Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Charco Metropolitano

O Arco Metropolitano, descrito em reportagem do jornal Valor de 27/6 (ver aqui), vai, na opinião do professor de economia social e do trabalho José Cláudio Souza Alves, agravar os já dramáticos problemas ambientais do Grande Rio. Alves foi pró-reitor de extensão da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) durante oito anos e participa do Fórum Grita Baixada, que defende os direitos humanos na região.

Alves denuncia o Centro de Tratamento de Resíduos (CTR) Santa Rosa, em Seropédica, município onde se localiza a UFRRJ: “É o Lixão de Seropédica. As empresas que o operam dizem que é um aterro sanitário, que dão uma destinação correta ao chorume, mas não é verdade. E o pior é que o terreno do lixão está sobre o Aquífero Piranema, que abastece 140 mil pessoas e tem água a um metro de profundidade.”

O Aquífero Piranema está sob a bacia do Rio Guandu, responsável pelo abastecimento de água potável a 80% da população da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, atualmente na casa dos 12,9 milhões de habitantes.

Chorume

“O lixão está ao lado de um dos trajetos do Arco Metropolitano. As empresas recebem R$ 10 milhões por mês para produzir, com 10 mil toneladas de resíduos trazidos diariamente do Rio de Janeiro, montanhas enterradas. Hoje, a população de Seropédica afetada vai dormir e acorda com o cheiro do chorume”, relata Alves.

O professor revela que o lixão do Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, foi fechado porque, situado numa ponta de manguezal na Baía de Guanabara, “ia virar dentro da baía e enterrar as embocaduras dos rios Iguaçu e Sarapuí; já havia uma rachadura no terreno equivalente à altura de uma pessoa.”

O fechamento do lixão, conhecido em todo o país por ter inspirado a novela Avenida Brasil, da Rede Globo, e o filme Lixo Extraordinário, levou a prefeitura do Rio de Janeiro a cogitar da criação de um aterro sanitário no bairro de Paciência, na Zona Oeste, mas, segundo Alves, a má recepção da ideia levou o prefeito Eduardo Paes a se voltar para a alternativa de Seropédica. “As empresas interessadas compraram vereadores da cidade, que tem apenas 60 mil habitantes, e conseguiram derrubar todas as ações até aqui impetradas na Justiça contra a iniciativa”, afirma Alves.

Água poluída

Recentemente, o professor colheu para análise água em poços do bairro de Adrianópolis, em Nova Iguaçu, e constatou a presença de ferro, amônia e fósforo em concentrações acima dos padrões aceitos. A localização do aterro de Adrianópolis, aberto em 2007, também fica nas proximidades do Arco Metropolitano. O dano ambiental é contabilizado por Alves igualmente no corte já efetuado de 80 mil árvores em Nova Iguaçu, “sem qualquer reposição dos passivos ambientais”.

Ele menciona também o lixo a ser produzido no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), em Itaboraí. “São resíduos altamente poluidores”, diz, “e, como é impossível poluir ainda mais a Baía de Guanabara, serão levados para Maricá. E vão drenar recursos hídricos na Serra, perto de Magé. Do outro lado do Arco, a CSA (Companhia Siderúrgica do Atlântico), da ThyssenKrupp, localizada em Santa Cruz, joga limalha de ferro na Baía de Sepetiba. É o que a população chama de ‘purpurina’.”

O professor fala ainda do caso da Ilha da Madeira, na mesma baía, “onde a atividade dos pescadores foi totalmente desmontada” para a construção de um terminal marítimo. Além disso, a Marinha constrói um estaleiro para fabricar um submarino atômico em convênio com a França. “Não há discussão sobre a destinação do lixo atômico”, diz Alves.

Um mapa do Arco Metropolitano publicado na reportagem do Valor é aqui reproduzido com alterações que mostram a localização de áreas onde houve ou há aterros sanitários.

Empregos para quem?

Alves não acredita na efetividade do potencial de criação de empregos anunciado pela Companhia de Desenvolvimento Industrial do Rio de Janeiro (Codin), 7.400 postos. Diz que se trata de empregos nas obras de construção rodoviária. Quanto aos empregos em indústrias, empresas de logística e outros serviços, quanto mais qualificados e bem remunerados, menos acessíveis aos moradores da Baixada Fluminense, onde se calcula que a maioria das famílias tenha escolaridade inferior ou igual ao ensino fundamental completo. Fenômeno semelhante ocorre em municípios cortados pelo Rodoanel de São Paulo: em centenas de bairros-dormitórios, os melhores empregos não estão ao alcance dos moradores.

“Quem vai trabalhar nas empresas criadas em função da construção do Arco Metropolitano são pessoas da Zona Sul do Rio”, prevê o professor.

Alves se preocupa com os prejuízos já sofridos pelo setor primário em municípios do Grande Rio. “Uma empresa de São Paulo lançou o Arcolog Seropédica”, conta. “Comprou cinco propriedades rurais, com área de 185 mil m2, e está terraplenando tudo para construir depósitos de contêineres e estacionamentos de caminhões. Com isso, produtores rurais de orgânicos estão sendo varridos”, exemplifica.

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