Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Boataria eleitoral põe em evidência necessidade da contextualização e leitura crítica de notícias


Boatos e contra-informação sempre foram itens quase obrigatórios em campanhas eleitorais, aqui e no exterior, mas este ano estamos experimentando pela primeira vez os efeitos do uso da internet na disseminação de informações falsas ou distorcidas.


É facil demonizar a internet pela boataria. Faz parte da cultura política culpar a tecnologia como se ela fosse a grande vilã da insegurança informativa, às vésperas de um pleito com cara de plebiscito. É o recurso adotado, velada ou abertamente, por quem não conhece e não procura conhecer as novas tecnologias, preferindo agarrar-se ao que sabe controlar.


A onda de boatos que tomou conta da internet brasileira nesta campanha para o segundo turno é a consequência inevitável de abusos cometidos num meio novo, onde os usuários ainda não tiveram condições para decidir quais são as regras socialmente válidas e aceitáveis.


Estamos testemunhando os efeitos práticos da complexidade informativa, na qual os dados, fatos e processos já não são mais dicotômicos, ou seja, não há mais certo ou errado, branco ou preto, alto ou baixo, mas sim uma série enorme de variações entre um extremo e outro. Com isso não existe apenas uma verdade, mas várias, e aí fica fácil entender por que tanta confusão na mídia e na cabeça dos eleitores.


A diversidade de percepções não é um fato novo ou descoberto agora. A novidade é que ela se tornou muito mais visível agora com a disseminação do uso da internet como veiculo de comunicação.


A avalancha de boatos eleitorais tende a confundir os eleitores por conta de versões contraditórias, dados incompletos, meias verdades, omissões e até mentiras dissimuladas. Não adianta proibir, porque, salvo em situações muito raras, é quase impossível identificar o que é 100% falso num ambiente informativamente conturbado, como é a véspera de uma votação que deve ser definida por um resultado apertado.


Daí a importância da leitura crítica das notícias relacionadas à campanha eleitoral. O cidadão não tem outro recurso, porque a outra alternativa seria desacreditar em tudo, o que seria uma atitude niilista, que não resolve o problema.


A leitura crítica tende a se transformar num item obrigatório na nossa cultura informativa nos próximos anos porque, sem ela, acabamos mergulhados na incerteza e na insegurança, como acontece hoje com muitos eleitores desorientados diante da boataria propagada pela internet e fora dela.


A leitura crítica está deixando de ser um penduricalho de luxo ou um tema acadêmico para se tornar uma ferramenta sem a qual o exercício da cidadania fica capenga. Agora, por exemplo, separar o joio do trigo em matéria de informação tornou-se a condição indispensável para corrigir percepções distorcidas e dar ao eleitor a tranquilidade de escolha.


Sem insistir na necessidade de contextualização das informações e da leitura critica, a propaganda da Justiça Eleitoral sobre voto consciente perde todo o sentido e vira apenas uma frase de efeito, sem qualquer consequência prática.


Para que os jornalistas passem a colocar a contextualização das notícias como uma meta prioritária é necessário que eles procurem conhecer mais o público, para evitar a tentação de entregar um produto pronto, baseado no duvidoso princípio de que os profissionais sabem o que o leitor ou telespectador quer e precisa. É mais ou menos isto que temos hoje e que, em vez de ajudar a reduzir a boataria, contribui para aumentá-la.