Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Para que ser jornalista?

Quando uma pessoa sonha ser jornalista, pode ter várias aspirações pessoais e profissionais. Quem sabe, querer conhecer o mundo, se aventurar por realidades diferentes, freqüentar lugares aonde apenas poderosos (e jornalistas) vão, ou até ser um formador de opinião.

Bem, conhecer o mundo é para quem pode, não para quem quer. Pode ser que alguma empresa jornalística fique encantada com sua performance profissional e contrate você para dar uma de Zeca Camargo. Mas as grandes empresas jornalísticas são as primeiras a corroer seus sonhos e fazer você acreditar que a opinião expressada é sua, e não da empresa. Opinião? Pra quê?

Aventurar-se por aí pode até ser mais fácil. O próprio jornalista pode pegar um carro, uma câmera e fazer um documentário. Porém, para isso é preciso patrocínio, em bom português: a venda do seu pensamento e do sonho de mostrar para o mundo aquilo que você vê e demonstrar aquilo que sente. Mas existem aquelas pessoas que nasceram em berço de ouro e em vez de patrocínio tem um paitrocínio. Esses casos são raros. E outra coisa: quem vai veicular o documentário? Pode passar no YouTube. Bem, seus amigos e familiares ficarão encantados!

Confronto com’realidades patrocinadoras’

Já as outras realidades podem estar mais próximas do que imaginamos. Pode-se trabalhar num jornal de taxistas e conhecer o modo de vida desses motoristas. Ou ser assessor de imprensa de algum modelo, político, artista, jogador de futebol… e com isso entender as entrelinhas desses mundos tão distantes dos reles mortais. Contudo, após a descoberta dessas’subculturas’, a novidade passa e a mesmice entra em cena.

O acesso. Ah, o acesso! Isso vai depender do lugar em que você trabalha. Por que vão liberar um assessor de imprensa de uma empresa no camarote da Brahma? Bem, o jornalista poderá ter acesso às reuniões dos poderosos da empresa. Mas e daí, se você não é um dos poderosos, mas um reles jornalista? E com esse rótulo, o máximo que poderá fazer é alguma pergunta, mas jamais emitir uma opinião.

Quanto a ser’formador de opinião’, essa é a maior história da carochinha que já contaram. O jornalista precisa trabalhar, mas para isso não basta escrever bem. Ele precisa acreditar que o jornal, ou a empresa, ou o político, ou o time de futebol em que ele trabalha é o melhor. O que eles dizem é a verdade e não há questionamentos. Onde fica a opinião do jornalista? Quem decide isso é o chefe. E não é o editor-chefe, pois esse também é monitorado. Mas o chefe. Caso ele ache que seu texto transmite alguma idéia que entra em confronto com as’realidades patrocinadoras’ do jornal, ou você muda o texto, ou de emprego. E não adianta muito tentar expressar opiniões nas entrelinhas. Poucas pessoas as lêem.

De tão bons, são pensadores

A questão é que o outro emprego não será muito diferente. Pode até parecer no primeiro momento. Mas a regra é a regra, neste caso. E as exceções são pouquíssimas – caso exista alguma, me apresentem. Mandarei meu currículo para lá.

O grande fato é que ser jornalista parece pior do que ser prostituta. Esta vende o corpo, algo que até as minhocas comem. Mas o jornalista vende idéias, alguns até sonhos. Ótimo, não? Só que nem as idéias nem os sonhos são do jornalista.

Claro que alguns jornalistas são os jornalistas, mas esses são poucos. E não estou mencionando aqueles que acham que são os bons, mas aqueles que o são de verdade e formam opiniões, são críticos e assumem isso. E são tão bons que já não são jornalistas, mas pensadores.

******

Jornalista