Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

A resposta que não há, a resposta que nunca houve

A revogação total da Lei de Imprensa pelo Supremo Tribunal Federal é uma excelente notícia: é o fim de um entulho autoritário, de uma lei dos tempos da ditadura militar. Eventuais delitos cometidos pela imprensa caem agora na lei comum, válida para todos os cidadãos.

Este colunista, por princípio, é contra leis elaboradas para defender ou prejudicar determinados setores. Houve época em que jornalista era cheio de privilégios: não pagava imposto de renda, tinha 50% de desconto nas passagens aéreas, pagava apenas metade da Sisa (o imposto de transmissão de bens intervivos) quando comprava sua casa. E havia o outro lado, claro: ganhava tão mal que só comprava casa quando havia algum programa governamental de subsídio, só viajava de avião a serviço ou quando convidado, era isento de imposto de renda não apenas pela lei, mas pela falta de renda. O fim dessas supostas vantagens foi bom. Como é bom o fim de outra suposta vantagem, o tratamento diferente proporcionado aos meios de comunicação e jornalistas pela Lei de Imprensa.

O grande buraco legal, agora, é o direito de resposta. Está previsto na Constituição mas não está formalizado em lei. E daí? Daí que direito de resposta, até agora, era no fundo uma liberalidade do meio de comunicação. Quando o veículo queria brigar, o ofendido obtinha seu direito de resposta anos mais tarde. Ninguém mais lembrava do assunto, todo o prejuízo que lhe poderia ser infligido já tinha sido causado. Na prática, o direito de resposta (que, para ser eficaz, precisa ser rápido) não existia.

Agora, a situação é semelhante: o juiz pode determinar ao veículo que, num determinado prazo, divulgue a resposta do prejudicado. Mas há recursos, há a lentidão no andamento do processo, e o direito pode ser concedido daí a muitos anos – exatamente como hoje. Aliás, louve-se a iniciativa deste Observatório da Imprensa, sugerida pelo sempre atento e brilhante colunista Luís Weis: criar a seção ‘Direito de Resposta’, para que seja divulgada a tempo a posição do ofendido, ao menos na internet. E que o processo legal continue correndo.

 

O papel dos patrões

Seria interessantíssimo que os meios de comunicação também assumissem sua responsabilidade moral. Com frequência, aquilo que nas redações se chama de ‘outro lado’ não passa de um detalhe burocrático: o cavalheiro, acusado do assassínio da irmã, aparece na Redação com todos os parentes, todos vivíssimos, provando que não houve homicídio algum; e a reportagem de página inteira com a acusação é publicada do mesmo jeito, acrescida, à guisa de ‘outro lado’, da frase ‘o cavalheiro nega as acusações’.

Especialmente em casos desse tipo, um veículo bem intencionado deveria acolher imediatamente a resposta do atingido, da maneira mais ampla possível, tendo como limite apenas o tamanho da matéria que o ofendeu. Se o erro foi cometido, deve ser reparado na medida do possível.

Enfim, estamos agora numa nova era, livres da Lei de Imprensa criada pelo governo do marechal Castello Branco. Muita gente tem opinião oposta à deste colunista, e acha que é necessário elaborar uma nova Lei de Imprensa. Que se abra o debate. Mas que se dê algum tempo para ver como funciona a indústria da comunicação, quando sujeita à lei igual para todos.

 

A internet e o anonimato

Aliás, já que se fala em lei igual para todos, isso significa também que as notícias e opiniões divulgadas pela internet devem ter responsáveis identificados. É preciso saber quem se responsabiliza por eventuais excessos. É muito fácil atacar a honra dos outros usando assinaturas como ‘Inútil’, ‘Subempregado’ e outras quetais. A identificação é essencial, mesmo que o noticiarista, ou comentarista, continue a usar pseudônimos na publicação. Ou que, como no caso dos demais veículos de comunicação, o editor se responsabilize por aquilo que publica, podendo responder legalmente quando alguém se sentir atingido.

 

A patrulha e a resistência

Este colunista nem sempre concorda com as opiniões de Barbara Gancia; mas sempre as respeita, porque bem embasadas e fundamentadas. Além do mais, Barbara é divertida, ousada, toca em temas que muitas vezes o jornalismo esquece, tem uma amiga chamada Bucicleide e, embora esteja entre as estrelas da mídia, nunca se apresenta como dona da verdade. É boa gente, a Barbara Gancia.

E a Barbara, sempre paciente, está se cansando da patrulha ideológica. Ô, gente mais chata! Outro dia, chegou a dizer que pensa em desistir de seu blog. Se ela diz que comeu lulas en su tinta no almoço de ontem, vai receber mensagens extremamente agressivas, acusando-a de fazer campanha em favor do governador José Serra, de ser racista e por isso criticar o ministro Joaquim Barbosa, de pertencer ao PIG (justo ela que, embora descendente de italianos, não tem nada de palmeirense: é santista).

Outro dia, um blogueiro entrevistou um oncologista sobre o câncer da ministra Dilma Rousseff. O médico foi simpático, descreveu a moléstia, os sintomas que costuma apresentar, disse que o índice de cura supera os 90%, mas cometeu um crime gravíssimo, para os patrulheiros: disse que não votaria em Dilma. Foi o suficiente para acusá-lo de ter sido o responsável pelo vazamento da notícia de que a ministra tinha um problema de saúde (embora ele trabalhe em outro local e nada tenha a ver com a equipe médica que a examinou), para sofrer uma série de insultos e para que algum alucinado garantisse que ele tinha sido obrigado a dizer que não votaria em Dilma para não ser demitido por Serra – embora ele não trabalhe no serviço público e sim num excelente hospital particular.

Como diz Barbara Gancia: ‘Está começando a me cansar o fato de que vários internautas sempre vêem segundas e terceiras intenções naquilo que digo; estão começando a torrar meus pacovás os batráquios que lêem aquilo que querem em vez do que está escrito e, finalmente, eu não comecei um blog para entrar em guerra com grupos organizados que agem na internet para fazer propaganda política’. Pois é, Barbara, mas é preciso resistir. Os patrulheiros são incansáveis, mas quando não têm êxito buscam novos alvos. E quem é que você prefere, quem é que vai atender: a turma da patrulha ou seus leitores de sempre?

Em tempo: se Barbara disser que não gosta de lulas en su tinta, será imediatamente acusada de repudiar a origem humilde do atual presidente.

 

O papel…

Alguns dos maiores jornais do país perderam circulação no primeiro trimestre de 2009 (e, se lembrarmos que há alguns anos havia edições dominicais de 1,5 milhão de exemplares, embora turbinadas por brindes diversos, a queda é ainda mais assustadora).

Há dois problemas graves: um, a menor necessidade do jornal, como produto; dois, o custo. Cada aumento no preço do jornal se reflete diretamente nas vendas. E não há como segurar os aumentos quando, por exemplo, o dólar sobe. Mas os jornais enfrentam esse problema há mais de um século, e sempre conseguiram ampliar sua circulação. Isso indica que o principal problema é que os jornais, hoje, são menos necessários do que já foram.

De certa forma, isto é óbvio: há informações em abundância pelo rádio, pela TV, pela internet. Pode-se ficar bem suprido de informações sem ler jornais. Cabe aos jornais, portanto, suprir outra necessidade, ainda mais importante: a de estruturar, hierarquizar, priorizar informações. Isso, até agora, não vem acontecendo, ao menos na velocidade desejada. Assiste-se a um jogo de futebol pela TV, depois há os melhores momentos, as mesas-redondas, os comentários técnicos, as entrevistas. No dia seguinte, o jornal dá exatamente a mesma coisa.

Cabe aos jornais, também, exatamente pelo maior tempo disponível para sua elaboração, dar credibilidade às notícias. Não é aquele vapt-vupt da internet, onde muitas vezes não há tempo (nem disposição) para apurar: é algo mais pensado. Ou deveria ser.

 

…e a crise

Muitas vezes os jornais cometem erros que prejudicam sua credibilidade – e, portanto, tornam-se mais desnecessários. O caso da entrevista com o professor Antonio Roberto Espinosa, ex-comandante militar da organização armada VAR-Palmares, foi exemplar: o jornal publicou a matéria, feita por telefone; o professor disse que havia distorções importantes. O jornal, segundo diz, tem a gravação; seria simples colocá-la na internet, desmontando o desmentido do entrevistado. Não o fazendo, dá força a quem acha que houve distorção, e distorção deliberada. Junta-se a isso um erro grave: a publicação de uma ficha da hoje ministra Dilma Rousseff que teria sido elaborada pelos órgãos de segurança do regime militar – mas que, na verdade, foi divulgada pela internet, não obtida nos setores de informações, e aceita pelo jornal como boa. Só bem mais tarde houve uma meia-retratação, dizendo que a ficha pode ser falsa, mas também pode não ser.

 

Olhos nos olhos

Essa história de só fazer matéria por telefone é terrível. Ricardo Kotscho, exemplo de bom repórter, detesta entrevistar gente por telefone (e tem toda a razão): nada substitui o olho no olho, o contato pessoal, a credibilidade (ou falta de) a que só a proximidade permite. Este colunista, como assessor de imprensa, procura limitar entrevistas por telefone a esclarecimentos essenciais, de última hora, de emergência. Entrevista mesmo, daquelas boas, só pessoalmente. Telefone é muito bom para marcar hora e local da entrevista.

 

Bye, bye

Na Grã-Bretanha, um jornal até bem-feito, mas que sempre se destacou por dar a qualquer notícia um viés ideológico anti-ocidental, está acabando em fracasso, 23 anos após um lançamento espetacular: o The Independent está à procura de comprador. Preço: 1 libra (pouco mais de três reais, o preço de banca). Nem assim, nem tendo contratado o banco Lazard Frères para intermediar a venda, a Independent News & Media está conseguindo livrar-se do jornal. Talvez haja uma fusão com o Standard. A dívida está por volta de US$ 1,8 bilhão.

 

Como…

Um importante colunista, comentando outro dia as atuações de Ronaldo Fenômeno, disse que o importante não é o que está acontecendo: o importante é o que já aconteceu. Falta explicar o que aconteceu com Ronaldo e outras estrelas brasileiras na Copa de 2006, na Alemanha.

Pois é: falta explicar o que aconteceu com Ronaldo e outras estrelas brasileiras na Copa de 2006, na Alemanha. A propósito, que é que fazia em 2006 o colunista que se queixa da falta de explicações? Bingo: cobria a Copa de 2006, na Alemanha. E quando Ronaldo desmaiou pouco antes do jogo final da Copa da França, em 1998, que fazia o colunista que se queixa da falta de explicações? Cobria a Copa da França.

 

…é…

Saiu num grande jornal, comentando hotéis japoneses que, para baixar o custo, reduziram drasticamente o tamanho dos apartamentos, tão pequenos que passaram a ser chamados de ‘cápsulas’:

** ‘A menor das cápsulas tem 2,5 metros quadrados, mas o espaço de largura e comprimento é bem pequeno, pois ela tem pé direito alto, como todas as cabines do hotel’.

Este colunista nunca entendeu direito essas questões relacionadas a números, mas desde quando a altura entra no cálculo dos metros quadrados?

 

…mesmo?

De um portal da internet:

** ‘Ivete Sangalo pode estar grávida de uma menina’

Que coisa curiosa: ao que este colunista se recorde, qualquer mulher que esteja grávida, mesmo que não seja famosa, pode estar esperando uma menina!

 

E eu com isso?

Uma fiel leitora desta coluna, escrevendo do exterior, propôs o fim desta seção: em internet, dizia, as coisas são dinâmicas, têm de mudar. Este colunista chegou à conclusão de que a leitora tinha toda a razão; o tópico já estava cansando. Como sempre anuncia uma grande empresa jornalística ao se livrar de algum funcionário que está ganhando muito, vamos partir para novos e mais importantes desafios. Por exemplo: que é que vamos botar no lugar do ‘E eu com isso?’

 

O grande título

Coisa boa:

** Disputas legais e sociais a propriedade são pauta na Fiesp’

Deve ter sentido: alguma coisa há de querer dizer.

Mas o título malicioso é mais interessante:

** Penetração de celulares chega a 80,56% no Brasil’

Certamente são celulares silenciosos, daqueles que vibram ao ser chamados.

O grande título, entretanto, o melhor de todos, é o que revela ao mundo um novo tipo de aeronave:

** Avião presidencial voa baixo e causa a evacuação de sete mil pessoas em New York’

Alguém já tinha ouvido falar em avião laxativo?

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados