Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A grande reforma da senhora ministra

Juntos, sorridentes, os dois candidatos mais citados à Presidência da República conversavam amigavelmente sobre economia e perspectivas, à vista dos jornalistas, ao alcance de seus ouvidos. Mas ninguém se preocupava com a troca de gentilezas, os sorrisos e o bate-papo entre o tucano José Serra e a petista Dilma Rousseff: o assunto único das reportagens era a aparência da ministra, o resultado de sua plástica no rosto, seu novo penteado, suas botas, a saia, as franjas.

Repórteres e editores parecem não perceber dois fatos:

1. Cadê o lead?

2. O sexismo aparente, aberto, a transformação da mulher em objeto estético.

Voltemos um pouquinho no tempo: cada ministro do Supremo Tribunal Federal foi sabatinado no Senado, mas só a ministra Ellen Gracie recebeu elogios por sua elegância.

O ex-presidente José Sarney pinta cabelo e bigode, e não há reportagem sobre este assunto. O ex-presidente Fernando Henrique fez plástica para tirar as bolsas de gordura sob os olhos, e nenhum repórter foi verificar se ele ficou mais bonito. Para os meios de comunicação, não importa que um político homem seja bonito. E não importa também o que uma mulher faça, desde que esteja na moda.

Está na hora de mudar: Dilma, com plástica ou sem plástica, estava discutindo o futuro do país com seu provável adversário nas eleições. O que é mais importante: a conversa, o bom relacionamento entre adversários, ou a moda-Dilma?

 

Nassif e a Cultura

Terminou o contrato do jornalista Luís Nassif com a TV Cultura, ligada ao governo paulista. O contrato não foi renovado, e isso provocou uma série de acusações: de que Nassif estaria sendo afastado por pressão do governador José Serra, tucano, que não concordaria com suas posições político-partidárias. Pode ser que Serra não goste de Nassif e que a direção da TV Cultura saiba disso.

Mas há um detalhe que não pode ser esquecido: o contrato terminou. Se Nassif não quisesse renová-lo, estaria no seu direito. Se a emissora não quis renová-lo, estava no seu direito. Se Nassif pretendia mesmo renová-lo, isso indica que não estava desgostoso com a emissora.

Há uma enorme diferença entre romper um contrato e não renovar um contrato que expirou. Este colunista gosta pessoalmente de Nassif, já assistiu a seu programa no estúdio, mas reconhece que um contrato só deve ser renovado quando interessa a ambas as partes. O que não se pode é tentar partidarizar cada acontecimento, transformando qualquer desacordo em perseguição política [ver ‘`2010 já começou´‘].

 

Barriga

O blog de Ricardo Noblat

publicou, erradamente, que a Justiça Federal teria aberto processo-crime contra o bispo Edir Macedo, dirigente máximo da Igreja Universal do Reino de Deus e comandante da Rede Record, e outros seis diretores da emissora. Noblat explicou, secamente, que havia publicado por engano uma notícia antiga. Logo depois, divulgou a nota oficial da Rede Record, informando que tanto o bispo Macedo quanto os demais diretores da empresa foram absolvidos no tal processo.

Faz parte do jogo: às vezes se erra. Importante é verificar que, na já longa carreira do talentoso Noblat, os acertos superam largamente os erros, e ele tem se preocupado em corrigir eventuais falhas sempre que as comete – o que não é frequente. É visível que não houve má-fé, e isso é o que importa.

 

Escola Base – capítulo 2

Um dos episódios mais escandalosos do país, nos quesitos ‘abuso da liberdade de imprensa’ e ‘colaboração espúria entre autoridades e jornalistas’, começa a ser desmontado: é o caso Colina do Sol, em que quatro nudistas, dois brasileiros e dois americanos foram presos em Taquara, no Rio Grande do Sul, acusados de abuso de crianças, pornografia infantil e tráfico internacional de menores.

Os dois americanos, Frederick (64 anos) e Barbara (73 anos) acabam de ser libertados por ordem da Justiça, depois de um ano de prisão. Nenhuma das acusações se sustentou – nem a de que tinham criado uma complexa estrutura de auxílio à população só para abusar sexualmente de algumas crianças. As crianças negam o abuso, os pais negam o abuso, mas não adianta: três pais que se negaram a representar contra os acusados foram denunciados à Justiça por conivência.

Aconteceu tudo aquilo que a gente já conhece: entrevistas constantes de autoridades, cada dia com novas promessas de ‘fatos contundentes’, cada dia com novas acusações (uma delas: três adolescentes foram sido entrevistados por uma psiquiatra, que teria confirmado o abuso). Só que isso não estava no laudo.

Ao que tudo indica, houve ali uma guerra entre vizinhos e a polícia interveio em favor de um dos lados. E tome mentiras: por exemplo, a de que havia imagens nos computadores de atos sexuais com bebês. Nos três laudos do Instituto de Criminalística do Rio Grande do Sul, não há qualquer menção a isso.

Lembremo-nos da Escola Base: com fundamento em declarações de autoridades ávidas por holofotes, houve vidas duramente prejudicadas, houve o fechamento de uma escola que ia bem, houve crianças estigmatizadas. No caso de Taquara, tudo indica que a história se repete – e com uma agravante, os envolvidos são nudistas. Como se naturismo fosse crime. Como se naturista fosse tarado.

 

A Maysa da ficção

Agora que acabou a história de Maysa, vale a pena contar uma história não muito antiga. Foi quando Jayme Monjardim estourou como diretor de Pantanal, na Rede Manchete, o grande sucesso de novelas da época.

Uma repórter foi entrevistá-lo e, no meio da conversa, ele se referiu à mãe. A repórter quis saber quem era a mãe, ele contou: Maysa.

Repórter: E o que ela faz?

Monjardim: Foi cantora.

Repórter: Eu gostaria de entrevistá-la. Você me daria o telefone dela?

Na ocasião, já fazia mais de mais de dez anos que Maysa tinha morrido.

 

Olho na moça

Preste atenção em Alessandra Maestrini, que faz sucesso como a diarista Bozena, no programa Toma lá, dá cá, da Rede Globo: ela é uma excelente cantora, daquelas que estudaram canto, interpreta bem todos os gêneros musicais e tem a voz maravilhosa.

 

O morto sumiu

Na última coluna, estranhamos a falta de cobertura da imprensa para o atropelamento que matou Ricardo Whately Thompson, na saída do Hotel DPNY, estabelecimento chique de Ilhabela, SP. O atropelador, Ítalo Bacchi, se recusou ao teste do bafômetro ou ao exame de sangue, pagou fiança e foi embora. E os meios de comunicação silenciaram, embora houvesse famosos envolvidos.

Pois bem: uma fiel leitora desta coluna manda uma série de histórias sobre o mesmo lugar, e salienta que lá tudo é resolvido por um grupo de seguranças: a polícia finge que não é com ela. Alô, Secretaria da Segurança! Alô, repórteres! Por que não investigar a morte de Whately e outras histórias do hotel chique?

 

Os reclamões

Um leitor desta coluna envia e-mail dizendo que o ministro da Justiça, Tarso Genro, havia decidido manter no Brasil o cidadão italiano Cesare Battisti, cuja extradição era pedida por Roma. E protesta: ninguém publicou nada. ‘Imprensa de qualidade, não?’

Na hora em que chegou o e-mail, todos os sites já davam a matéria. Jornais, tevês, rádio, Internet, não se falava de outro assunto. Mas parece que pegou a mania: o sujeito lê uma notícia no jornal e pergunta ‘por que ninguém fala nisso’.

 

Como é mesmo?

A primeira notícia veio num grande portal noticioso, ligado à grande imprensa: ‘Avião cai em rio de Nova York – segundo testemunhas, sobreviventes foram vistos sobre as asas da aeronave’.

No mesmo portal, junto à notícia, a foto: o Airbus flutuando, com um monte de gente em cima das asas (aliás, ainda bem, sobreviveram todos). Será que exige muito esforço olhar as fotos antes de escrever as notícias?

 

E eu com isso?

A coluna do Ethevaldo Siqueira no Estado de S.Paulo de domingo (11/1) é de tirar o fôlego: tevês de LEDs (aquelas luzinhas que formam as lanternas dos carros ultramodernos), tevês em três dimensões, tevês a laser, tudo que apareceu na Feira de Las Vegas. Um espetáculo: até um notebook com menos de meio quilo.

Agora, sim: com todo esse equipamento fantástico, podemos tirar muito mais informação das notícias que recebemos. Por exemplo,

** ‘Sorridente e de decotão, Sharon Stone circula com namorado’

** ‘Amy Winehouse rouba bebida de hóspede em hotel no Caribe’

** ‘Matthew McConaughey corre acompanhado de seu cão’

Dá para imaginar muito melhor a cena quando já se viu o astro nessas telas inacreditavelmente bem definidas. E esportes, então?

** ‘Tataravô de Beckham trabalhava num ferro-velho’

** ‘Márcio Garcia joga futevôlei em praia do Rio’

** ‘Anna Kournikova sai de casa com look `pijama´’

Os shows serão muito mais vibrantes:

** ‘Carolina Dieckmann toma cerveja e dança no show de Preta Gil’

** ‘Priscila revela ter dois piercings e deixa os brothers curiosos’

E as notícias dos programas jornalísticos chamarão ainda mais a atenção dos telespectadores:

** ‘Noiva publica anúncio para achar convidados’

** ‘Beijo na rua pode render prisão em cidade mexicana’

** ‘Atriz Claudia Ohana vai à praia ao anoitecer’

Até a política internacional vai ficar mais interessante:

** ‘Anne Hathaway quer ser babá de Barack Obama’

 

O grande título

Bom mesmo, de chamar a atenção, este colunista só viu um nesta semana. Saiu num importante portal noticioso da internet. Mas nem é bom, é ótimo:

** ‘Lula e Chávez assim acordos bilateriais entre Venezuela e Brasil’

‘Bilateriais’ talvez tenha algo a ver com ‘bile’, coisa ‘assim’.

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados