Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Acredite quem quiser, repórteres indianos cobrem economia americana, sem sair de casa


A globalização da atividade jornalística entrou para valer na reportagem como prova a decisão da agência de notícias Reuters de aumentar para 300 o número de repórteres de sua sucursal na cidade indiana de Bangalore, onde são redigidas notícias econômicas de todo mundo, consideradas menos importantes pela redação central em Londres.


A Reuters começou a descentralizar sua redação econômica em 2004 quando criou em Bangalore uma seção especial formada por seis editores indianos encarregados de reescrever press releases sobre empresas norte-americanas e européias. Hoje, o grupo inchou para 100 profissionais e não pára de crescer.


Com isto a agência britânica pode substituir jornalistas em início de carreira ou às vésperas da aposentadoria por profissionais indianos ganhando até um terço do salário de um europeu ou americano.


Os sindicatos obviamente não gostaram da idéia e vários jornais passaram a ironizar a decisão da agência britânica, mas com o passar dos anos houve uma mudança de atitudes. A Dow Jones, a grande concorrente da Reuters, depois de criticar duramente o que chamou de ‘terceirização da reportagem‘, já admite seguir os mesmos passos.


As empresas alegam que o uso de jornalistas indianos permite que os profissionais mais especializados e mais bem pagos na Europa e Estados Unidos tenham mais tempo para investigar e contextualizar os temas considerados mais importantes.


A Reuters garante que nenhum dos seus 350 jornalistas nos Estados Unidos perdeu o emprego por causa do escritório em Bangalore e já admitiu aumentar para 1.500 jornalistas o seu staff na Índia, segundo o site Follow The Media, especializado em notícias sobre tendências na imprensa mundial.


Do ponto de vista contábil, pode ser até um bom negócio deslocar parte da cobertura econômica européia e norte-americana para a Índia. Afinal as comunicações e a internet transformaram as distâncias numa abstração, como mostra a maciça transferência do telemarketing norte-americano para centrais instaladas, também na Índia, hoje cada vez mais um quintal tecnológico do Primeiro Mundo.


A indústria mundial já está terceirizada há muito tempo. Basta abrir um computador para descobrir um verdadeiro atlas geográfico em matéria de países de origem dos vários componentes. Na imprensa, a terceirização expandiu-se no setor de serviços como impressão, limpeza, distribuição, atenção ao leitor, mas o trabalho jornalístico havia sido minimamente preservado, até agora.


Passar para 300 e depois para 1.500 profissionais significa mais do que criar uma mega redação na cidade que muitos já chamam de Vale do Silício da Índia. A decisão da Reuters segue a mesma lógica das montadoras de automóveis, o que nos deixa com sérias dúvidas sobre quais os valores jornalisticos que a agência pretende seguir daqui por diante. Nunca antes um órgão da imprensa mundial havia escancarado de forma tão brutal a idéia de que as redações estão se transformando em linhas de montagem da notícia.


Tudo indica que está em gestação um novo modelo corporativo para empresas jornalísticas, o que inevitavelmente provoca uma nova discussão sobre valores profissionais nesta era de transição para a informação digital.


Conversa com o leitor
Pessoal, desculpem mas fiquei uma semana sem postar porque acabei atropelado pelo acúmulo de trabalho provocado pelo Colóquio sobre Observação da Mídia. Além disso tive que preparar duas aulas e finalmente começar a escrever o meu Trabalho de Conclusão de Curso. Agora volto ao normal. Até mais.