Wednesday, 24 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O exemplo do México não nos serve

A trama que envolveu o covarde assassinato do jornalista Décio Sá semanas atrás, no Maranhão, nada fica a dever aos crimes cometidos pela máfia italiana num passado não muito distante. No Rio de Janeiro, a juíza Patrícia Acioli, por incomodar com o rigor de suas sentenças maus policiais, também foi executada friamente. Como no caso da ousada morte da juíza, o episódio do assassinato do digno e destemido profissional de mídia também envolve, lamentavelmente, entre vários criminosos, um oficial da Polícia Militar acusado de ceder a sua própria arma, que lhe fora conferida pela sociedade para defendê-la, não para que o covarde crime fosse cometido. Inacreditável, tamanha traição de um policial para com sua instituição e com a sociedade, que jurou um dia defender com o sacrifício da própria vida. Vergonhoso. Um ato de traição inaceitável.

Impressiona o conluio criminoso – são cerca de dez, os participantes da quadrilha – no qual só a certeza da impunidade e a ânsia da obtenção do poder e do dinheiro a qualquer preço pode explicar a ousada trama diabólica, com a fuga de pistoleiros já premeditada, digna de enredo de filme de quadrilhas mafiosas. Crimes relacionados à agiotagem, desvio de recursos públicos, extorsão, acusação de assassinato em outro estado da federação, intermediação e contratação de pistoleiros – a vida do jornalista Décio Sá valeu R$ 100 mil –, enfim um rosário de crimes, alguns denunciados pelo sério e corajoso jornalista e blogueiro num trabalho elogiável do jornalismo investigativo.

Dá a impressão que o Brasil realmente caminha para ser o novo México, onde mais de 100 jornalistas, por contrariarem interesses do narcoterrorismo, uma praga que assola aquele país, foram assassinados nos últimos anos, alguns executados covardemente em via pública, como Décio Sá.

Frios e covardes

O Poder Judiciário e o Ministério Público têm, portanto, o dever constitucional de acompanhar passo a passo toda a investigação em curso – diga-se de passagem exemplarmente conduzida pela Secretaria de Segurança Pública do Estado do Maranhão – além do processo criminal consequente, que envolve tal quadrilha mafiosa, um câncer extremamente maligno que ameaça cidadãos ordeiros e a democracia.

A prisão dos envolvidos no assassinato do jornalista Décio Sá, alguns ainda foragidos, é, portanto, ponto de honra para a polícia de todo o Brasil e a investigação e esclarecimento de todos os tipos de delitos cometidos por tal quadrilha um outro objetivo a ser alcançado e do qual não se pode abrir mão. O rigor da lei e da pena, para um crime tipicamente hediondo, na tentativa de calar a imprensa, onde uma vítima indefesa procurava simplesmente exercer com dignidade a nobre missão, terão que prevalecer.

Sem imprensa e Justiça não há democracia, nem Estado de direito. Que os frios e covardes assassinos sejam exemplarmente punidos. É o que a sociedade espera. O exemplo do México não nos serve.

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[Milton Corrêa da Costa é coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro]