Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Grupo de mídia censura jornal

Assim como o Conde de Cavour, eu também ‘não considero possível represar os abusos da imprensa com leis repressivas. Contra a imprensa não há outro remédio profícuo senão a mesma imprensa’. Por isso minha luta tem se dedicado à melhora do nosso jornalismo, principalmente em se tratando do jornalismo local, seja através do debate, das críticas, sempre no sentindo do crescimento. Às vezes, há o exagero nas críticas, é claro, ninguém é de ferro, e por isso mesmo, quem escreve e critica a imprensa sempre também tem que estar pronto para receber as críticas, do mesmo jeito que as faz.


Porém, vou abortar este prefácio para ir direto ao assunto, que envolve política e imprensa versus imprensa, e que está em pleno andamento na cidade de Itajaí, litoral norte de Santa Catarina. Tudo começou um dia antes das eleições municipais de 2004, quando trabalhava num jornal diário da cidade; algumas ligações nos informaram para um vídeo que passaria, em momentos, no canal 25 da TV a cabo, a TV Itajaí. O vídeo mostrava o que parecia um flagrante de compra de votos. Quem supostamente compra os votos na ‘câmera-escondida’ é o bispo Samuel Francelino, pai do então candidato a vereador Fernando Francelino, que hoje é suplente de vereador.


‘Militância partidária’


Samuel de Oliveira Francelino é um dos proprietários da TV Brasil Esperança, da Rádio 106,7 FM, da Fundação Educacional e Cultural de Itajaí, que também sustenta outros projetos na cidade, como uma casa de recuperação para viciados em drogas. Tão logo o vídeo saiu, os advogados do candidato conseguiram liminares proibindo sua veiculação, assim como a menção à filmagem nos principais jornais da região. Assim, a história ficou praticamente desconhecida da maioria do público, e somente algumas poucas dezenas de pessoas souberam do vídeo. Os Francelinos conseguiram abafar do melhor jeito a história, que chegou à Justiça, mas o processo correu em sigilo.


Como o bispo Samuel é candidato a deputado estadual em Santa Catarina, pelo PTB, mais ou menos pelo fim de maio deste ano comecei a procurar informações sobre o caso. E assim nascia a capa do jornal Platéia de julho. Que agora está censurada na internet por conta de uma intimação que nos obrigou a retirá-la do ar. A capa trazia o título ‘Você venderia seu voto?’ em cima de imagens retiradas do vídeo – também retirado do ar pela mesma intimação recebida nesta sexta, 28 de julho – onde é possível ver e ouvir o bispo Samuel oferecendo ‘trinta pra ti, trinta pra ela’ ao casal que usou a câmera no comitê de campanha de seu filho, Fernando Francelino, em 2004. Além dos 30 reais para cada um, até mesmo um ‘sacolão’ é oferecido ao casal. O vídeo já se espalhou e pode ser encontrado neste link do site YouTube.


A matéria foi para as ruas na segunda-feira, 24 de julho, e trechos do vídeo foram para meu blog. Neste mesmo dia, o advogado (e comentarista da TV Brasil Esperança) Denísio Dolásio Baixo entrou com liminar contra o jornal e o blog, exigindo, além da retirada do ar dos dois sítios (o do jornal e o blog) até as eleições, também o recolhimento dos exemplares impressos do jornal Platéia. Tentaram, também, implicar a mim e ao jornal em ‘militância partidária’, alegando que eu estaria fazendo isso para ajudar outros candidatos.


Sem direito de resposta


Nos dias seguintes, um colunista político do maior jornal de Itajaí, o JC, entrou no assunto. No jornalístico da TV Brasil Esperança, ao meio-dia da quarta-feira (26), este colunista foi achincalhado pelo comentarista Denísio Dolásio Baixo, como é costume dele quando algo contraria seu pensamento ou sua ideologia. Xingou o Platéia, mas sem citá-lo ou citar meu nome, autor da reportagem. O vídeo também apareceu – apenas citado, mas apareceu, finalmente – na história: Denísio disse que Samuel Francelino, seu filho Fernando Francelino e a apresentadora do programa Brasil Esperança, do mesmo canal, Alice Barbetta (que também aparece ativamente do vídeo, e está envolvida no processo) foram inocentados em primeira instância, o que é correto e está na minha reportagem no Platéia.


Entretanto, o comentarista, em sua furiosa fala, que começava, inclusive, defendendo a liberdade de imprensa, esqueceu-se de citar que o Ministério Público recorreu contra a decisão do juiz que os considerou inocentes por achar que o vídeo era montagem). Se não estou enganado, a omissão é uma forma de mentira. Como a defesa da liberdade de imprensa quando, horas antes, o próprio Denísio pedia a retirada de circulação de um jornal que levava a público algo que já fora mostrado anteriormente.


De qualquer modo, a ‘guerra’ na cidade está declarada, e aumentou ainda mais quando outro jornal da cidade, Diário do Litoral, entrou na briga defendendo o direito à liberdade de imprensa e contando todo o caso. O outro jornal diário da cidade tomou partido da TV Brasil Esperança em editorial pejorativo ao Platéia e seu editor. E me impediu de publicar meu direito de resposta, pelo que terei de recorrer à Justiça. Resta esperar para ver de que lado a sociedade vai escolher ficar, assim como pela posição dos jornalistas da região quanto a este caso.

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Editor do jornal cultural Platéia