A Folha falou com Chico Buarque em Paris, em frente ao prédio onde está escrevendo seu novo livro. Integrante do grupo Procure Saber, contrário à comercialização de biografias não autorizadas, Chico diz que pode ter se enganado, mas considera a privacidade direito de qualquer cidadão. Leia trechos abaixo.
Por que aderiu ao grupo Procure Saber?
Chico Buarque – Posso não estar muito bem informado sobre as leis e posso ter me precipitado, mas continuo achando que o cidadão tem o direito de não querer ser biografado, como tem o direito de não querer ser fotografado ou filmado. Me pareceu natural. Parece que não. Parece que essa ideia está perdendo [espaço] na mídia. Tem que ficar claro que não começamos esse movimento. O movimento para mudar a lei partiu da Associação Nacional de Editores.
O que a gente pretendia era deixar as coisas como estão, no sentido de se poder preservar a privacidade de qualquer cidadão, não me refiro a artista. É uma discussão que é até bom que seja levada adiante, mas não nos termos em que as coisas estão acontecendo. Já virou batalha num nível muito pessoal –e desigual. Não adianta querer dizer que os artistas são famosos. Nós somos pequenos nessa briga. Repito: posso ter me enganado. Eu julgava que eu estava tendo uma posição sensata.
Não é natural que o público tenha curiosidade em saber sobre figuras que admira?
C.B. – A mim, me parece –não falo nem por interesse pessoal. Quem tem interesse nisso são mais as editoras. Eu não tenho problema quanto a isso. Entendo que alguns artistas, algum cidadão, queira preservar a sua intimidade. Não acho que isso seja uma aberração. Acho que é um direito.
Me pareceu [ênfase] que era um direito. E parece que não. Então tá bom: então vai se criar um outro tipo de situação. As biografias serão automaticamente liberadas, e os biografados poderão recorrer à Justiça para receber uma indenização que parece que não é significativa. Ou, quem sabe, para até retirar o livro de circulação.
Paulo César de Araújo sugeriu que a sua filiação ao Procure Saber, ao pleito apresentado por Roberto Carlos [pela autorização prévia para biografias], teria sido uma moeda de troca ao apoio deste à agenda pró-fiscalização do Ecad que vocês três defendem. Houve esse acordo?
C.B. – Isso é uma ilação dele. Eu, em relação ao Roberto Carlos, e ao que eu achava que era o direito do Roberto Carlos de preservar a sua vida pessoal, aspectos da sua vida que ele não queira… antes de se falar em Ecad, em Procure Saber, eu sempre tive essa opinião. Achava que ele tava certo, sim, de se proteger. [ri] Se for levar isso ao extremo, o sujeito é obrigado a deixar invadirem sua casa, fazerem fotografias [dele] de cueca, exporem sua mulher em trajes mínimos, sem poder recorrer.
[No caso do Roberto] Ele pode não querer que se fale de um casamento, de algum problema da infância. São problemas que não são levados pelo artista ao público, que ele toma o maior cuidado,quer preservar para si. Acho respeitável. Agora, se a lei tá errada, se eu tô errado, tudo bem. Perdi.
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Lucas Neves, colaboração para a Folha de S.Paulo, em Paris