Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O mapa digital de protestos em tempo real

Por volta de 94 milhões de internautas brasileiros foram impactados pelo ativismo nas redes sociais associado às manifestações que se espalharam pelo Brasil nos últimos dias. Essa conclusão é resultado do Mapa Digital das Manifestações, estudo realizado quase em tempo real pelo Grupo Máquina PR com o uso da ferramenta Brandviewer, que analisou toda a movimentação no ambiente digital entre quarta e sexta-feiras (19 e 21/6) para identificar mensagens relacionadas aos protestos. Um infográfico animado mostrou a rápida propagação do assunto pela quase totalidade dos municípios brasileiros.

O pico da mobilização aconteceu na quinta-feira (20/6), entre as 18h e 23h, quando houve tensão e confrontos em diversas cidades, incluindo a tentativa de invasão do Palácio do Itamaraty. A rede mais utilizada foi o twitter (49,3% das citações), seguido de facebook (47,1%) e google+ (1,9%). Dos autores de posts, 55,9% eram homens. Com 80,1 milhões de usuários impactados, a principal hashtag sobre o assunto foi #vemprarua. São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília foram as cidades com maior participação de usuários em número de posts.

O mapa faz parte dos esforços da agência para elaborar informes e cenários de impacto nos negócios de seus clientes. Para isso, mobilizou todas as equipes de sua agência digital Studio, de web, gestão de reputação e do núcleo de análises editoriais, que somaram mais de 40 profissionais. “Todos estavam perplexos e nós tínhamos de nos posicionar fora dessa perplexidade e tentar nos antecipar de algum modo”, diz Maristela Mafei, sócia da agência. Confira a seguir entrevista de Maristela sobre os reflexos desse movimento na comunicação das empresas e do próprio negócio do setor em si:

Como surgiu a ideia e o que levou a Máquina a monitorar as redes sociais nacionalmente a partir dos protestos dos últimos dias?

Maristela Mafei – Todos sabiam que as redes sociais estavam sendo usadas para marcar os protestos e para difundir informações ao vivo, seja por meio de fotos, textos ou vídeos. Mas queríamos saber mais: quantas pessoas eram atingidas por essas mensagens? Como esse ativismo se propagava na rede? Qual o perfil desses internautas? Vimos que a manifestação nas redes foi um bom indicativo do que aconteceria nas horas seguintes e da amplitude dos protestos pelo País.

Como se deu esse monitoramento? Que apoio ou tecnologia a agência adotou?

M.M. – O monitoramento foi feito com base nas principais palavras-chave e hashtags associadas aos protestos. Ou seja, fizemos uma pesquisa aprofundada dos “gritos de guerra” virtuais e das expressões mais usadas, para que nada se perdesse, até porque havia outros temas importantes em evidência. Foi utilizado um software específico de monitoramento, mas o número de posts foi tão grande – rapidamente se aproximou de 1 milhão – que precisamos realocar um servidor específico para isso e depois substituí-lo por outro com capacidade ainda maior. Houve uma verdadeira avalanche de dados sobre esse ativismo digital e, no momento em que se fala tanto em big data, conseguimos reunir um conteúdo precioso. A tecnologia foi importante para processar e colocar à disposição essas informações, mas mostrou-se igualmente fundamental o time de profissionais de inteligência para tirar conclusões e montar perfis do movimento, já que um volume muito grande de informações dispersas não teria nenhum uso prático.

Quais foram os resultados e principais descobertas desse monitoramento?

M.M. – Apesar de ter partido do Sudeste e de algumas regiões do Nordeste, o movimento alastrou-se por praticamente todo o território nacional. Até Fernando de Noronha aparece no mapa de calor que fizemos (mostrando a hora das manifestações, na quinta-feira passada). Ou seja, a adesão foi maciça. Há vários outros dados interessantes.

Houve algum investimento especial ou a agência valeu-se de seus recursos tradicionais para fazer esse trabalho?

M.M. – Houve esforços próprios e investimentos, mas adotamos uma política de não mais especificar valores.

Eles prosseguirão nessas esperadas próximas etapas?

M.M. – Neste momento estamos viabilizando parcerias para a continuidade.

O que muda na comunicação das empresas com os protestos?

M.M. – Eles provocam uma mudança na relação entre redes sociais e mídia. Antes, o clamor das redes só era “legitimado” quando saía na grande imprensa, que se abastecia de pautas nas redes e selecionava o que queria ou não repercutir. Como muito desse clamor ficava “de fora”, as pessoas foram em massa para as ruas. Sem saber, elas pautaram editorialmente os veículos. Isso é uma enorme reviravolta: acompanharmos até quando esse “controle” sobre a informação muda de eixo e terá que ser dividido, compartilhado. A mudança editorial da cobertura das tevês foi um indício disso. Parece–me que elas demoraram a se situar no começo, mas depois foram bastante ágeis e corresponderam à expectativa de quem as assistia. Foi uma agilidade espantosa para as circunstâncias das ruas.

Quais os desafios para a comunicação corporativa nesse novo cenário, caso ele se consolide?

M.M. – Na Máquina, nos últimos 18 meses, introduzimos o socialmidiavideo em escala comercial e com isso estamos tateando para fazer uma PR colaborativa e participativa. Essa história de disparar um único texto para um mailing de mil pessoas foi definitivamente enterrada. As empresas precisarão criar valor e conseguir fazer com que o seu público-alvo se sinta identificado com o que ela vai dizer, se sinta “participativo” da mensagem. Uma mudança que já vinha sendo sinalizada teve um enorme acelerador com os protestos.

Isso significa mais investimentos, por parte das agências, em digital e recursos multimídia?

M.M. – Não necessariamente; hoje existem milhares de ótimos parceiros e fornecedores nessas áreas, além do que as agências de publicidade investem fortunas nisso. O que precisa é de gente, nas agências de PR, que saiba utilizá-los, adequá-los às perspectivas de cada um de seus clientes e ajudá-los a redirecionar suas políticas de comunicação, se for o caso. Fizemos uma ótima, excelente parceria com a Brandweiser nesse sentido. Nosso mercado está aí. Os clientes podem ficar perplexos com o que veem à sua frente, mas nós precisamos tentar ajudá-los a entender e extrair disso informações de interesse o quanto antes.

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Eduardo Ribeiro é jornalista, diretor do Jornalistas&Cia.