Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Um tiro na boa cobertura

Seria a redução da idade penal uma solução para conter o avanço da violência no Brasil? Quem se pauta pela imprensa está praticamente convencido que sim. Faz algum tempo o debate em torno deste tema, quando mediado pelos meios de comunicação, tornou-se um bode expiatório midiático suscitado para enredar a audiência num vínculo emocional, mantendo-a refém de um ardil da agenda setting. Que não se enganem os incautos: a imprensa já escolheu o seu lado. E ao menor pretexto, imiscui-se na fala e na escrita daqueles que compartilham da mesma opinião.

A mídia não precisa ser partidária da manutenção da idade penal em 18 anos, se não quiser. Basta ser justa. Mas como manter o equilíbrio diante de uma cegueira seletiva? Os meios de comunicação não enxergam o contexto da violência porque não discutem soluções para o problema. Não têm a preocupação de apresentar as causas, e menos ainda de propor soluções. Quão útil seria estudar a biografia de vítimas e agressores para decifrar os determinantes sociais, culturais e econômicos que expliquem as causas e os contextos da violência.

A imprensa cobre mal o tema infância e violência por desconhecer ou não se interessar pelo assunto. O jornalista desconhece, por exemplo, a miríade de fontes que permitiria a cobertura ideal. Não só isso. Em geral o viés jornalístico parte de um juízo prematuro ou equivocado. Lança-se sobre a família uma responsabilidade excessiva pelos deslizes dos filhos, sem contextualizar as ocorrências envolvendo crianças ou adolescentes.

Os mais explorados

Não seria mais justo com os jovens dar-lhes condições mínimas de saúde, alimentação e educação antes de puni-los? Suponho que ninguém arriscaria dizer o contrário. Por que então não se aborda a falta de políticas públicas de atendimento aos jovens e às famílias vulneráveis à pobreza? Talvez por ser mais fácil lançar a culpa a quem não tem poder de reação. Os governos – o atual e os que já se foram –, todos tem culpa neste cartório. E com sua abordagem parcial, a imprensa dá um tiro na boa cobertura.

Conforme observação da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi), quando o assunto é violência envolvendo crianças e adolescentes, a notícia chega ao leitor menos pelas mãos da editoria relacionada às políticas públicas e mais pelo espírito da editoria de polícia. Quando menos os assuntos são tratados por esta última, melhor é a qualidade das abordagens. Ainda assim, em média um quinto das reportagens são tratadas de forma sensacionalista para chocar o leitor.

No Brasil, a participação dos jovens na criminalidade está em torno de 10%. Eles são minoria, mas ainda vigora na mídia o mito da impunidade associado ao mito da periculosidade. No conjunto de infrações, os adolescentes cometem menos crimes violentos, mas são justamente estes os mais explorados pela imprensa, dando à sociedade a impressão de que são muito perigosos. Esta mesma mídia nem sempre lembra à população as leis e as punições impostas aos jovens. Há leis específicas. E eles são punidos, sim.

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Repórter da Gazeta do Povo (RS)