Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O preço da liberdade

A Associação Brasileira de Imprensa acompanha com apreensão e perplexidade o desdobramento dos episódios deploráveis ocorridos recentemente, na sede do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro. Ao serem libertados por um Habeas Corpus, o grupo de manifestantes que se encontrava detido no Complexo Penitenciário de Gericinó, reuniu-se, no dia seguinte, em companhia de familiares, para uma entrevista coletiva no auditório da entidade. O que se viu em seguida foram cenas de intolerância política que se acreditavam sepultadas para sempre com o restabelecimento das garantias individuais e do Estado de Direito. Acolhidos democraticamente no Sindicato para que expusessem sua defesa com ampla liberdade, os manifestantes voltaram-se contra os jornalistas com uma incontinência verbal jamais vista desde o fim da ditadura militar. Ignoraram o extraordinário passado de lutas da categoria contra o arbítrio, a violência e a opressão. De acusados passaram à acusadores. Exalando um sectarismo doentio que se imaginava extinto, atacaram os profissionais que cobriam a coletiva com uma virulência inaceitável nos dias de hoje. Aos gritos de “vocês vão nos pagar”, rotularam os jornalistas como “carniceiros “, submetendo-os a toda sorte de constrangimentos e ameaças. A coletiva transformou-se num espetáculo degradante. Ofendidos e agredidos, em sua própria Casa, repórteres, fotógrafos e cinegrafistas viram-se obrigados a abandonar o Sindicato diante da leniência dos diretores da entidade. Não se ouviu uma palavra em defesa dos associados vilipendiados e criminalizados quando apenas cumpriam seu dever.

A ABI historicamente jamais se imiscuiu nos problemas internos de qualquer entidade. Ao longo dos seus 106 anos de existência, a Casa de Herbert Moses e Barbosa Lima Sobrinho manteve-se sempre distante das querelas domésticas que compõem o cotidiano de sindicatos e associações. Os fatos que macularam a imagem do SJPMRJ adquiriram, entretanto, uma dimensão que ultrapassou as fronteiras de um “evento” sob os auspícios de uma agremiação sindical. A natureza das agressões cometidas contra jornalistas, em seu próprio Sindicato, foi um indicador de que violências ainda maiores se avizinham contra uma categoria sitiada pelo aviltamento dos salários, perda de prestígio, e que sobrevive sob permanente ameaça de proletarização.

A gravidade dos fatos levou a ABI a se posicionar diante das ofensas cometidas contra jornalistas impedidos de exercerem livremente seu direito de informar. O jornalismo é uma atividade visceralmente política. Não podemos, entretanto, admitir que questões de natureza ideológica se sobreponham aos interesses de classe e às liberdades asseguradas pela Constituição. O SJPMRJ lamentavelmente deixou-se contaminar por posições que colocaram sua Diretoria em litígio com mandamentos consagrados pelo regime democrático, como o direito ao contraditório, a liberdade de expressão e os direitos humanos. Os jornalistas não podem ser demonizados por aqueles que violam a lei, apoiados por uma Diretoria que afronta seu Estatuto e o Código de Ética da Profissão.

A ABI aliou-se à Fenaj e à Associação dos Repórteres Fotográficos do Rio de Janeiro em condenar um fato que representa grave ameaça ao futuro da imprensa. Cabe aos associados do Sindicato decidir agora o futuro da sua entidade de classe. Não se pode abrir espaço para aqueles que desejam amordaçar e intimidar, sob qualquer pretexto, o exercício dessa atividade profissional. A História tem sido pródiga em exemplos de como comportamentos dessa natureza costumam terminar.

A ABI adverte a todos os jornalistas que em nenhum momento se solidarizou com o SJPMRJ. O documento assinado em nome da entidade pelo associado Mário Augusto Jacobskind, onde apoia os detratores da categoria, foi distribuído clandestinamente e à revelia da Diretoria da ABI. O referido associado não está autorizado a se manifestar em nome da instituição. O episódio é também emblemático ao revelar como a manipulação da verdade e a mentira caminham de mãos dadas, transformando-se num instrumento a serviço de interesses que desonram, apequenam e abastardam o pouco de nobreza que resta a um ofício exercido com devotamento e paixão. Uma profissão que mesmo diante de tamanha vilezas ainda é motivo de orgulho para todos nós. [Rio, 3 de agosto de 2014]

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Domingos Meirelles é Diretor Econômico Financeiro da ABI; Jesus Chediak é Diretor de Cultura e Lazer da ABI; (em nome da Diretoria)