Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Como distinguir o aristocrata do playboy

Há uma diferença entre notícia fúnebre, elogio fúnebre e obituário. Estes são biografias (ou perfis biográficos) escritas a partir da morte do personagem e, como tal, são reportagens que precisam ser apuradas, pesquisadas, investigadas.

Banal e recheado de lugares comuns, sem dados novos ou percepções originais, o material publicado sobre a morte de Jorge Guinle nos jornais e revistas deste fim de semana. A começar pela qualificação de playboy dada ao falecido. Ele era um aristocrata, estrito senso.

Refinado, culto – nenhuma semelhança com, por exemplo, Baby Pignatari, este sim playboy autêntico, nada sofisticado, metido em farras homéricas, brigas, aventuras, carrões.

Esta história de que Guinle namorou todas as grandes vedetes de Hollywood dos anos 1940-60 foi uma blague, puro esnobismo. Na maioria dos casos desempenhou as funções de escort das estrelas hospedadas no hotel da sua família – o Copacabana Palace, no Rio. O esforço conjugado das relações públicas do hotel e das grandes produtoras americanas deixaram a impressão de que se tratava de um irresistível Don Juan. Era, num certo sentido.

A ninguém interessava desmentir essas fantasias – as estrelas viviam às custas desta imagem de mulheres arrebatadas, destruidoras de corações, os estúdios precisavam alimentar as fofocas dos colunistas especializados, ao hotel interessava badalar a família proprietária e a ele, como um charmeur, sedutor, fazia enorme bem ter esta fama.

Como todos os aristocratas que precisam de uma corte e algumas lendas à sua volta, Jorge Guinle estimulou as fantasias. Certamente envolveu-se com algumas estrelas mas não com aquela imensa galeria que a nossa mídia no último fim de semana exibiu como seu harém.

Playboys agarram-se a todos os prazeres, não têm grandeza. Aristocratas sabem escolher – inclusive a hora de morrer.