Mais de 100 professores feridos e ao menos um terço deles, com alguma gravidade, acabaram no hospital. Cenas de professores, de senhoras que ensinam criancinhas, nossos filhos, chorando, em desespero, balançando bandeiras brancas implorando pelo fim da brutalidade insensata e injustificável da PM do Paraná comandada por Beto Richa (PSDB), na tarde de quarta-feira (29/4).
Não importam as razões do protesto dos professores – legítimo, contra cortes em seus direitos trabalhistas e contra a ganância do governador sobre suas aposentadorias – e sim, que cenas de extrema brutalidade da PM contra trabalhadores desarmados são intoleráveis. Enquanto aconteciam as agressões, deputados se encastelavam em seu prédio legislativo prontos para passar por cima da voz do povo nas ruas e de seus direitos.
Não há qualquer tipo de ponto de contato entre povo e seus políticos. É a triste verdade. O voto é insuficiente para efetivamente garantir democracia e a PM é a arma que os políticos usam para manter seu controle e para calar a voz dos descontentes que ousam se levantar.
Mas os políticos e a PM não estão sozinhos. Eles tem a mídia para ajudar, para deslegitimar lutas, para criar factoides, para justificar a violência como se não passasse de uma resposta legítima, uma tentativa de “acalmar”, de trazer o retorno da normalidade.
Lágrimas de dor, ódio e humilhação
Milhares de professores marchando encontraram pela frente centenas de PMs prontos para agredir e, com “sorte”, matar. Não, não são despreparados, são apenas assassinos potenciais esperando o momento em que a coleira será afrouxada e poderão atacar, se refestelar no sangue de professores indefesos (ou de negros em favelas, de pobres em geral, enfim, dos mais vulneráveis).
Enquanto isso, a mídia comercial repete e repetia o mantra: Confronto.
Seria risível não fosse trágico e não fosse uma declaração inequívoca do alinhamento vergonhoso e mesmo criminoso da mídia com o poder, com os poderosos. As imagens mostravam professores sangrando, muitos desmaiando, em desespero, sendo vítimas de bombas e gás enquanto alguns poucos buscavam formas de se defender. Poucos, repito, buscando uma pedra na vã tentativa de frear o avanço dos PMs cheios de ódio.
Mas o ato de levantar uma pedra, de defender-se ou mesmo o de apenas cair baleado é o suficiente para a mídia e os jornalistas de plantão gritarem: Confronto!
Um lado sangrava no asfalto, sufocava pelo chão, tinha o rosto nublado por lágrimas de dor, vergonha, ódio, humilhação buscando escapar com vida; o outro mirava, atirava e sorria. Lugar comum, PMs sorrindo uns com outros e apostando quem conseguiria acertar a vítima que mais vulnerável parecia. Acontece com mais frequência do que o aceitável. E o aceitável seria jamais acontecer.
“Confronto” ou massacre?
Feridos, só temos de um lado. Aliás, há também feridos do lado da mídia, jornalistas, o elo fraco que trabalha pro mais forte: um jornalista foi atacado por um cão da PM. Jornalistas são sempre atacados pela PM em manifestações. São incômodos e, mesmo sem querer, muitos acabam gravando algo comprometedor, as imagens desmentem as palavras, desvelam manipulações.
Não quero dizer com isso que todo jornalista esteja atuando apenas a serviço do patrão para criminalizar manifestações, mas infelizmente com a grande mídia é a regra. Ainda que o jornalista em si seja parte do bolo dos fracos. Apanham como os fracos, mas alguns até se sentem fortes.
Para chamar de “confronto”, seria preciso que dois (ou mais) lados estivessem interessados em se digladiar. A realidade é bem diferente disso. Trata-se de um massacre. O único “confronto”, enfim, é o da mídia contra a verdade jornalística, contra a ética, mesmo contra a decência. E ainda assim um confronto desigual porque a mídia, como a PM, supera enormemente seus respectivos adversários.
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Raphael Tsavkko Garcia é doutorando em Direitos Humanos e mestre em Comunicação