Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Repórter sim, polícia não

Já lá se vão mais de 30 anos. Naquela época, como agora, os ferozes patrulheiros favoráveis ao governo diziam que jornalista não está acima da lei e, quando comete um crime, ainda mais de subversão, deve ser preso e punido. Façam as contas, caros colegas: vejam qual foi o final da patrulha daquela época.

Jornalista não está acima da lei. Mas ser chamado para depor antes que haja qualquer investigação, de tal maneira que a própria Federação Nacional dos Policiais Federais diz que o caso está sendo conduzido de maneira equivocada; depor ante um delegado tão hostil que a procuradora Elizabeth Mitiko Kobayashi teve de corrigir irregularidades (uma delas, segundo a nota de Veja, que a procuradora disse estar correta, era atribuir ao interrogado uma opinião do interrogador, de que a matéria era uma falácia); ver a advogada silenciada e ameaçada, isso não é normal. Não é investigação, é patrulha.

A revista Veja está em franca oposição ao governo federal, o que é claro. Algumas reportagens que publicou pareceram a este colunista pouco embasadas (e abandonar o caso, sem entretanto retratar-se, é também discutível). Mas esta reportagem, especialmente, oferece a quem quiser investigar o caso uma série de elementos – a começar do local em que, segundo a revista, ocorreram encontros clandestinos: a própria sede da Polícia Federal. O prédio é inteiro monitorado por câmeras. Por que não verificar os vídeos antes de iniciar os interrogatórios?

Em outras épocas, interrogaram Oscar Niemeyer para saber como é que ganhava dinheiro. Hoje, pergunta-se ao repórter quanto a empresa na qual ele trabalha pagou a pessoas ouvidas na matéria. Em outras épocas, jornalistas amestrados denunciavam colegas que se opunham ao governo e faziam piada com as prisões da ditadura. Hoje, jornalistas amestrados inventam que os repórteres foram ao interrogatório acompanhados pela OAB e dão razão à polícia.

Quando se chega à idade deste colunista, já se viu muita coisa acontecer. O duro é vê-la acontecer de novo, agora praticada por gente que dizia ser contra a repressão.



Os exageros

Em campanha, sempre há exageros. Houve exageros contra Lula, como chamá-lo de apedeuta (ignorante, analfabeto). Lula pode não ter educação formal completa, mas não é analfabeto – embora combata os plurais com todas as suas forças – e, definitivamente, não é ignorante. Mas imaginar que a população em geral, por mais militante, seja capaz de saber de quem se trata e fazer cartazes contra o jornalista Ali Kamel é um pouco meio muito.

Ali Kamel é um grande jornalista, respeitado, estudioso. Mostrou competência na imprensa escrita e no jornalismo de TV. É conhecidíssimo no setor de comunicação. Mas alguém acredita que, como andou sendo publicado, ‘eleitores de Lula’, gente comum, de fora do meio, carregassem um cartaz com os dizeres: ‘FHC, Veja. Kamel, Globo: terroristas da democracia. Parem com o golpismo. Quem manda no meu voto sou eu’? E já imaginaram o tamanho do cartaz?



Mais patrulha

Os patrulheiros chegaram ao ponto, agora, de patrulhar os próprios companheiros de partido, que dirigem o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo e são mais equilibrados: protestaram contra a presença do governador Cláudio Lembo, do PFL paulista, na entrega do Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos. Motivo: Lembo pertenceu à Arena, partido de sustentação do regime militar – regime este que, em 1975, assassinou por tortura o jornalista Vladimir Herzog.

Lembo fez parte da Arena; é também um legalista. Jamais apoiou atos fora da lei, quanto mais barbaridades como a tortura. Segundo, jamais foi acusado de qualquer envolvimento em improbidade ou violência. Terceiro, se é para patrulhar, Teotônio Vilella, símbolo da campanha das Diretas-Já, foi da Arena; Severo Gomes, que tanto trabalhou com Ulysses Guimarães pela redemocratização do país, não apenas foi da Arena como ocupou um ministério no regime militar; José Sarney, Paulo Maluf e Delfim Netto são hoje aliados do presidente Lula.



As algemas e a lei

Noticiando a prisão de um delegado, a imprensa assinalou, como se fosse irregularidade, que ele não havia sido algemado. Um empresário, preso fora de São Paulo, transportou em seu helicóptero os policiais que o prenderam. Mas, tão logo chegou a São Paulo, onde o aguardavam as câmeras de TV, foi algemado.

Por que algemar quem não reage, não oferece risco, aceita pacificamente a ordem de prisão?

Não, esta pergunta não é do colunista: é da OAB, que acaba de aprovar voto de repúdio ao uso indiscriminado de algemas pela Polícia Federal. De acordo com a OAB, o uso desnecessário de algemas atenta contra o Estado de Direito. E aí vem a parte que nos interessa mais de perto: muitas vezes, segundo a OAB, o preso é algemado para atender à mídia.

Teremos nós, jornalistas, chegado tão baixo? Serão os jornalistas de hoje a versão mais moderna de Kirk Douglas, em A Montanha dos Sete Abutres?

Se o caro colega não viu o filme, vá às locadoras. Fala de nós, em nossos piores momentos.



O caos aéreo

Pelo jeito, há três graves problemas no controle de tráfego aéreo nacional (o que significa, em última análise, três graves problemas na segurança dos vôos):

1. o controle militar, embora os aviões sejam civis, embora exista um Ministério dos Transportes, embora esteja em funcionamento a Agência Nacional de Aviação Civil;

2. o número insuficiente de controladores de vôo;

3. áreas de sombra no monitoramento dos aviões em território nacional.

Não é questão de discutir de qual governo é a culpa: a coisa vem de longe. Para que se tenha uma idéia, no primeiro governo militar, do marechal Castello Branco, há 40 anos, o ministro dos Transportes (ou da Viação, ou fosse lá o nome que tivesse), marechal Juarez Távora, quis transferir para sua pasta o controle da aviação civil. O ministro da Aeronáutica, brigadeiro Eduardo Gomes, colocou seu cargo em jogo e manteve a aviação civil sob controle militar.

Mas é uma belíssima pauta: como se espera que militares, treinados para obedecer a planejamentos estratégicos, se adaptem ao mercado livre e a suas variações diárias? Como funciona a aviação civil em outros países do mundo?

Outra belíssima pauta é a das áreas de sombra – regiões em que, por vários motivos, a comunicação entre aviões e controle aéreo é deficiente. Por que não ouvir o pessoal que criou o Cindacta, o sistema de controle aéreo integrado do país? O que é que deveria ter sido feito e não foi? O chefe da equipe de engenheiros, Henry Maksoud, está ativo, tem memória excepcional, gosta de dar entrevistas e sua inteligência é absolutamente fora do comum. Ele certamente tem algo a dizer sobre o caos nos aeroportos e os problemas de tráfego aéreo.

E, finalmente, o caso dos controladores. Pelo que disseram Suas Excelências, as autoridades, é um caso dificílimo, porque é preciso fazer um curso de dois anos para se tornar um controlador e não há tempo disponível. É verdade; mas há controladores em outras partes do mundo que poderiam ser contratados. E, como todos falam inglês, a língua franca da aviação, qual seria o problema?



O nosso caos

As três pautas acima são tranqüilas. A de agora é mais complicada. Segundo queixas de gente dos aeroportos, um dos problemas do caos na aviação é a imprensa. Dizem que, diante do noticiário, muita gente chega atrasada ao aeroporto, na certeza de que os vôos não vão sair no horário; e, quando saem, o que às vezes até ocorre, o passageiro é prejudicado e as empresas aéreas levam a culpa.

Outro problema é a própria presença das equipes de reportagem no aeroporto. Se até autoridade gosta de aparecer na TV, imagine a emoção que uma câmera ligada traz àquela multidão! Mas isto não tem solução. Vamos deixar de cobrir o caos só porque o pessoal gosta de virar papagaio de pirata do repórter?

Mas não é preciso exagerar. Outro dia, os carrinhos de bagagem de duas senhoras se enrolaram. E umas três equipes de TV acorreram ao local.



E eu com isso?

Este colunista ainda se lembra do grande acontecimento: a União Soviética lançou um satélite espacial! O Sputnik capturou a imaginação do mundo (e jogou os Estados Unidos numa crise de que levaram anos para sair: como é que alguém tinha sido capaz de superar sua liderança no espaço?).

Os satélites tornaram possível toda a moderna comunicação. E é graças ao satélite que sabemos, quase instantaneamente, à velocidade da luz, que:

1. Elefantes se reconhecem no espelho, diz estudo

2. Caco Ciocler e Amandha Lee são flagrados aos beijos por revista

3. Nicole Richie nega anorexia e planeja engordar

4. Preta Gil confere sua foto nua em exposição

Confesse: como você conseguiu viver até hoje sem essas informações?



Como é mesmo – 1

Conhece Cindy Margolis? Isso: aquela atriz e modelo que resolveu, finalmente, posar nua para Playboy. Na legenda da foto, a informação: ‘Aos 45 anos, Cindy Margolis ainda não havia posado nua’. No texto, outra informação: ‘Puxa, estou com 40 e eles ainda me querem!’

Afinal, quantos anos tem esta mulher: 40 ou 45?

Nenhum dos dois: são 41, completados em 1º de outubro.



Como é mesmo? – 2

Há quanto tempo a Sabrina Parlatore está na TV Cultura? Uns bons anos, com certeza. Antes disso passou pela Bandeirantes. Mas veja o título:

** Programa exibe entrevista de Gianecchini com ex-VJ da MTV

Faz uns seis anos que ela saiu de lá.



Os grandes títulos

Esta semana teve coisa boa. Há até dúvidas sobre algo que poucas vezes deixou de ser certeza:

** Polícia investiga suposta morte de rapaz por PMs em SP

** Compay Segundo ainda vive em sua casa de Havana, mesmo depois de morto

E uma previsão das mais ousadas:

** Brasil vai crescer de forma mais acelerada em 2006, diz BNDES

A propósito, em que ano estamos? E o ano já não estará terminando?

Mas o melhor título da semana não é nenhum destes. É o que vem agora:

** Loja da Konami anuncia pacote com PSP camuflado

PSP – será o velho Partido Social Progressista do Adhemar de Barros, hoje naturalmente fazendo parte da base de apoio ao presidente Lula?

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados