Monday, 18 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

A síndrome da notícia ruim

Quando a avalancha de informações econômicas pessimistas se soma à rotina de notícias sobre assassinatos, balas perdidas, chacinas, tragédias familiares, assaltos e atentados contra a economia popular, a agenda diária da imprensa leva o leitor a um dilema atroz: ter ataques de fúria ou simplesmente ignorar a realidade – o que, no caso da imprensa, significa desinteressar-se pelas notícias para preservar a sanidade mental.

Está é a escolha que um número crescente de leitores, ouvintes, telespectadores e internautas brasileiros está sendo obrigado a fazer diariamente na hora de ler um jornal, revista ou assistir a um telejornal. Está cada dia mais difícil suportar a carga de pessimismo transmitida pelas manchetes e por âncoras de telejornais, alguns dos quais parecem ter prazer em anunciar novas tragédias e novos sacrifícios para um cidadão que passou da euforia e otimismo até o inicio do ano passado para um estado de choque agora em 2015.

A associação do noticiário pessimista com a estratégia oposicionista de desconstrução do governo Dilma Rousseff pode até ser casual, mas o fato concreto é que o crescente déficit de esperança do público consumidor de notícias tem consequências de médio prazo e que não são nada animadoras para o futuro da imprensa.

O que se nota atualmente é que uma parcela considerável do público começa a descrer do que a imprensa publica por associar as notícias ruins a uma estratégia política e ideológica. A outra parte da clientela de jornais, revistas, telejornais e redes sociais vincula-se a esses veículos não por sua missão informativa, mas porque oferecem abrigo e conforto para posicionamentos ideológicos. Ambos os casos deveriam preocupar os executivos da indústria jornalística porque eles não garantem a sustentabilidade futura das empresas que dirigem.

A descrença tem efeitos prolongados porque afeta a credibilidade de leitores, ouvintes, telespectadores e internautas. Já a identificação ideológica pode ser transitória porque as conjunturas mudam e, com elas, a fidelização do público simpático às opções do veículo jornalístico. No caso atual, na hipótese de a presidente Dilma ser afastada, como deseja a extrema direita, o fator ideológico perderá relevância logo após as eventuais mudanças no governo, repetindo o que ocorreu antes e depois do golpe militar de 1964.

Saturadas por tantas notícias pessimistas ou irritadas com o impasse político-ideológico, as pessoas promovem nas redes sociais da internet uma catarse coletiva online, que por um lado pode aliviar temporariamente as tensões pessoais mas, por outro, carrega ainda mais o já pesado ambiente informativo .

Há dias li no Facebook o comentário de um internauta que dizia: “Eu já sei que está ruim e vai ficar pior. Por que a imprensa não nos acompanha na busca de soluções?” O angustiado consumidor de notícias deu vazão ao que muita gente pensa e tem muita dificuldade para transformar em prática.

A dificuldade é que fomos educados a cobrar e esperar que os governos e as empresas resolvam todos os nossos problemas. Hoje verificamos que nem um nem outro têm condições e vontade de atender às nossas expectativas. Os governos, de todas as tendências, se transformaram em entidades corporativistas preocupadas com seus próprios interesses. As empresas perderam a perspectiva de sua missão social e só pensam no próprio lucro num momento de crise.

O leitor pode cobrar da imprensa a aplicação do chamado jornalismo de soluções, uma opção que já é praticada em vários países, principalmente nos Estados Unidos, e que tem como condição prévia o desapego ideológico e partidário. O engajamento com o leitor é prioritário em relação às alianças politicas. O fundamental passa a ser ouvir o que as pessoas têm a dizer, identificar problemas a partir da base e não dos desejos e preferências dos editores. O principal objetivo é criar um ambiente de diálogo permanente entre o veículo jornalístico e as comunidades que ele elegeu como público alvo.

O bombardeio negativista nas manchetes e comentários pode agradar ao fígado e projetos de alguns jornalistas, políticos e empresários envolvidos na batalha entre petistas e antipetistas, mas já está saturando o público, que num impulso de sobrevivência social passa a olhar para o outro lado. Para muitos, este outro lado é simplesmente ignorar a imprensa, algo que deveria tirar o sono de executivos, diretores de redação e editores.