Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Declaração irresponsável e descomedida

A declaração dada à BBC pela ministra da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República, Matilde Ribeiro, foi extremamente infeliz no que toca a seguinte parte:

BBC – E no Brasil tem racismo também de negro contra branco, como nos Estados Unidos?

Ministra – Eu acho natural que tenha. Mas não é na mesma dimensão que nos Estados Unidos. Não é racismo quando um negro se insurge contra um branco. Racismo é quando uma maioria econômica, política ou numérica coíbe ou veta direitos de outros. A reação de um negro de não querer conviver com um branco, ou não gostar de um branco, eu acho uma reação natural, embora eu não esteja incitando isso. Não acho que seja uma coisa boa. Mas é natural que aconteça, porque quem foi açoitado a vida inteira não tem obrigação de gostar de quem o açoitou.

Quando, respondendo se no Brasil havia racismo de negro contra branco, diz que o racismo é ‘quando uma maioria política coíbe ou veta direitos de outros’, parece afirmar que ele está institucionalizado no Estado brasileiro, a ponto de o Estado ser considerado racista, tal como foi o nazista e o fascista. Ora, se a maioria política coíbe ou veta (ao que parece, intencionalmente, a fim de prejudicar os negros) direitos de outros (os negros, de acordo com a ministra), o processo legislativo estará produzindo leis deliberadamente inconstitucionais, posto que coíbe e veta direitos assegurados na Constituição de 1988, indistintamente, a todos os brasileiros.

Não é nada ‘natural’ a reação de um negro não querer conviver ou não gostar de um branco, e vice-versa.

Argumento para ódios

O fato de ela estar investida na função pública, especialmente numa pasta proposta à edição de políticas de promoção da igualdade racial, torna suas manifestações vinculativas de suas idéias e procedimentos. A representante daquele ministério, especificamente quando diz achar ‘natural’ a reação de um negro não querer conviver e nem gostar de um branco, sem dúvida alguma explicita o seu direcionamento na pasta e incita, ainda que implicitamente, a discriminação entre estas duas ‘raças’ (realço o termo porque, em minha opinião, não coexistem as raças negra e branca, apenas existe a raça humana, que possui matizes de cor distribuídas entre seus integrantes). Se até um ídolo, seja ator, cantor ou escritor, deve-se policiar ao prestar declarações ou tomar determinadas atitudes – por elas influenciarem seus fãs – o que dizer de uma auxiliar do presidente da República. A função exige extrema responsabilidade e comedimento nas declarações dadas por quem a exerce.

Por fim, acho que o hors concours da infelicidade foi justificar essa atitude discriminatória tomada pelos negros contra os brancos pelo fato de aquele sempre ter sido ‘açoitado’ a vida inteira por este. Atribuir a autoria da ação do ‘açoite’ como motivo para pensar ser natural a manutenção dessa atitude de negros frente aos brancos é extremamente leviano e também pode ser argumento para explicar os ódios de muçulmanos e judeus, bem como de povos que foram dominados, no período império, pelos países que os dominaram.

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Estudante de Direito, Niterói, RJ