Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O mal endêmico da sociedade

Mais uma vez o monstro chamado corrupção volta a assolar o nosso país. Mais parece um mal endêmico da nossa sociedade. Desde os tempos da cobrança do ‘quinto’ (imposto recolhido pelos portugueses sobre a produção do ouro), até os dias atuais, a corrupção atrai os malfeitores e corrói as estruturas do nosso povo.

A democracia, por mais nova que seja no Brasil, consolidou-se muito nos últimos anos, mas com os recentes acontecimentos tende a ficar desacreditada por uma grande parcela da população. Após os incidentes com o PT, que sempre se autoproclamou o paladino da ética e da moral, vários cientistas políticos apontam que o número de votos brancos e nulos deve aumentar consideravelmente nas próximas eleições.

A corrupção é, infelizmente, um mal encravado na nossa sociedade. Em países de Terceiro Mundo, como o Brasil, ela anda lado a lado com o subdesenvolvimento do povo. Começa em casa, com ‘pequenas mentiras’, passa para os filhos, acontece nas escolas, cresce junto com o homem e vai parar nas instituições públicas.

O combate à corrupção deve acontecer de maneira forte, até mesmo radical. Devem acabar as regalias, as proteções e os escudos que protegem os poderosos corruptos. A sociedade, aquela que não é corrupta, mais uma vez não só se vê enganada, como decepcionada. É duro constatar como existem pessoas desonestas em nosso país. Por mais ingênuo que seja esse pensamento, assusta ver e ouvir pessoas falando, descaradamente, de esquemas para desviar dinheiro, conseguir facilidades ou literalmente ‘se dar bem’.

Max Weber afirma em sua obra-prima Ciência e política: duas vocações, que o ‘político deve viver para a política, e não da política’. Pois aqui, eles não só vivem da política, como se apropriam dela para crescerem na vida a custa dos impostos dos outros.

Porém, como em qualquer doença, a prevenção é o melhor remédio. E como prevenir a corrupção? Com o medicamento chamado educação. Sem educação não há desenvolvimento, não há crescimento, não há justiça social. Sociedades desenvolvidas são sociedades com alto índice de escolaridade e taxas mínimas ou nulas de analfabetismo. Em quanto nossos governantes não resolverem investir, de maneira séria, planejada e determinada em educação, vamos continuar convivendo com todos os males de uma sociedade capitalista, democrática mas atrasada, do século 21.

Para o filósofo alemão Hegel, a educação é a forma da razão pela qual se estabelece a liberdade e, com isso, se sustenta a sociedade. A educação nada mais é do que um dos pilares fundamentais de uma sociedade justa.

Tolos são aqueles que acham que a solução está próxima. Mesmo se o atual governo tomasse medidas eficazes e práticas para mudar a situação da educação no Brasil, isso levaria, ao menos, duas décadas para produzir resultados que sejam sentidos por todos. Projetos existem, vários, de muitas tendências e enfoques. Porém, até lá, infelizmente teremos que conviver com muitas outras desgraças.

Papel da imprensa

A imprensa sempre foi uma fiscalizadora da democracia. Onde não há democracia, a imprensa não perdura. Por razões óbvias. Nós, jornalistas, devemos cobrar mais, lembrar mais a população que o sistema democrático é feito, na prática, pela participação popular.

No Brasil, escândalos são acobertados por outros escândalos. Com isso, a pauta vai mudando conforme o andar da carruagem. Recentemente, um incrédulo Sérgio Naya foi absolvido das acusações feitas contra ele pela promotoria pública, que o considerava culpado pelo desmoronamento edifício Palace II, no Rio de Janeiro, com vários mortos. No Jornal Nacional, o assunto mereceu apenas uma nota coberta. Exceção foi a ótima, inteligente e dura crítica de Arnaldo Jabor, na rádio CBN.

Soluções para isso? Que tal seções fixas para lembrar o ouvinte/telespectador/leitor sobre o andamento de antigas denúncias ou processos que correm na Justiça? A internet é uma ótima ferramenta para isso. Dinâmica, ela já está presente no dia-a-dia de milhões de brasileiros.

Octavio Ianni, em O Príncipe eletrônico, caracteriza a importância da mídia, principalmente da eletrônica, no contexto da atual sociedade globalizada, considerando-a substituta do ‘príncipe’ de Maquiavel e do ‘moderno príncipe’, de Gramsci.

‘Se queremos compreender a crescente importância das tecnologias eletrônicas, informáticas e cibernéticas, no mundo da mídia, o que é fundamental para compreendermos a crescente importância da mídia em todas as esferas da sociedade nacional e mundial, é importante começar pelo reconhecimento de que o século vinte está profundamente impregnado, organizado e dinamizado por técnicas sociais. São inúmeras as inovações tecnológicas que adquirem o significado de poderosas e influentes técnicas sociais’.

Reforma política

Mesmo assim, algumas mudanças imediatas podem e devem acontecer no Brasil, para, ao menos, vermos alguma luz no fim do túnel. A sociedade com o povo na rua, a imprensa com seu instrumento de cobrança e os poucos políticos sérios desse país devem defender uma reforma política urgente. Enquanto se mantiver a desorganização do cenário político, episódios lamentáveis farão sempre parte das manchetes de todos os jornais e Brasília seguirá sendo uma das capitais mundiais da corrupção.

Essa reforma política deveria rever toda a legislação eleitoral brasileira, impor regras mais rígidas para alguém concorrer a um cargo público, exigir mais transparência e ficha limpa de todos os candidatos. Sugestões como o voto distrital, financiamento público e único para campanhas, igualdade de valores gastos devem ser analisadas e discutidas para se obter o melhor formato para a nação. Mas um formato que atenda as necessidades e carências do sistema político e de toda a sociedade. Isto significa acabar com o ‘feudalismo’ existente em regiões como o Nordeste e o Centro-Oeste, onde os grandes senhores ainda mandam em suas cidades ou estados.

O governo Lula sinaliza, somente agora, com a intenção de acelerar uma reforma política. Não podemos desperdiçar uma oportunidade dessas com motivações momentâneas, oportunistas e eleitoreiras. É uma chance única para o Brasil e deve ser discutida e muito bem analisada.

Nosso sistema eleitoral, com eleições a cada quatro anos e direito a reeleição, favorece o esvaziamento de ações públicas duradouras e efetivas. O governante que se candidata a reeleição produz, ao longo de seu mandato, políticas eleitoreiras e que visam agradar a seu eleitorado. Um governo que pensa na reeleição nunca faria uma reforma do funcionalismo público, por exemplo, por saber que, mesmo necessária, acarretaria protestos e votos perdidos.

Um sistema sem reeleição, com mandato presidencial de seis anos, daria estabilidade e tranqüilidade para um governante realizar ações reais no Estado. A democracia precisa de rotatividade no poder.

Falta a todos nós, jornalistas principalmente, maior participação na tão sonhada e batalhada democracia. Uma democracia não é feita somente pelo pagamento de impostos. Ele é feita de participação popular, exige transparência e, acima de tudo, ética para governar e saber ouvir o povo.

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Jornalista, Campinas (SP)