Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Rádio fechada, radialista preso

Como acontece diariamente, em todo o país, rádios comunitárias sem licença para transmitir foram fechadas durante a última semana, e tiveram seus equipamentos apreendidos. As notícias sobre fechamento e prisão relacionadas a emissoras de baixa potência que atuam sem autorização são freqüentes. Nelas, são divulgadas a situação dessas emissoras – geralmente batizadas como ‘piratas’ – a ação policial, as razões da Anatel e o despacho do juiz, mas nada sobre as dificuldades acerca da regularização que essas rádios enfrentam, apesar da Lei 9.612/97 (que institui o Serviço de Radiodifusão Comunitária).


Embora inscrita há cinco anos no Ministério das Comunicações com pedido de outorga, a rádio comunitária Líder FM, de Pelotas (RS), que possui todos os documentos exigidos por lei encaminhados, ainda não conseguiu autorização para funcionar, e por isso opera apoiada no protocolo de entrada dos documentos no Minicom.


Na última quinta-feira, 26, por volta das 9 horas, agentes da Polícia Federal em Pelotas fecharam a rádio comunitária Líder FM e prenderam – algemado – o presidente da emissora, Elton Garcia. Os agentes da PF portavam um mandado de busca destinado a uma outra emissora (Associação Comunitária Fragatense) que funcionava antes no local. A rádio estava operando quando a PF chegou. ‘Eles não me deixaram chamar o advogado’.


Segundo Elton, apesar de mostrar aos policiais a documentação da rádio – que desde 2002 está protocolada no Ministério das Comunicações – não lhe foi dado o direito de sequer de defesa naquele momento. ‘Foi uma arbitrariedade eles me algemarem. Eu nem mesmo resisti à prisão’, conta Elton, que precisou pagar 100 reais de fiança para ser liberado, na delegacia, após prestar depoimento. O equipamento da rádio ficou retido e o radialista responderá a processo por operar radiodifusão sem homologação. O caso que aconteceu em Pelotas não é diferente dos episódios noticiados semanalmente, mas serve para reforçar a emergência de solucionar a questão da radiodifusão comunitária no Brasil, cuja Lei Federal é considerada ineficiente, pelo setor, e os processos extremamente demorados.


O que diz a PF


Na Delegacia da Polícia Federal, em Pelotas, o delegado responsável pelo inquérito não foi localizado para dar informações sobre a ação. Outro delegado da PF local, Eduardo Tavares, informou, porém, que na posse de um mandado de busca para determinado endereço por funcionamento clandestino de rádio, como foi o caso, ele é cumprido. ‘Até porque ali estava funcionando uma rádio ilegal. Às vezes, troca o nome, mas seguem os equipamentos, a freqüência. Então, isso não é suficiente para se questionar a validade do cumprimento’, argumenta o delegado, tomando por base outros casos que acompanhou. O delegado Tavares observa que neste caso da Líder houve a situação de flagrante, porque a rádio estava operando ilegalmente quando foi feita a diligência.


Ilegalidade é questionada


A Associação Cultural e Assistencial Rádio Comunitária Líder FM, conforme declara Elton, cumpre todos os requisitos solicitados pelo Minicom e tem encaminhado um pedido de proteção judicial que não foi julgado ainda. ‘Nossa orientação é de que com o pedido de proteção judicial, mesmo enquanto ele não fosse julgado – ou negado – nenhum juiz iria dar um pedido de busca e apreensão para nós’. Elton Garcia foi indiciado criminalmente e diz que pretende mover uma ação judicial contra o ato da PF.


Segundo o advogado Paulo Fernando da Silveira, juiz federal aposentado da 1ª Região (Brasília), conforme matéria publicada no e-Fórum (6/4), quem já requereu autorização no Ministério das Comunicações há mais de 60 dias e não obteve ainda a solução, pode entrar com mandado de segurança para não ter os bens apreendidos até a decisão final sobre o procedimento administrativo (isso já foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça).


Silveira aconselha juntar as decisões do STJ sobre estas ações para montar a defesa. ‘A falta de conhecimento sobre os procedimentos dificulta ainda mais o que já é frágil. O problema é que a maioria das rádios comunitárias não possuem assessoria jurídica instruída nesta área e a defesa é fraca’, explica. O próprio delegado Tavares, da DPF de Pelotas, afirma que a demora excessiva dos processos tramitando no governo é um problema que prejudica muitas associações comunitárias que querem ter suas rádios no ar legalmente. Ele reconhece que as associações esperam tempo demais para conseguir suas licenças e a morosidade dos processos induz à ilegalidade, mas destaca que este é um problema burocrático que precisa ser resolvido no âmbito da Anatel e do Ministério. ‘A Polícia está fazendo seu papel, cumprindo a lei penal. Disso não podemos nos abster’, justificou, concluindo que a radiodifusão é uma atividade séria e não pode ser praticada à revelia.


Sobre a comunitária Líder FM


A Associação Cultural e Assistencial Rádio Comunitária Líder FM é ligada a movimentos sociais, associações de idosos, escolas de samba, associações de moradores. ‘São 17, no total, as associações que fazem parte da comunitária, que utiliza os 25watts de potência para operar no bairro Fragata, para uma população de cerca de 100 mil habitantes’, destaca Elton. No episódio ocorrido na última quinta-feira, o radiodifusor conta que recebeu o apoio de pessoas da própria PF, do vereador Paulo Oppa e da comunidade. ‘A idéia é resistir e voltar a atuar. A comunidade se reunirá nos próximos dias para discutir procedimentos’.


Outras duas rádios comunitárias (Navegantes e JRKD) foram fechadas em Pelotas pela PF. Estas, portanto, segundo Elton, não tinham o protocolo legal do Minicom para apresentar.

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Da Redação FNDC