Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Imprensa não está isenta de se submeter às leis de segurança

A condenação do soldado americano Bradley Manning por vazar dados considerados estratégicos para a segurança dos EUA, bem como a detenção do brasileiro David Miranda no aeroporto de Heathrow, domingo passado, portando informações confidenciais, chocaram profundamente as almas sensíveis, libertárias, defensoras incondicionais da doutrina que definem como de “liberdade de informação”.

Pode-se até se compreender os sentimentos dessas almas bem intencionadas, mas uma questão pertinente, não menos crucial, se eleva de toda essa história, desde a divulgação de milhares de documentos por parte da rede WikiLeaks até a detenção do rapaz brasileiro.

Até onde, afinal, a chamada liberdade de informação pode se sobrepor ao direito do Estado de garantir a segurança de seu território e de seus cidadãos diante da ameaça letal, onipresente, do terrorismo islâmico inspirado por organizações como a Al Qaeda, mais vivas e atuantes do que se imagina apesar da morte de seu líder e fundador, Osama bin Laden?

Que direitos, enfim, foram outorgados ao jornalista para que ele, como senhor absoluto da verdade, se empenhe em burlar os mecanismos de segurança do país onde trabalha ou que se configura em alvo de suas “investigações”, para expor dados que fatalmente vão comprometer medidas e pessoas empenhadas na proteção de seres humanos e bens nacionais?

Nenhuma carta de alforria foi outorgada a qualquer um desses profissionais espalhados pelo mundo.

Alvos de censura

Países como Estados Unidos, Reino Unido, França e Israel, sem deixarmos de mencionar outras nações como Canadá ou as escandinavas, estão longe de ser acusadas de antidemocráticas.

Ainda assim, já bem antes do fatídico 11 de Setembro, adotavam normas estritas de segurança em áreas consideradas como vitais –aeroportos, estações ferroviárias, instalações governamentais etc. –como meio de se precaver da onda de terror que grassava pela Europa, promovida por grupos palestinos, islâmicos, separatistas e tantos outros.

Israel, por exemplo, um dos alvos preferidos desses maníacos ultranacionalistas ou religiosos, impunha aos correspondentes acreditados no país que se submetessem às regras da censura militar quando se tratava de enviar às suas redações reportagens que de uma forma ou de outra pudessem dar ao inimigo alguma nesga de informação estratégica.

Foi assim durante a primeira Guerra do Golfo (1991), quando o Iraque disparava sobre o Estado judeu os mal direcionados mísseis Scud soviéticos.

Naquela ocasião, a censura proibia os correspondentes de mencionarem os locais atingidos pelos mísseis iraquianos ou sequer as condições climáticas do país durante os ataques –e a CNN, como todos os demais veículos de imprensa da região, aceitou as regras do jogo.

A explicação dos militares era simples e objetiva: esse tipo de informação pode orientar os artilheiros (telemetristas) inimigos.

Os próprios sinais de satélite que países teoricamente amigos, como o Brasil, utilizavam para os estudos meteorológicos eram alvo da mesma censura em nome da segurança do que se lutava do outro lado do planeta.

Não consta registro de comoção internacional em razão dessas proibições.

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Mário Chimanovitch é jornalista, ex-correspondente de jornais brasileiros no Oriente Médio. De Israel, escreveu para a Folha no início dos anos 1990