Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Memória página a página

Como diz a música popular, a vida vem em ondas como o mar. Os momentos vêm e vão e o que os faz eternos são as lembranças guardadas na memória. Quando o abstrato já não é suficiente para construir uma memória sólida, entram o papel e a caneta para registrar oficialmente, como acreditam os positivistas, através da escrita, a história que se monta dia-a-dia nas ruas, lares, escolas, bairros, cidades e países.

A palavra livro remete quase imediatamente à ideia de acúmulo de conhecimentos através da escrita. Já a memória pode ser entendida como a capacidade de apreender e guardar informações disponíveis, ou que um dia estiveram, para que sejam lembradas. Os livros reúnem em suas páginas sonhos, fatos históricos e todas as epifanias da mente humana. Portanto, o livro é um apêndice da memória cerebral. Seja no cérebro ou por meio de dispositivos artificiais, a exemplo da recente prática de criar um diário eletrônico para os filhos contando os seus passeios e momentos, guardar as histórias vividas é uma maneira de construir uma identidade e uma memória que, por meio dos livros, se perpetuam.

O primeiro passo para a construção da memória através dos livros é a leitura. Como já se sabe, só escreve quem lê. Escrever é verbalizar a leitura que se tem do mundo, das pessoas, dos livros, dos lugares e seus costumes e comportamentos. É registrar em letras e páginas ideias, conhecimentos, técnicas e valores humanos enraizados nas sociedades.

Cidadão é aquele que participa

A leitura é um hábito, e como tal, é lapidada e construída ao longo de anos. Por isso, a importância de incentivar este costume junto às crianças, que serão os futuros leitores do mundo e autores dos livros. A infância é um período de assimilação e aprendizagem, instigar o hábito da leitura é algo que deve ser feito em todas as esferas pelas quais passam as crianças. A família e a escola são os espelhos daqueles que ainda estão em início de formação. Se crianças começam a formar sem vocabulário nos primeiros anos de vida, consequentemente elas serão cidadãos conscientes e com voz ativa para realizar mudanças, baseadas nas memórias que livros ajudaram a edificar.

Com essa consciência crítica, capaz de expressar suas opiniões e ideias com voz ativa de mudança, conseguida através da leitura, é possível exercer a cidadania garantida a todos os indivíduos. A ideia de cidadania pode ser caracterizada como sendo a construção de instrumentos legítimos de articulação de projetos individuais e projetos coletivos. Outra concepção de cidadania, desenvolvida por Rousseau no século 18, é originada da noção grega de polis (cidade), à qual se liga politikos (político = ser social).

Nesta perspectiva, a cidadania é vista como um direito coletivo que, favorecendo o desenvolvimento da individualidade, pressupõe a ação política e sua socialização. Tendo como suporte uma legislação que procura levar em conta os princípios de “igualdade”e de “liberdade”, ela implica não só direitos do indivíduo, mas também seus deveres na sociedade, o cidadão é aquele que participa.

Ser social é ser ativo

Em suma, a cidadania inclui:

>> Direitos no campo da liberdade individual: liberdade, igualdade, locomoção e justiça;

>> Direitos de participação no exercício do poder político: participação política em todos os níveis: eleições, plebiscitos e órgãos de representação, tais como sindicatos, movimentos e associações;

>> Direitos sociais: direito e igualdade de usufruto de um modo de vida digno, através do acesso ao patrimônio social, ligado ao consumo, ao lazer, a condições e leis do trabalho, à moradia, à educação, à saúde, à aposentadoria etc.

Para a validação dessa cidadania, os veículos de comunicação, como os jornais impressos, auxiliam na formação de uma base de dados necessária para a construção e efetivação dessa cidadania, por meio das matérias jornalísticas que denunciam os problemas e, por vezes, sugerem as soluções. Assim, por trazer reflexões e provocações que podem culminar em atitudes concretas na sociedade, a leitura é um canal de transformação social.

Educação, leitura e cidadania formam os sustentáculos das sociedades moderna e pós-moderna, onde indivíduos com leituras diversas se sentem capazes de mudar as dores do mundo. Ser social é ser ativo, é participar e não ser apenas plateia, e a leitura dá o suporte para que os indivíduos possam ser os protagonistas de suas histórias, vivendo-as e registrando-as.

Uma remodelação da cultura do país

A história se desenvolve através do seu povo, com seus costumes e valores, trilhando a cada dia os caminhos que serão hoje percorridos e lembrados no futuro. As bibliotecas, os museus, os memoriais, são espaços que aglomeram culturas e identidades formadas por registros escritos/visuais, que podem ser estudados, melhorados e compartilhados.

Apesar de já exausta, a ideia de que o livro é capaz de remontar os indivíduos para outros espaços, é pertinente e verdadeira. Por intermédio das páginas dos livros, é possível acessar memórias concebidas em qualquer lugar e em qualquer tempo, não importando os dispositivos utilizados. O viajante pode usar papel ou equipamentos eletrônicos, mas por meio da leitura, ele terá a sua viagem garantida.

Pais, professores e meios de comunicação devem unir forças para tentar mudar a realidade de um dos países que tem o menor índice de leitura por ano. É preciso que haja uma remodelação da cultura do país, valorizando e conscientizando os habitantes da relação direta entre a leitura e uma sociedade melhor, que preserva e repassa suas história e cultura.

A leitura pode mudar o mundo

A contemporaneidade pede dos sujeitos um maior acúmulo de informações, de maneira rápida e eficiente, independente das formas como elas são adquiridas. Seja pelos jornais impressos/televisionados, pela internet ou pelos livros, o imprescindível é buscar conhecimento de maneira crítica e utilizável, ou seja, é preciso aplicar aquilo que se aprende.

A leitura deve ser algo perene e que perpasse todas as etapas da vida humana, sendo parte integrante do seu modo de viver e ver a vida, por isso, a literatura é divida de forma cronológica, acompanhando as fases da vida. Há a literatura infantil, a infanto-juvenil e a adulta para que em cada período da vida os indivíduos tenham uma literatura que os acompanhe.

Os dispositivos e suportes são diversos. Pode-se ler por meio de revistas, livros, jornais, computadores, celulares, enfim, não existe falta de opções, o que falta é a consciência da importância da leitura na vida e na história de cada um. Não só a construção da memória depende da escrita e da posterior leitura, ou vice-versa, é uma estrada com mão dupla, mas também o próprio ser humano é composto por aquilo que vê e escuta, e principalmente, por aquilo que ler. Portanto, não é utopia dizer que a leitura pode mudar o mundo.

***

[Cleonice Evellyn Oliveira Lima é estudante, Campina Grande, PB]