Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

A notícia como salvação do jornalismo na era digital

A constatação parece óbvia, porque o discurso dos executivos da imprensa convencional sempre colocou a notícia como o centro da atividade jornalística. Mas o avanço da tecnologia e do conhecimento humano acabaram mostrando que a notícia é muito mais do que um produto capaz de ser trocado por publicidade.

Não há mais novidade alguma no fato de que a notícia perdeu valor de troca porque se tornou de tal forma abundante que o seu preço caiu a quase a zero. Os dogmas do capitalismo garantem que quando um produto perde valor ele deixa de ser atrativo como motor de uma atividade econômica. Se isso fosse totalmente verdade, as empresas jornalísticas já teriam desaparecido e o jornalismo seria uma atividade desprovida de sentido.

A revolução tecnológica materializada na digitalização e na telemática, se por um lado acabou com o conceito de notícia como produto comercial atrativo, por outro deu a ela um novo significado capaz de justificar não apenas a sobrevivência do jornalismo como também servir de base para um novo conceito de organização midiática.

O novo contexto da notícia a situa como fator deflagrador de processos de geração de conhecimento e consequentemente também de inovações, fatores vitais para o desenvolvimento da produção de bens e serviços na economia de base digital. A notícia é um dado (número, fato ou evento) cuja principal característica é o seu ineditismo. 

O fato de ser desconhecida pelo indivíduo receptor de uma notícia mexe com as certezas existentes, gerando dúvidas que levam à identificação de sua relevância, pertinência e confiabilidade, por exemplo. Esses fatores já existiam antes da internet, mas eram associados sempre à preocupação com a valorização da notícia na troca por publicidade, fonte de recursos que viabilizava o modelo industrial de negócios da imprensa.

A extinção da preocupação com o dinheiro criou as condições necessárias para que a produção de conhecimento passasse a ser a principal característica da notícia na era digital. Mudança é significativa porque altera a forma como consumimos o conteúdo de jornais, revistas, rádio, televisão e páginas informativas na internet. 

Até agora a notícia servia para conferir status social (pessoas bem informadas como referência), poder político e militar (pela capacidade de saber o que os outros não sabem e poder manipulá-los), voyeurismo social (curiosidade popular por escândalos e crimes) e secundariamente produção de conhecimento socialmente relevante.

No sistema comercial, a notícia era consumida e apenas marginalmente reutilizada na produção de novas notícias, porque a cultura vigente era a de que um produto valorizado deveria ser guardado como investimento visando troca futura. Na era digital o fluxo da notícia confere igual importância tanto à transmissão do emissor para o receptor como o caminho inverso. O importante não é mais guardar a informação, mas compartilhá-la – porque isso lhe agrega valor.

O raciocínio é simples. Se tenho uma maçã, eu só posso guardá-la com o risco dela apodrecer, saboreá-la , vendê-la ou trocá-la por outra fruta ou produto. Em qualquer hipótese eu deixo de possui-la. Agora, se eu tenho uma notícia eu posso guardá-la ou compartilhá-la. Na primeira hipótese ela se torna inútil quando perder a novidade, mas se eu a trocar com outras pessoas eu a conservo e, além disso, incorporo novas notícias ao meu acervo informativo. Quanto mais eu compartilhar uma notícia, mais informado vou ficar.

Isso significa que o fluxo de notícias passa a ser o elemento preponderante num projeto jornalístico ambientado na internet. É aí que surge o tal de jornalismo viral, cuja intenção é fazer com que a notícia circule em vez de ficar preocupado com os resultados que ela vai gerar. O fluxo de uma notícia depende da forma como um profissional ou praticante do jornalismo organiza os seus elementos de forma que ela seja entendida rápida e facilmente pelo público.

A rapidez na disseminação ou viralização de uma notícia é o grande diferencial no jornalismo em ambiente internet, porque está diretamente associado à produção de conhecimento. Este diferencial passa a ser a justificativa do jornalismo.

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Aos leitores: Esta postagem faz parte de um conjunto de textos por meio dos quais procuro ofereceraos estudantes de comunicação, praticantes do jornalismo e profissionais nas redações elementos para reflexões sobre o futuro da profissão. Periodicamente, trocarei o dia a dia da observação crítica da mídia para explorar o papel futuro do jornalismo no novo ambiente informativo que já está sendo criado. São sugestões para discutir porque, como ninguém tem o dom da verdade, a troca de ideias é a única forma de construir algo.