Wednesday, 08 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

Colunista critica agressividade, mas louva liberdade na internet

Ancelmo Gois conta na entrevista abaixo como surgiu sua nova coluna na internet. Ele diz que blogues de políticos são bons para a democracia, mas não podem ser confundidos com trabalho jornalístico, que pressupõe busca de equilíbrio. E se mostra magoado com as baixarias feitas na rede durante a campanha do referendo sobre as armas, em 2005: “Nem havia blogue ainda, mas o que eu recebia de e-mails xingando a minha mãe porque eu era contra o comércio de armas era algo horripilante. Mas, enfim, melhor isso do que o silêncio dos regimes de força”.


A entrevista foi feita no dia 23 de março.


Como foi sua volta à internet?


Ancelmo Gois – O meu reino não é desse mundo da internet. É do papel. Ao mesmo tempo, a internet cresce numa explosão muito grande, e ao mesmo tempo crescem as dúvidas sobre ela. Ninguém sabe onde esse negócio vai parar, qual é a lógica financeira e a credibilidade desse negócio. Até porque o que faz mais sucesso são sites que têm a marca de alguma grande empresa do papel: é o site do Wall Street Journal, é o UOL, que tem uma costela da Folha… É um pouco a internet beliscando a credibilidade do papel, como a televisão já fez no passado. A televisão suou muito a camisa para ter credibilidade própria, chupava a credibilidade do pape. Mas esse é um mundo novo, aparentemente irreversível, e não dá para ficar fora.


Eu, de alguma maneira, pelo menos do ponto de vista do jornalismo, no Brasil, sou um dinossauro, porque eu deixei a Veja num projeto com um grupo de colegas jornalistas, entre eles Marcos Sá Corrêa, Flávio Pinheiro, Kiko Brito, e criamos o No [que sobreviveu como No mínimo], tentativa de fazer no Brasil uma versão de uma revista que faz grande sucesso no mundo virtual americano, a Slate. Ficamos lá uns 500 dias, depois houve o estouro da bolha da internet, todo mundo quebrou, todo mundo saltou fora, e eu tive que saltar fora e voltar para o papel.


Agora estou voltando para a internet meio obrigado. Não que não seja prazeroso, mas é obrigado. Porque o Globo tem investido no jornalismo online de maneira muito expressiva, a ponto de ter inclusive contratado o jornalista Ricardo Noblat, que é de longe um dos cases de maior sucesso na internet no segmento do jornalismo político. Procurou trazer também a pobre da Míriam [Leitão] para a internet. A Míriam já é uma grande jornalista multimídia do Brasil, porque a Míriam está no rádio, está na televisão a cabo, está na TV aberta, está no papel – ela também tem hoje um blogue, embora não seja blogue, eu acho que é mais site. Eles também me impuseram essa coisa. A gente resolveu partir para um projeto voltado para a notícia, mas voltado para o Rio. O Globo Online tem algumas algumas âncoras na linha da política, como é o caso do próprio Noblat, como vai ser o caso do [Jorge Bastos] Moreno – Moreno vai voltar fazendo uma espécie de TV Moreno, um projetinho das Organizações Globo de botar o Moreno entrevistando um político por dia em Brasília, projeto tecnologicamente avançado. Tem a Míriam, que faz economia, e a parte que meu coube nesse latifúndio, de maneira muito prazerosa, foi fazer uma coluna de notícia, mas uma coluna ao jeito carioca, e celebrando muito o Rio tanto na sua parte de beleza como de caos, para usar a letra da música da Fernandinha Abreu.


Estamos fazendo um site da Turma da Coluna, tem uma equipe própria, tem um jornalista experiente, que é o Aydano Motta, editor full-time desse site, mas participa também a chamada Turma da Coluna, que é todo mundo aqui, Marceu Vieira, Márcia Vieira, Ana Cláudia [Guimarães]. Além disso, agregamos todo mundo que você puder imaginar. O Aloizio Maranhão, editor de Opinião do Globo, escreve nesse site sobre música, que é um dos xodós dele. O editor de Esporte, Toninho [Antonio Nascimento], escreve sobre o Grajaú, é o Toninho do Grajaú. O [Orivaldo] Perin, jornalista veterano, muito bom, escreve uma coluna chamada Perin de Niterói. É um site, eu diria, bairrista, mas com muito orgulho.


Quando entrou na rede?


A.G. – Nós começamos no Carnaval, com uma superprodução para escolher a Mulata do Gois, fizemos uma votação, achamos que o Carnaval era um bom momento para começar porque tinha muito a ver com o Rio. Está indo muito bem, estou animado.


Qual é sua opinião sobre os blogues de políticos?


A.G. – Tem duas sensações. Uma boa e outra ruim. A boa é que é bom, é muito bom para o país, para a democracia, que todo mundo tenha um microfone. No dia em que todo mundo tiver um microfone, eu acho que o Brasil será mais democrático. Nesse sentido, eu acho legal que todo político faça seu blogue. Agora, esses blogues – e aí é o perigo –, como é um mundo novo, um mundo em formação, ainda não sedimentado, eles entram parecendo que é um produto jornalístico. E evidentemente que não é um produto jornalístico do ponto de vista da concepção de jornalismo que a gente conhece. É evidente que você pode ter um jornalismo partidário, um jornal de partido, mas o meu medo é esse, que eles, de certa maneira, eles entram numa área – não é que eles não estejam preparados para entrar nessa área, mas é uma área que procura preservar um mínimo de equilíbrio e é evidente que você não pode pedir equilíbrio a um político, porque é legítimo que ele não seja uma pessoa equilibrada, é legítimo que um político seja uma pessoa com opiniões muito fechadas. Num blogue desses não tem o outro lado, nada. Mas, de um modo geral, é bem-vindo, eu acho bom.


Até porque o cidadão que não concorda pode se expressar. A menos que comecem a vetar opiniões contrárias…


A.G. – Eu acho que esse negócio da liberdade na internet… É bom ter a turma xingando, falando mal da gente, mas realmente… me assusta muito o jeito com que algumas pessoas entram, me agride muito.


A mim também.


A.G. – Eu acho covarde. Porque é alguém que xinga sua mãe que você não vê a cara dele, às vezes ele está escondido atrás de um outro nome. Acho uma covardia. E vi isso principalmente na ocasião do referendo das armas [2005]. Nós, aqui, de boa fé éramos a favor de que se proibisse o comércio. De boa fé, estávamos achando que o comércio de armas não é um bom negócio. Nem havia blogue ainda, mas o que eu recebia de e-mails xingando a minha mãe porque eu era contra o comércio de armas era algo horripilante. Mas, enfim, melhor isso do que o silêncio dos regimes de força.