Wednesday, 24 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Entre tapas e carinhos

Um veterano dirigente político, muitas vezes truculento, muitas vezes gentil, sempre muito bem relacionado com a imprensa, costumava dizer que é preciso saber lidar corretamente com jornalistas. Alguns querem notícias, outros querem as vantagens da proximidade com o poder. O importante é não oferecer vantagens a quem quer notícias e, suprema heresia!, jamais oferecer notícias a quem gosta de vantagens. Outro importante cacique acrescentava mais um detalhe: entre as moedas mais eficientes a ser utilizadas para obter a simpatia de alguns jornalistas, estava também o elogio. Algo do tipo ‘olha, essa informação estou dando para você porque é o único que entende o suficiente do assunto. Se eu passasse a notícia para Fulano (cita o nome de um concorrente), ele diria besteira’.

A lisonja, as vantagens, as informações exclusivas continuam em pleno vigor. Aliás, convenhamos: a fonte que oferece informações exclusivas não vai ser queimada exceto por motivo extremamente forte. Mas nem todo político é hábil: agora mesmo, um inacreditável Fernando Collor de cabelos aloirados insulta em termos pesados um jornalista de Brasília e promete meter-lhe a mão na cara, a menos que ele admita que, como péssimo jornalista que é (…) e a história termina aqui, já que nem as queixas nem as exigências do candidato ao governo de Alagoas foram divulgadas. O jornalista ameaçado e o político ameaçador tomaram uma atitude comum: preferiram silenciar. Ambos têm em comum também uma cor. O jornalista ameaçado diz que não tem medo de agressão porque é faixa roxa em caratê. Já o político ameaçador já garantiu, há alguns anos, que tem ‘aquilo roxo’. E, ao que se saiba, coloriu apenas os cabelos.

É péssimo para todos: dá margem às ilações mais absurdas sobre a informação que atingiu com tanta força o fígado de Sua Excelência. Por que não abrir o jogo de vez e trazer a briga à luz do Sol, onde tudo aparece como é?

 

Verbas progressistas

O 1º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, de 20 a 22 de agosto, se realizará em São Paulo. Já estão inscritos 152 blogueiros, todos progressistas, de 15 estados (na hora em que o caro colega estiver lendo esse texto, já haverá mais inscritos). E quem paga a conta? Em boa parte, o imposto sindical – aquele dia de salário descontado compulsoriamente de todos os empregados, sejam ou não sindicalizados, em todo o país, sejam progressistas, liberais ou conservadores, e entregue aos sindicatos e centrais sindicais. Alguns patrocinadores: Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial, SP), CUT, CTB (Central dos Trabalhadores e das Trabalhadoras do Brasil), Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Sindicato dos Engenheiros, FNU (Federação Nacional dos Urbanitários), Federação dos Químicos de São Paulo.

E que o blogueiro Reinaldo Azevedo nem tente participar: não é progressista.

 

Subindo

Preste atenção no Diário de S. Paulo, em formato inusitado (entre tablóide e berliner), num único caderno, com três editorias: o jornal está acertando a embocadura e pode se transformar num grande êxito. Domingo (1/8), a propósito, é um bom dia para testar o novo jornal: há um texto do sempre competente Gabriel Priolli sobre Vladimir Herzog. Os dois foram colegas na TV Cultura, e seu trabalho conjunto só terminou com a prisão e assassínio de Herzog pela ditadura militar.

 

Guerra à imprensa

Denise Maerker é uma grande estrela da Televisa, jornalista de primeiro time, respeitada em todos os setores políticos, a maior entrevistadora de TV do México – é a Marília Gabriela de lá. Apresenta o programa Punto de Partida.

Pois Denise Maerker e a Televisa foram obrigadas a suspender seu programa de entrevistas devido à violência do tráfico de drogas. Quatro jornalistas foram seqüestrados por um grupo de narcotraficantes, que exige da emissora a transmissão de três vídeos denunciando a cumplicidade de autoridades do estado de Durango e narcotraficantes de um grupo rival. Denise Maerker fez este depoimento na Televisa. Em seguida, a emissora saiu do ar, e a tela ficou preta durante uma hora.

A reação de uma emissora menor, a Milénio, foi diferente: transmitiu os programas produzidos pelos narcotraficantes só para seu estado, Durango.

O Brasil não é o México, o tipo de crime organizado nos dois países é diferente, estamos mais longe dos maiores mercados consumidores de drogas. Mas também há notáveis semelhanças entre México e Brasil. É importante observar o que lá acontece, e aprender o que for possível, antes que chegue a nossa vez.

 

A força da cooperação

O vazamento das informações sobre a Guerra do Afeganistão só ocorreu porque um blogueiro insistente e bem-informado, Julian Assange, do Wikileaks, foi atrás delas. Mas só tiveram a repercussão que tiveram porque dois jornais impressos, The Guardian e The New York Times, e uma revista semanal, Der Spiegel, entraram pesado na divulgação, jogando sua credibilidade na reportagem.

Assange, do Wikileaks, é uma pessoa estranha: poucos o conhecem, não se fixa num lugar, está sempre em trânsito. O repórter Nick Davies, do Guardian, o caçou por 15 dias, até localizá-lo no Parlamento Europeu. A conversa entre ambos durou seis horas. Davies mostrou a Assange as vantagens que teria compartilhando partes da informação com o Guardian e, sugeriu também, com o NY Times; Assange propôs então a entrada de Der Spiegel no grupo. Enquanto os veículos impressos faziam suas investigações, o Wikileaks segurou a publicação. Quase um mês depois, checadas cuidadosamente as informações, todos entraram juntos no caso, em 25 de julho. E testaram com êxito a força conjunta da informação eletrônica combinada a jornais e à revista.

 

Pressa e imperfeição

Aconteceu de novo: uma funcionária negra do governo americano fez uma série de declarações, sem nada ofensivo. Um maluco dos grupos Tea Party, nacionalistas de direita e adversários da imigração, editou as declarações, conseguindo montar uma frase racista: a funcionária teria dito que jamais contrataria um branco. A montagem repercutiu na Fox News, e o presidente Barack Obama decidiu de bate-pronto: demitiu a funcionária. Agora já se sabe que houve montagem e Obama está sem saber o que fazer. É complicado: a comunicação se tornou muito mais rápida, a difusão de notícias é quase instantânea, mas a checagem continua necessariamente lenta. Notícia errada difundida rapidamente significa que mais pessoas serão atingidas mais depressa por informações não confiáveis.

 

Medo do povo

Um sábio empresário, profundo conhecedor da economia e da política, costuma dizer que tudo que existe só no Brasil, fora a jabuticaba, não dá certo. Tem razão: terminada a ditadura militar, estamos em outra ditadura que proíbe que se fale dos candidatos a cargos públicos. Em jornal, pode; em rádio e TV, não pode. Em internet, será que pode? Os candidatos, sempre um manancial de piadas, sempre excelentes modelos para imitações, foram blindados: não é permitido, sob pena de multas altíssimas, fazer humor a seu respeito (parece que humor a favor pode, mas humor a favor enfrenta o problema de não ter a menor graça).

A coisa é séria: na ditadura, Chico Anysio tinha ‘Salomé’, a professora gaúcha que dava pitos no candidato (e depois presidente) João Baptista. O repórter ‘Ernesto Varella’, personagem de Marcelo Tas, se divertia com o governador Paulo Maluf. Os americanos transformaram o poderoso Henry Kissinger no ‘Dr. Strangelove’, o Doutor Fantástico, que amava a bomba atômica. Sarah Palin, o furacão que foi candidata a vice, ganhou uma imitadora tão boa na TV que acabou dando entrevista a ela mesma (e Hillary Clinton, satirizada insistentemente no Saturday Night Live, apareceu no programa para satirizar-se a si própria).

Tudo bem, aqui ninguém imagina Michel Temer satirizando-se a si mesmo, nem Dilma ou Serra dando entrevistas a imitadores – até porque humor não parece ser o forte de nenhum deles. Mas poderíamos imaginar Marcelo Tas fazendo humor com política, como sempre fez. Não, não podemos: aqui política tem de ser fechada, mal-humorada, feia, com aquela seriedade soviética.

Ditadura é ditadura, caro colega. Pode ser militar, como tantas. Mas o dr. Oliveira Salazar liderou uma ditadura particularmente mal-humorada por dezenas de anos, era civil, mantinha os militares na linha e nem roubar ele roubava.

 

O ucasse

De acordo com as instruções em vigor, não se pode exibir novelas, filmes ou minisséries com conteúdo critico aos candidatos, mesmo que de forma dissimulada. Imaginemos, por exemplo, a novela Roque Santeiro, que já fez tanto sucesso no país: alguém poderia imaginar que o ‘Beato Salu’, cachaceiro de primeira, tivesse conteúdo crítico a político influente nas eleições. O filme Nosferatu também pode merecer interpretações restritivas, bem como Chuck, o Boneco Assassino. Até o teatro de revista pode entrar nas proibições: Tem Bububu no Bobobó não parece uma referência quase direta ao caso dos dólares na cueca?

 

Lei do silêncio

Só que toda essa regulamentação vai bater de frente com a realidade. No fundo, o objetivo é impedir que se manche a imagem dos políticos. E será preciso manchar sua imagem?

 

Ricos e pobres

Comecemos com uma opinião pessoal: este colunista é contra a construção de um estádio com verbas públicas em São Paulo. Primeiro, porque o estádio, para dar retorno ao investimento, precisa ter administração privada, e não é correto gastar dinheiro público numa obra para entregá-la a empresas particulares que poderiam levantar recursos próprios para construí-la; segundo, porque os organizadores da Copa no Brasil garantiram que não haveria necessidade de dinheiro público para realizá-la. E eles devem estar ansiosos para manter sua palavra.

Mas já está cansando o lengalenga dos jornais e das associações de bem-pensantes contra o uso de dinheiro público num estádio de futebol. Eles até podem ter razão, mas pelos motivos errados: o problema é que acham que dinheiro público não pode ser gasto em atividades que divirtam pobres. Pobre não precisa de lazer, de diversão: apenas de ônibus e metrô, para que não perca o horário de serviço, e de hospitais, para que possa voltar ao trabalho mais rapidamente.

Este colunista pesquisou editoriais e manifestos empresariais da época em que o governo paulista reformou uma antiga estação de trens e a transformou numa magnífica sala de concertos, a Sala São Paulo. Não há críticas, não. Nem à montagem de uma excelente orquestra sinfônica, orgulho nacional. São Paulo precisa, como maior cidade do país, de boas salas de concertos, de boas orquestras. Mas a argumentação é a mesma que pode ser utilizada para construir um bom e moderno estádio de futebol, capaz de atender também a outros eventos de massa.

E a quem serve a Sala São Paulo? A quem serve a Orquestra Sinfônica de São Paulo? A um grupo relativamente pequeno de pessoas de classe média alta para cima, capaz de pagar caras assinaturas por um belo concerto semanal (e que, embora altas, não cobrem as despesas, exigindo subsídios estatais – desses, os bem-pensantes não falam). Ao contrário do que acontece com grandes orquestras européias, não há em São Paulo concertos gratuitos ao ar livre. Vá ao YouTube, procurando André Rieu: o maestro holandês comanda grandes espetáculos gratuitos ao ar livre, fascinando multidões. Será que só na Europa isso é possível?

Este colunista é contra a construção de um estádio com recursos públicos, como já disse. Mas não podemos argumentar que um estádio custa ‘x’ casas populares e esquecer que outras atividades de lazer e cultura também podem ser medidas assim. Até porque, nos dois casos, a medição estará errada.

 

Leitura boa

Vale a pena, não só pelo livro, mas pelo personagem que o assina: Flávio Correa, Faveco, gaúcho divertido, inteligentíssimo, um dos grandes publicitários do país (que, escolhido pessoalmente pelo lendário mestre David Ogilvy, liderou a Ogilvy & Mather no Brasil e com ele trabalhou por 25 anos).

O livro começa bem: ‘O Brasil de cabo a rabo na visão de um publicitário politicamente incorreto’. E continua bem por 45 artigos, selecionados entre os que publicou na imprensa nos últimos dez anos – todos atualíssimos. É um livro para publicitários (a propósito, indispensável). É um livro para jornalistas, para políticos, para comerciantes. Faveco põe, na linha de frente de seus pensamentos, a satisfação do consumidor.

Curto e Grosso será lançado na quinta-feira (5/8), às 19h30, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, em São Paulo.

 

Como…

Do portal noticioso de um grande jornal:

** ‘O time caiu nas quartas diante de Camarões, que fez o gol da vitória na prorrogação mesmo com nove jogadores a menos em campo’.

Devem ter mudado as regras do futebol: antigamente, time com cinco jogadores a menos não podia continuar na partida. Ou mudaram a história: na verdade, Camarões ganhou do Brasil com nove jogadores em campo – dois a menos.

 

…é…

De um grande jornal, falando de vôlei:

** ‘Giba usou a braçadeira de capitão da seleção brasileira pela primeira vez em 2005, na Copa dos Campeões (…)’

Só que no vôlei não se usa braçadeira. O capitão é identificado por uma linha abaixo do número da camisa.

 

…mesmo?

De um grande portal noticioso:

** ‘Palmeiras vai enfrentar o Ceará desfigurado’

Um título normal, exceto por um motivo: quem estava desfigurado era o Palmeiras, sem quatro titulares, e não o Ceará.

 

Mundo, mundo

A imprensa noticiou como coisa comum a idiotice proposta por um deputado alemão, o democrata-cristão Marco Wanderwitz, de aumentar o imposto dos gordos para compensar os maiores gastos públicos com saúde. E por que é idiotice? Porque, em primeiro lugar, atingiria este colunista, que não ficaria nada feliz com isso; em segundo, por alguns exemplos históricos. Na Segunda Guerra Mundial, por exemplo, Churchill e Stalin seriam punidos com imposto mais alto, enquanto Hitler, que só não era pior por falta de espaço, seria poupado. Fernando Collor não pagaria extra, mas Lula, sim. Latino seria isento, e Tim Maia punido. Felipe Melo não tem problema de excesso de peso. Já o maior artilheiro das Copas em todos os tempos não é conhecido como Ronaldo Magrucho.

 

E eu com isso?

Temos uma semana farta em nudez e em incidentes sexuais. Coisa de doido!

** ‘Britânico é flagrado por vizinha durante ato sexual em cama elástica’

** ‘Para promover feira de tatuagem, participantes mostram nádegas’

** ‘Americana inventa estupro para namorado não descobrir traição’

** ‘Usar calças de cós baixo e revelador não é ilegal em Nova York’

Claro que não: não é lá que fica Wall Street, onde estão os cofres do mundo?

E, claro, não falta o frufru. Que é que vamos conversar com os amigos?

** ‘Paris Hilton diz que gosta de sair para pescar e caçar rãs’

** ‘Depois de première londrina, Tom Cruise relaxa no chão’

** ‘Urso destrói carro desgovernado ao tentar pegar sanduíche’

** ‘Cresce o número de brasileiras que moldam o bumbum com silicone’

** ‘Mãe de Lindsay Lohan diz que a filha não tem travesseiro na cadeia’

 

O grande título

Um bom titulo, que talvez queira significar exatamente o oposto:

** ‘Brasília será a capital das doenças do sangue em novembro’

Há um título excelente, que merece análise. Se uma parte é verdadeira, a outra com certeza não é:

** ‘`Homem mais velho de Tóquio´ pode ter morrido há 30 anos’

O melhor título, sem dúvida, vem da área esportiva. Tem aquele toque que um leitor com a cabeça cheia de malícia certamente irá considerar muito revelador. Envolve um dos clubes com maior torcida do Brasil. Um primor:

** ‘Troca-troca no Flamengo: agente acha interessante’

O agente promoverá o evento em público?

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados