Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Tortura nunca mais?

Como interpretar o resultado desta pesquisa?

A violência policial faz parte do cotidiano brasileiro. O abuso estatal é uma verdadeira epidemia. Apesar de a Constituição Federal garantir a integridade física e moral dos detentos, presidiários são espancados diante de câmeras e amontoados em presídios que mais parecem masmorras medievais. A pena de morte é proibida e mesmo assim as PMs seguem atirando quase sempre para matar. Isto para não falar nos sempre suspeitos autos de resistência à prisão.

Organizações não governamentais e órgãos estatais lutam diariamente pelo respeito aos direitos humanos. Mas uma parcela significativa da população brasileira segue acreditando que os direitos humanos não decorrem do nascimento. Direitos humanos não são conferidos pelo Estado, nem podem ser limitados ou suprimidos por agentes estatais. Como advogado e cidadão, fico profundamente preocupado ao ver pesquisas como esta. Como reverter este quadro?

A violência estatal, infelizmente, faz só parte de nossa cultura. Nem precisamos recuar ao tempo da escravidão para demonstrar isto, pois a triste memória do Estado Novo e da Ditadura Militar no século passado são provas recentes de que no Brasil o abuso quase sempre foi a regra. Mas existem elementos culturais importados que parecem reforçar esta predileção de parcela da população brasileira pela brutalidade policial.

Assistindo à barbárie

Desde que Bush Jr. iniciou sua cruzada contra os infiéis (menos por causa do cristianismo do que pelo controle do petróleo) a tortura tem sido bastante valorizada em programas e filmes norte-americanos que preenchem a grade televisiva brasileira. O filme Takené um exemplo desta tendência nefasta (ver aqui) a série 24 Horasé outro (ver aqui). O personagem Jack Bauer, aliás, parece que andou inspirando torturadores norte-americanos de carne e osso (ver aqui). E ninguém ficaria surpreso ao descobrir que aquele personagem também tem duplos no Brasil.

É literalmente impossível para nós, brasileiros, superarmos atavismos de nossa cultura consumindo este tipo de lixo cultural norte-americano. Filmes como Taken e séries como 24 Horas solapam a concretização de princípios constitucionais que não podem ser abolidos nem por emenda à Constituição (Art. 60, parágrafo 4º, IV, da CF/88). Alguns programas jornalísticos brasileiros que glorificam a violência policial fazem o mesmo.

Nunca fui favorável à censura, mas esta pesquisa que demonstra que uma parcela significativa da população apoia a tortura, nos obriga a fazer algo. Não podemos apenas ficar parados assistindo à barbárie ser introduzida em nossas casas reforçando aquela que é praticada por agentes estatais nas ruas e presídios.

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[Fábio de Oliveira Ribeiro é advogado, Osasco, SP]