Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O mesmo tema, abordagens diferentes

Em artigo publicado neste Observatório, já analisamos uma edição do programa Profissão Repórter, 07/12/2010, cuja temática era violência nas escolas. Nesse texto, chegamos à conclusão que o programa deixou uma mensagem de culpabilização dos professores pelas mazelas da profissão. Em conversa com um colega sobre o mesmo programa, constamos que na mesma data os telejornais da Rede Globo também trouxeram notícias sobre a educação por conta da divulgação dos resultados do Pisa. No caso do Bom Dia Brasil, são apresentados os números do avanço insignificante tido pelo Brasil em relação a seu próprio desempenho em versões anteriores do Pisa. A reportagem é seguida por um comentário de Míriam Leitão. Da fala da jornalista destacamos o seguinte trecho:

‘O Brasil está muito atrasado na educação e, com esse ranking, a gente não vai ser a potência que se sonha em ser. Não tem jeito. Hoje este é o maior desafio econômico. Não é um desafio social. É preciso avançar na educação.(…) O que pesa mais nesse resultado? Talvez tudo. Falta interesse dos alunos e falta interesse dos professores. Mas o interesse do aluno tem de ser despertado pelo interesse do professor. O país deve colocar a educação como prioridade. Esta é uma tarefa de todos nós. É nosso grande desafio no século 21: ou a gente avança ou a gente perde o projeto de [raiz].’

Números falam por si

Vemos que o comentário acentua a responsabilidade do professor no despertar o interesse dos alunos, um posicionamento até razoável. Mas trata a questão sem qualquer problematização das causas do desânimo dos docentes. Na sequência, vemos formulações genéricas postas como verdades incontestáveis, mas que não explicam nem propõem nada. O que temos fazer para superar o mencionado ‘grande desafio’? Ou então, qual foi o trajeto que nos trouxe a esse ponto? Perguntas sem respostas. No Jornal Hoje, vemos uma mera exposição dos dados: o Brasil está entre as três nações que mais evoluíram na educação, nos últimos nove anos. Mesmo assim, aparece em quinquagésimo terceiro lugar.

Países que mais evoluíram:

Luxemburgo: 38 pontos

Chile: 37

Brasil: 33

A média brasileira foi de 401 pontos. A média geral dos 65 países do Pisa chegou a 496.

Brasil: 53º lugar

Média: 401 pontos

Pisa: 65 países – Média geral: 496 pontos. China, Hong Kong e Finlândia tiraram as melhores notas.

1º China (Xangai): 577 pontos

2º Hong Kong: 546

3º Finlândia: 543

Na América Latina, o Brasil aparece em quarto lugar, atrás do Chile, Uruguai e México.

1º Chile: 439 pontos

2° Uruguai: 427

3º México: 420

4º Brasil: 401

Sem comentaristas e sem nenhuma palavra dos âncoras para explicar o lento avanço, ou até mesmo nosso fracasso. O que se vê são apenas os dados de forma comparada com os países com melhor pontuação e até alguns vizinhos de continente. Impera a noção segundo a qual os números falam por si só ou se bastam.

Educação nunca foi prioridade

No Jornal da Globo, temos uma apresentação dos dados também com a noção de que o Brasil avançou, porém menos do que devia. A reportagem é mais opinativa e merece destaque a fala do ministro Fernando Haddad, segundo o qual os grandes desafios do país são a formação dos professores e sua valorização. O economista Cláudio de Moura e Castro também menciona os baixos salários e o fato de as escolas se constituírem em um ambiente de trabalho pouco atraente.

Em seguida à reportagem, vem o comentário de Arnaldo Jabor. Para o comentarista, a situação educacional do país remonta à formação colonial, na qual o governo colonial português não fez a mínima questão de incentivar a educação. Pelo contrário: proibiu a impressão de livros e dificultava ao máximo a circulação de conhecimento. O resultado dessa concepção vem desembocar nos dias de hoje, com a pontuação baixa do país numa avaliação internacional, um país que em nenhum momento a educação da população foi prioridade.

Seria de se estranhar se o Brasil fosse dono de um desempenho satisfatório no Pisa. Educação nunca foi nossa prioridade, nem no período colonial, nem depois da independência. O curioso é que o único telejornal que abordou as reais causas do problema educacional brasileiro é veiculado num horário em que a maioria da população está dormindo.

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Professor de História, Ponta Grossa, PR