Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A curiosa trajetória de Anthony e Rosa

Este tópico só indiretamente trata de avaliação da mídia. É uma nota de rodapé à crônica política nacional. Não é infreqüente que se cometam no Observatório da Imprensa desvios assim. São todos julgados, cedo ou tarde, no Primeiro Tribunal do Leitorado.


A notícia às vezes clama em vão por um comentário. Está na Folha de hoje (13/6). Numa livre associação de idéias, evoca um conto de Scott Fitzgerald chamado “O Curioso Caso de Benjamin Button”. O protagonista, para vexame de seus pais, nasce com corpo e mente de 70 anos de idade e rejuvenesce progressivamente. Com 50 anos de idade cronológica, em pleno vigor físico dos 20 de idade biológica, entra na universidade, mas poucos anos depois não tem mais altura nem força para jogar no time da faculdade. Adiante aparece brincando com cubos, entregue aos cuidados de uma babá. E termina: “Então tudo escureceu, e a grade branca da caminha, e as faces desfocadas que se moviam acima dele, e o tépido aroma do leite, desvaneceram-se todos de sua mente”.


A notícia da Folha, assinada por Raphael Gomide, intitula-se “Garotinho deixa partido e deve se filiar ao PSC”. Convida a um desdobramento: sobrevoar a trajetória partidária de Anthony Garotinho, o que pode evocar semelhanças com Benjamin Button.


Anthony começou simpatizante de um vetusto e moribundo PCB. Depois foi um dos fundadores, em Campos (na época o topônimo era simples assim, sem especificação de origem indígena), do então novíssimo e hoje velhíssimo PT. Garotinho agora está muito longe do PT, enquanto este chegou ao poder, ou ao “pudêr”, respeitada a prosódia de um dos aliados máximos do presidente Lula, José Sarney.


Garotinho ficou adulto na política sob a batuta de Leonel Brizola, no PDT, que hoje encara o drama da perda de regalias partidárias por falta de número mínimo de votos. O PDT foi importante no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul. Chegou a ter alguma projeção nacional enquanto Brizola permaneceu ativo na política – foi candidato a vice na chapa de Luiz Inácio Lula da Silva ainda em 1998.


Em seguida, Garotinho passou para o PSB, partido de outro veterano político, Miguel Arraes. Trocou uma reeleição certa ao governo do Rio de Janeiro em 2002 e concorreu à presidência da República. Obteve boa votação, mais de 15 milhões de votos.


Desconfortável no PSB, migrou para a federação de micro, mini e meso-interesses chamada PMDB. Foi o maior partido, em tamanho, a que pertenceu. Tentou ser novamente candidato a presidente da República, fez uma midiática greve de fome que deixou uma dívida por estragos com o condomínio do prédio onde fica a sede do PMDB-RJ, no Centro do Rio, denunciou as rasteiras recebidas de seus correligionários e agora, segundo a Folha, dirige-se ao PSC, que tem seis deputados federais.


A trajetória política de Garotinho, atualizada até o dia 13 de maio, está em sua página oficial na internet.


A reportagem da Folha diz que o ex-governador deve voltar em julho ao secretariado de sua mulher, a governadora do Rio de Janeiro, Rosinha Matheus. Seus planos incluem se candidatar a prefeito do Rio de Janeiro em 2008, quando Rosinha pretende concorrer à Prefeitura de Campos dos Goytacazes, de onde o casal alçou vôo.


Os prognósticos não vão adiante. Quem sabe ao sair da prefeitura, em 2012, Rosinha viesse a ser substituída por Garotinho, que teria deixado a prefeitura do Rio, e se tornasse, ela, secretária municipal em Campos? Pode-se contar com a reeleição de ambos e mudar a data para 2016.


Se chegarem sãos e salvos aos últimos anos da década de 2020, poderão ser beneficiados pela previsão do inventor Ray Kurzweil segundo a qual a nanotecnologia e outras conquistas científicas permitirão nessa altura alcançar a imortalidade.


Se isso ocorrer, Garotinho, aos 190 anos, em 2150, digamos, poderá, revigorado, trocar ambições modestas – como chefiar uma caravana de aposentados numa serenata em Conservatória – por sonhos com vôos mais altos. Sempre em companhia de Rosinha. Encontrariam, impávidos, o PMDB e o PFL. Talvez com outros nomes, mas com o mesmo espírito. Ou o Brasil não se chamará mais Brasil.