Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Cortar fundo já é demais

No “Brevíssimo guia para seguir o caixão 2” [2/8] escrevi que “a decisão da CPI dos Correios sobre a quebra do sigilo bancário dos fundos de pensão é incomparavelmente mais importante do que os favores de Valério à ex-mulher do então ministro José Dirceu, do que a renúncia do deputado Valdemar…”

Taí. Na sexta-feira – um dia depois de Roberto Jefferson ligar os fundos ao mensalão – o presidente da CPI dos Correios, senador Delcídio Amaral, do PT, fechou um acordo com o pessoal do pefelê, da tucanagem e do petismo pelo qual não se fala mais em quebrar seja lá o que for dos profundos institutos de previdência das estatais e de empresas privadas.

Ao todo são 366. Têm R$ 280 bilhões para investir. Sete dos dez maiores são controlados por estatais. O patrimônio do maior desses fundos, o Previ, do Banco do Brasil, é de R$ 70 bilhões. Depois dele vem o Petros, da Petrobrás: R$ quase 25 bilhões.

Nada mais necessário que uma CPI sobre a corrupção no governo federal apure se alguns desses mastodontes puseram seu dinheiro a render nos bancos valerianos Rural e BMG, por onde passaram os milhões distribuídos pelo parceiro de Delúbio a políticos petistas e aliados.

O risco sistêmico, outra vez

Qual o quê. Ficou tudo por um pedido de informações à Comissão de Valores Imobiliários (CVM) e à Secretaria de Previdência Complementar sobre as operações dos fundões — e apenas com títulos públicos.

Em defesa do deixa pra lá, Delcídio argumentou que, de qualquer forma, a abertura dos sigilos dos fundos não passaria na comissão. Com certeza. Mas que seria didático acompanhar a votação, lá isso seria.

O pretexto para deixar os fundos quietos não é mais velho do que andar para a frente, mas é quase tão velho como o capitalismo. O mesmíssimo usado pelo Banco Central do Chico Lopes, em 1998, para injetar óleo canforado nos bancos do dottore Salvatore Alberto Cacciola, apanhado no contrapé quando o real manteúdo pelo dólar-gustavinho caiu na real: risco sistêmico.

Mas, como Dora Kramer desmonta a embromação hoje no Estado, “o argumento de que a quebra de sigilo poderia causar turbulências no mercado financeiro é tão verossímil quanto a versão de que tucanos, petistas e pefelistas nada têm a temer com a abertura daquelas caixas-pretas”.

Ou seja, cortar na carne, doa a quem doer, tudo bem. Desde que o corte não seja fundo.