Wednesday, 24 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Confecom, os primeiros desafios

Dando continuidade à série de entrevistas sobre a Conferência Nacional de Comunicação, a IHU On-Line conversou com Jonas Valente, representante da Intervozes, organização da sociedade civil que faz parte da comissão organizadora do evento. Por telefone, Valente fala sobre como, neste momento, a Conferência está sendo debatida e construída para que, em dezembro, possa ser realizada de forma plena. Ele apresenta dois grandes problemas que surgem nesse contexto. Um deles diz respeito ao financiamento da Conferência, que teve seu orçamento inicial drasticamente reduzido. O segundo problema é o tempo para a organização do evento.


‘Além disso, o grande desafio da Conferência é dar conta de velhos problemas à luz dos novos desafios. Ou seja, precisamos dar conta dos velhos problemas de desconcentrar o sistema de comunicação, de assegurar a pluralidade e diversidade, assim como assegurar condições para que os segmentos populares tenham condições para se expressar de fato nessa arena midiática’, diz Valente.


Jonas Valente é jornalista e mestrando em Políticas de Comunicação na Universidade de Brasília. Já trabalhou no Movimento Nacional de Direitos Humanos, na Agência de Notícias Carta Maior e, atualmente, é integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, entidade que luta pela comunicação como direito humano.


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Como vocês veem a questão da não obrigatoriedade do diploma de jornalismo?


Jonas Valente – O Intervozes não tem uma opinião formada sobre o diploma de jornalismo. Por outro lado, a decisão do STF não atinge apenas a obrigatoriedade do diploma, mas o conjunto da regulamentação da profissão de jornalista. Isso, de fato, cria uma situação que será melhor debatida e imagino que a Conferência possa ser um dos espaços para debater isso.


Daqui até dezembro, quais os caminhos que precisam ainda ser trilhados para a realização da Conferência Nacional de Comunicação?


J.V. – Em primeiro lugar, temos dois grandes obstáculos estruturais e organizativos que precisamos resolver. O primeiro grande obstáculo é o dinheiro. A Conferência teve uma cotação orçamentária de 8,2 milhões de reais. No dia 11 de maio, esse valor foi reduzido, via decreto, por meio de um corte que atingiu o Ministério das Comunicações, para 1,6 milhão de reais. Na prática, esse corte logo foi recebido pelas entidades Pró-Conferência de Comunicação como uma ação que inviabiliza a Conferência. Com esse novo orçamento, não teremos uma conferência digna. Poderemos ter um seminário ou qualquer coisa do gênero ou uma conferência tão reduzida que não irá cumprir seu papel de debate amplo em relação à comunicação no país. Depois disso, a Comissão Pró-Conferência fez uma carta em defesa da recomposição. Apresentamos à comissão organizadora nacional a defesa de que houvesse um movimento junto ao Ministério do Planejamento para recuperar esses recursos e estamos pressionando para que isso aconteça. Esse é um obstáculo que precisa ser resolvido desde já, porque sem dinheiro a gente não vai conseguir colocar a Conferência para funcionar.


O segundo obstáculo se relaciona com o segundo, pois diz respeito ao tempo. Nós temos uma etapa nacional projetada para os dias 1, 2 e 3 de dezembro. Este tempo é extremamente exíguo, curto, e por isso cada ação de organização da Conferência deve ser feita considerando a necessidade de imprimir uma agilidade ao processo. Não é possível fazer uma conferência fantasma, sem divulgação e sem preparação. Isso precisa ser garantido. O primeiro passo, portanto, é a elaboração do regimento interno da Conferência. Fizemos uma reunião no dia 19 de junho, na qual debatemos uma minuta do regimento apresentada pelo Ministério das Comunicações.


O que o Intervozes defende para a Conferência Nacional de Comunicação?


J.V. – O Intervozes está formulando a sua plataforma, mas o que podemos adiantar é: nós defendemos que a política nacional de comunicação, que será discutida na Conferência, se paute pela noção da comunicação como um direito humano, pela noção de que o Estado tem a obrigação de assegurar esse direito e de que, para fazer isso, precisa se abrir e ser altamente democratizado com instâncias e processos de controle público sobre as políticas, sobre a prestação dos serviços e sobre o conteúdo veiculado nos meios. Além disso, o grande desafio da Conferência é dar conta de velhos problemas à luz dos novos desafios. Ou seja, precisamos dar conta dos velhos problemas de desconcentrar o sistema de comunicação, de assegurar a pluralidade e diversidade, assim como assegurar condições para que os segmentos populares tenham condições de se expressarem de fato nessa arena midiática. E isso significa acesso a tecnologias e a serviços como a banda larga e a telefonia. Precisamos garantir que o direito autoral e a propriedade intelectual sejam flexíveis e não gerem uma apropriação privada do conhecimento que inviabilize o uso e a circulação livre desses conhecimentos pela população. Precisamos, também, assegurar que o regime de exploração de serviços se dê através de contrapartidas e regras de transparência e de mensuração sobre as exigências e sobre a qualidade que cada um desses serviços precisa ter.


Como está a agenda política da Intervozes hoje?


J.V. – Na nossa agenda política, a prioridade máxima é a Conferência. Temos ainda várias discussões em relação à comunicação pública que estão se dando. Continuamos nos preocupando com a questão das concessões, uma bandeira que levantamos junto com um conjunto de entidades, para que possamos construir um sistema democrático e transparente. Esse é um tema que continua permanente. Também estamos colocando em debate questões como banda larga, telecomunicações e a regulamentação de TV por assinatura, que irão trazer a questão da convergência. Falta clareza dos atores e mesmo nós estamos ainda estudando as melhores soluções para isso. Além disso, continuamos com nossas ações cotidianas para desenvolver ações de formação e sensibilização para o entendimento da comunicação como um direito humano.


Quem está organizando a Conferência no momento?


J.V. – A Conferência tem uma comissão organizadora nacional, formada por oito representantes dos empresários, oito representantes da sociedade civil não empresarial – como a FNDC, Fenaj, Conselho Federal de Psicologia, Intervozes etc. Existem ainda oito órgãos de governo e quatro representantes do Parlamento.


Na possibilidade da aprovação do controle social, quem, entre a população, está apto para controlar as mídias?


J.V. – O controle social demanda, obviamente, uma qualificação e uma formação da população, que tem que conhecer as regras do sistema de mídia, conhecer o modus operandi dos serviços. Mas, na nossa avaliação, é um equívoco achar que apenas especialistas têm opinião para dar sobre os meios de comunicação. O cidadão que percebe, em seu cotidiano, que um determinado programa é uma baixaria tem condição total de emitir a sua opinião, embora o controle seja um processo coletivo e várias opiniões individuais alimentem esse processo e resultem em propostas concretas.