recorro novamente ao mesmo Manual, na sua página 33, que diz: Investigação jornalística – tudo que possa ser notícia merece ser investigado. Em maior ou menor grau, toda reportagem implica trabalho de investigação. EM VEZ DE COLECIONAR DECLARAÇÕES, O REPÓRTER DEVE USAR TODOS OS RECURSOS A SEU ALCANCE PARA REVELAR ASPECTOS POUCO CONHECIDOS DO ASSUNTO EM PAUTA. O autor da matéria não investigou o que, inveridicamente, transformou em notícia no dia 01 de setembro, páginas 08 e 09. Veja alguns exemplos:

01) Diz que Valeriano Fontoura fez a sustentação oral para o Major Marmo. Não investigou junto ao Tribunal de Justiça, onde qualquer cidadão consegue certidão informando procedimentos e pessoas que agiram no processo. Aliás, em 03 de setembro, quando expressou minha contestação, não enfrentou este erro, passando de largo. Parece que há dificuldade em dizer: Erramos (página 72 do Novo Manual de Redação da Folha, 5 ? edição).

02) Não recua na insinuação de favorecimento que fez contra Pithan (desembargador do Tribunal de Justiça) na decisão que culminou em habbeas-corpus ao Major Marmo. Omite que Pithan foi apenas um voto de uma turma, portanto a decisão foi da turma e não de um indivíduo. O autor teve oportunidade de corrigir a injustiça quando abordou a decisão do Tribunal de Justiça, que manteve a decisão anterior concedendo habbeas-corpus. Ao ler a matéria de 03 de setembro, na pagina 07, o jornalista continua com as insinuações de favorecimento entre Pithan e Loubet.

03) Omite, não tornando público, o último ponto da nota de 03 de setembro de 2002, de autoria do próprio promotor Edgar Miranda, tido pela Folha de S. Paulo como autor do chamado ?Dossiê dos Promotores?. Na nota, o promotor diz e o jornalista não torna público: ?O documento não consiste em um dossiê, nem tem caráter acusatório?. Se o documento, conforme seu autor não tem este caráter, a matéria da Folha tem, e continua tendo. A matéria acusa, insinua e omite informações contrariando tudo que a própria Folha de S. Paulo diz no seu Novo Manual de Redação, pagina 17: ?Formação de opinião – o jornal é, por excelência, um órgão formador de opinião. Sua força se mede pela capacidade de intervir no debate público e, apoiado em fatos e informações exatas e comprovadas, mudar convicções e hábitos…?

Não quero complacência, benevolência, muito menos, vistas grossas ao meu governo, meus atos e minha vida pública. O que quero é que este jornal tenha o mesmo comportamento crítico a mim e aos dirigentes públicos deste País também para com aquilo que reproduz em suas páginas. Quero ser objeto de crítica e questionamento público, mas não quero ser objeto de ódio pessoal, equívocos e omissões propositais. Este não é um apelo em nome do momento eleitoral que vivo e que o meu Partido e que o nosso candidato a presidente vive. Acho que a justiça cabe em todo momento e a todos, inclusive aos meios de comunicação.

Encerro dizendo que, sinto estar faltando o bom senso (explicitado no capítulo Projeto Folha do Novo Manual de Redação da Folha de S. Paulo, 5? edição) que na sua introdução, página 13, fala da busca de uma relação de transparência com a opinião pública e que, na sua página 14, reafirma que é preciso que haja regras para a direção do espírito, uma espécie de manual do bom-senso.

Mais do que a filosofia, a prática do jornalismo tem grande necessidade deste tipo de balizas.

Atenciosamente,?

José Orcírio Miranda dos Santos – Zeca do PT

Governador do Estado de Mato Grosso do Sul”

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“Político usa Manual da Folha para responder ao próprio jornal”, copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 3/09/02

“A matéria intitulada ?Elo de Zeca do PT com quadrilha é investigado?, publicada na Folha de S. Paulo no último domingo (01/09), provocou a ira do governador do Mato Grosso do Sul, José Orcírio dos Santos. Em carta enviada ao jornal, baseada no Manual de Redação da Folha, e publicada nesta terça (03/09) pelo diário, Zeca afirma que o repórter Fabiano Maisonnave, da Agência Folha, de Campo Grande, ?negou-se a entregar ou mostrar? o documento que associa a figura do político com uma quadrilha de policiais especializada em roubo e receptação de veículos no Estado.

A reportagem da Maisonnave é baseada em relatório reservado do Ministério Público do Mato Grosso do Sul que pede a investigação de uma possível ligação entre Zeca e a quadrilha. O pedido foi feito à Procuradoria Geral da República depois de uma investigação que durou dois anos.

O caso, conhecido como DOF (Departamento de Operações de Fronteira) – as investigações foram feitas entre 2000 e 2001 e resultaram na condenação de 29 pessoas, 17 delas policiais -, é visto pela assessoria de Zeca, candidato à reeleição, como ?terrorismo eleitoral?.

Zeca afirma não conhecer o relatório. Ele acusa a Folha de publicar matéria de ?tamanha gravidade?.

O governador baseou a carta no Manual de Redação da Folha de S. Paulo, utilizando-se de trechos do livro para acusar o repórter e o jornal de não respeitaram seu próprio código de conduta. ?É lastimável que, após concluir a não-existência de investigação, o jornalista autor da matéria, contrariando o Novo Manual da Redação, da própria Folha de S. Paulo, tenha insistido na tese de meu envolvimento e de meu governo com pessoas presas e condenadas durante a minha gestão?.

Em outro trecho ele pergunta: ?Por que o jornalista não observou o que preceitua o Novo Manual de Redação da Folha de S. Paulo, 5? edição, pág. 44? Lá diz: ?O jornalista deve ter especial cuidado com matéria vazada. Muitas vezes, ela pode apenas ter aparência de vazamento e ser um balão de ensaio ou uma forma de plantar uma informação falsa. É recomendável cruzar com pelo menos duas fontes qualquer informação vazada antes de publicá-la?.

Zeca diz na carta que vai processar tanto o repórter quanto o jornal e finaliza: ?Tenho certeza de que o dano causado por essa matéria é irreparável, mas acredito que é possível o jornalista e o veículo refletirem que a liberdade de imprensa está a serviço da verdade, da ética e da democracia. E ainda que episódios como esse sirvam de exemplo para mudar os nossos procedimentos quando se tratar da honra, da história e da dignidade de qualquer cidadão.?”

“Folha recorre de decisão da Justiça Eleitoral sobre direito de resposta”, copyright Folha de S. Paulo, 9/09/02

“A Folha recorreu ontem ao Plenário do Tribunal Regional Eleitoral da decisão que obriga o jornal a publicar resposta do governador do Mato Grosso do Sul, José Orcírio dos Santos, o Zeca do PT. A notificação foi repassada às 15h24 do sábado, por fax, quando o jornal já estava em processo de rodagem.

A decisão do juiz-auxiliar Luiz Carlos Santini refere-se à reportagem publicada no dia 1? de setembro, baseada em relatório reservado preparado por quatro promotores. O documento aponta supostas ligações do governador e de integrantes do seu núcleo de poder com quadrilha de policiais especializada em roubo.

Zeca do PT se recusou a conceder entrevista ao jornal para a primeira reportagem. Dois dias depois, enviou uma carta, publicada na íntegra, em que diz não ser investigado e acusa uma ?manipulação política?.

?A reportagem da Folha não é ofensiva e não traduz fato inverídico. O jornal não insulta o governador, não efetua um pré-julgamento do caso. Publica, inclusive, informações indicativas de que as acusações podem não ter consistência?, conforme informou o advogado Luís Francisco Carvalho Filho em sua defesa.

O advogado argumentou ainda que a decisão é nula e que foi cerceado o direito de defesa do jornal. ?É nula porque violou o princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório. A versão do governador já foi publicada espontaneamente em edição regular e espaço proporcional.?”