Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Em busca de legitimidade

O seqüestro dos funcionários da Rede Globo, em São Paulo, no sábado, foi mais do que uma nova demonstração de ousadia do crime organizado brasileiro. Trata-se de um passo avante na criação do que considero terrorismo nacional, feito nos moldes tupiniquins. É impressionante como tudo se copia. Até nas técnicas para se lidar com a opinião pública à base da força os criminosos buscam inspiração no exterior. E estou certo de que o modelo a ser adotado vem da profissional equipe comandada por Osama bin Laden e sua companhia ilimitada no Oriente Médio.

A nefasta idéia de se seqüestrar jornalistas evidentemente não é nova no mundo, mas no Brasil ganha nova variação com essa investida (não surpreendente) do PCC e derivados. É o seqüestro em troca de um favor para se divulgar proposta de criminosos. Se ainda tivesse cunho político, seria uma iniciativa que poderia entrar para a história recente como evidência de um momento de reação à corrupção ou aos escândalos de roubo do dinheiro público. Mas não é. É puro banditismo mesmo. E banditismo que não se intimida com nada e ninguém e usa todos os meios que lhe interessam para fazer valer suas ‘condições’, suas ‘propostas’, suas ‘reivindicações’.

Piores exemplos

Poderíamos dizer que estamos diante de um quadro em que se estabeleceu a ‘sindicalização’ do crime organizado no Brasil. A própria imprensa acaba vítima desse jogo cruel em que os bandidos medem forças com o poder público. Jornalistas e funcionários dos meios de comunicação, em São Paulo, têm realmente razão para temer por suas vidas. Afinal de contas, o PCC está agindo de cabeça erguida, sem temor, sem receios, bem focado em seus objetivos, como se fosse mais um organismo legalmente estabelecido em nosso país. Como se fosse mais uma instância de caráter privado a ser respeitada, ouvida e, quem sabe, até aplaudida.

E o pior é que não são apenas os jornalistas que se sentem atemorizados. Os demais cidadãos têm motivos para se preocupar, porque, se o processo de desenvolvimento de ‘empresas’ como o PCC não for estancado de maneira rápida e realmente eficaz, assistiremos não mais apenas à ousadia de bandidos organizados, mas a uma movimentação para legitimizaçaõ disso tudo. Não que o Estado venha a tornar suas ações legais: eles mesmos estão se vendo como legítimos, merecedores da atenção da mídia e do reconhecimento de sua atuação nos presídios e nas favelas.

O ponto final que os governos não conseguem colocar nisso tudo, especialmente porque a preocupação atual é com a contabilidade de votos para as eleições, e não com o bem-estar do povo, tem amargas conseqüências. Episódios semelhantes a esses ou até piores, cuja inspiração está nos piores exemplos da humanidade (dos terroristas internacionais), continuarão a ocorrer e colocarão em risco toda a sociedade. E certamente vão se expandir para fora do eixo Rio-São Paulo, para desespero dos governos estaduais que hoje assistem a todo esse cenário de aparente tranqüilidade.

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Jornalista, assessor de imprensa em Florianópolis