Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Navalha na Operação Navalha

Qual a moral dos jornalistas para protestar contra vazamentos nos inquéritos da Polícia Federal se somos nós mesmos, os jornalistas, que os divulgam?

Toda: cabe aos jornalistas divulgar toda notícia de interesse, com raras exceções, cuja veracidade puderem confirmar. O controle dos vazamentos não cabe à imprensa, mas à Polícia Federal, ao Ministério Público e aos tribunais.

Nos últimos dias, especialmente após o que o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, qualificou de ‘canalhice’ – o vazamento de gravações telefônicas de outro Gilmar Mendes, como se fossem dele, ministro – se intensificou a discussão sobre a responsabilidade dos vazamentos.

Há quem diga que, se os jornalistas não publicassem esse tipo de notícia, o vazamento não ocorreria. É verdade; mas a obrigação dos jornalistas, exceto em raríssimas ocasiões, não é manter o sigilo, e sim quebrá-lo. Como, entretanto, vencer a contradição entre divulgar as notícias (sabendo que estamos sendo usados por autoridades para desmoralizar seus adversários) e manter em sigilo a informação vital – quem se aproveita do vazamento?

Este é um longo e difícil debate que temos de travar: se nossa obrigação é divulgar as informações, não podemos nos limitar apenas à parte que interessa aos vazadores. Mas, se não aceitamos a preservação do sigilo da fonte, perdemos o restante da informação – e perdemos, também, a feroz batalha da concorrência.

Talvez parte da resposta esteja na oferta de amplo espaço de defesa para os atingidos – não aquele ‘outro lado’ fake, fajuto, em que se publica uma página de acusações com duas linhas informando que ‘fulano de tal nega as denúncias’ – mas uma abertura total para a defesa. Isso inclui, claro, passar para o denunciado o total das denúncias, não apenas aquela parte que o repórter julgar relevante.

É difícil? É. Gasta espaço? Gasta. Pode atrasar a publicação da denúncia em um dia? Pode. Mas ou garantimos aos acusados o direito de defesa ou estaremos vulneráveis à acusação de cumplicidade nos vazamentos e no character assassination de pessoas cuja maior culpa é não estar nas boas graças das autoridades.

Atirando no inimigo

1. Há dias, foi vazada do inquérito sobre o empreiteiro Zuleido Veras a gravação de um telefonema seu ao colunista Cláudio Humberto. É uma conversa típica de jornalista com fonte, a respeito da repercussão de uma nota publicada na coluna. A notícia vazada foi publicada pela imprensa. Errado: se Cláudio Humberto não é acusado de nada, por que uma conversa telefônica sua foi divulgada? Se há acusações contra eles, quais? O fato é que se trata, na melhor das hipóteses, de invasão de privacidade.

A notícia seria importante se mostrasse cumplicidade entre Cláudio Humberto e Zuleido Veras. Não mostrava. Aliás, nada havia contra Zuleido na época do telefonema. E, se já houvesse, tudo bem: o jornalista, por força da profissão, tem de conversar com todo tipo de pessoa, inclusive as menos recomendáveis.

Como interpretar o vazamento e a publicação, senão como vontade de alguns de intimidar e de outros de atingir um desafeto? Se tudo o que o empreiteiro diz é suspeito, por que não divulgar, então, eventuais conversas entre ele e a cúpula da Polícia Federal, na época em que a empresa de Zuleido construiu a nova sede da PF?

2. Foi vazada uma conversa telefônica de um tal Gilmar Mendes, e divulgada sem esclarecer que não se tratava do ministro do Supremo, e sim de um homônimo. Obviamente, quem vazou a notícia sabia perfeitamente quem tinha sido monitorado. Se havia boa-fé, por que este fato não foi esclarecido pela fonte? Claro: o objetivo era levantar suspeitas sobre o ministro, cuja atuação deve estar desagradando a alguém com poder para vazar informações.

3. O ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, investigado, pediu demissão para não constranger o presidente da República. Que havia contra ele? O vídeo de uma importante assessora de Zuleido chegando ao ministério, no andar em que se encontra, entre outros, o gabinete do ministro, e entregando a um de seus auxiliares um envelope magrinho, no qual, segundo a denúncia, haveria 100 mil reais. Qual a prova de que havia dinheiro no envelope? Nenhuma. Mas, politicamente, não havia saída para o ministro: tinha de se afastar.

O duro foi a manchete do dia seguinte: ‘Ministro demitido por corrupção ajuda a escolher sucessor’. Não foi bem assim – mas como recolher de volta ao tubo a pasta de dentes que de lá foi tirada?

4. Um deputado sergipano ganhou amplo espaço nos jornais por ter admitido (sim, foi essa a palavra que a imprensa usou) que a Gautama, empresa de Zuleido, lhe mandou uma gravata no Natal.

Certa vez, o sábio Octavio Frias de Oliveira foi consultado por um grupo de editores: deveriam devolver as canetas (até que boazinhas, de preço médio) que uma empresa tinha enviado no Natal? Frias disse para esquecer o assunto. ‘Ninguém acha que vai subornar vocês com essas canetas’.

5. Antes de criar a Gautama, Zuleido Veras foi importante diretor da OAS, empresa controlada por um genro do senador Antonio Carlos Magalhães. Entre os telefonemas vazados, surgiu uma conversa entre Zuleido e o deputado Paulo Magalhães, sobrinho de ACM. Essa sumiu rapidinho do noticiário.

O preço e o produto

A Polícia Civil de Itupeva (SP) decidiu indiciar por estelionato o dono do semanário Expressão, Rogério Pansonato. Motivo: de acordo com as apurações, o jornal tirava dois mil exemplares mas informava que a tiragem era de cinco mil.

Sem analisar este caso, especificamente, vale lembrar que circulação inflada, para justificar o alto preço dos anúncios, não chega a ser crime incomum. Há jornais na praça que vendem anúncios, especialmente para órgãos públicos, ou para editais de empresas privadas, que não são encontrados em banca nenhuma. Têm tiragem de jornal de grêmio estudantil e cobram como jornal de verdade.

Como é mesmo?

Dois títulos do mesmo dia, em dois jornais, referentes ao mesmo assunto – a possível venda do gigante holandês ABN Amro Bank, dono no Brasil do Banco Real, ao Barclays inglês:

** ‘Barclays pode vender ativos do ABN no Brasil, diz jornal’

** ‘Barclays não planeja vender o Real’

E eu com isso?

Quando Serginho Groissman foi para a Globo, seu programa no SBT passou a ser apresentado por Babi, que fez um belo trabalho. Moça inteligente, informada, bem-humorada, e ainda por cima bonita, foi por bom tempo uma das estrelas da TV off-Globo. Andava meio sumida, ultimamente, fora das colunas. Gente como este colunista, que mais lê TV do que assiste aos programas, não tinha grandes informações sobre ela. Mas agora, sim: ei-la de volta!

** ‘Babi desfila com barriga de fora em evento’

A propósito, que evento?

Mas há outras notícias sem as quais, sem dúvida, não poderíamos viver:

** ‘Carol Castro está solteira’

** ‘Britney Spears ganha duas novas perucas’

** ‘Natalie Portman estaria namorando comediante americano’

** ‘Lindsay Lohan é presa por supostamente dirigir alcoolizada’

Os grandes títulos

Esta é uma semana rica.

Temos títulos ‘obra aberta’, em que o caro leitor escolhe o final:

**Ban Ki-moon expressa ‘preocupação’ por confrontos entre israelenses e

Temos títulos em língua de índio de filme americano:

** ‘Contemplação da lua pode ser feita Planetário do Ibirapuera’

Temos títulos para especialistas:

** ‘Aloísio, desfalque no banco, pede desculpas ao grupo’

Este, aliás, não é difícil de explicar. Aloísio, centroavante do São Paulo, perdeu a posição de titular e foi para o banco. Num jogo, entrou no segundo tempo e foi expulso – logo, não poderia ficar nem no banco de reservas na partida seguinte. E pede desculpas aos colegas por, tendo sido expulso, entregar aos outros dez toda a responsabilidade pela disputa. Simples, não?

Mas o grande título da semana se refere ao casamento de Wanessa Camargo, filha de Zezé di Camargo (puxa, quase saiu ‘de Zezé di Camargo e Luciano’);

** ‘Wanessa Camargo casa hoje com vestido da Calvin Klein NY’

Será que o vestido será um bom marido?

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados