Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Estado presta um serviçÃO

Faz um ano – registra a repórter Dhéas Ramos, no Estado de hoje – que o Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor), que mantém o Observatório da Imprensa, pediu ao Ministério Público que investigasse os parlamentares identificados pelo professor Venício Lima, do Núcleo de Mídia da Universidade de Brasília (UnB), como donos ou controladores de emissoras, o que a Constituição proíbe expressamente (artigos 54 e 55).

Conforme noticiou o Estado em julho passado, eram 51 deputados e 25 senadores. Ou 1 em 10 dos membros da Câmara e cerca de 1 em 3 integrantes do Senado. Em tese – e ponha-se em tese nisso – seriam todos passíveis de cassação.

Entre o pedido do Projor e hoje, aconteceram três coisas:

1. A procuradora Raquel Branquinho foi designada para tocar a investigação.

2. A doutora Branquinho, sempre segundo o Estado, requisitou ao Ministério das Comunicações informações sobre o cadastro oficial de sócios de estações de rádio e TV.

3. Em 1º de outubro houve eleições. Nelas, 31 dos 51 deputados para os quais se pediu investigação se reelegeram, entre eles o neolulista Jader Barbalho, vice-rei do Pará. Trinta e um em 51 dá 61%. Dez pontos acima do índice de reeleição geral na Câmara (51%).

Precisa dizer mais? Precisa:

1. Com mil desculpas pela obviedade, se você for concessionário de órgão de mídia eletrônica, terá uma vantagem de partida sobre os competidores políticos para chegar à frente deles na escalada do poder.

2. Se você for concessionário de órgão de mídia eletrônica e deputado ou senador, terá bala extra na agulha para conseguir a renovação da(s) sua(s) concessão (concessões), depois de 10 anos, no caso de rádios, e 15, de TVs.

3. Nunca, jamais, em tempo algum, o Congresso negou-se a renovar uma concessão. E olhe que, para a recusa, são necessários os votos de 2/5 dos excelentíssimos senhores e senhoras deputados e senadores – ou 238 em 594 – em votação aberta.

4. O Estado presta hoje um servição ao dar ao assunto duas páginas, descontados dois anúncios. A primeira se ocupa principalmente com a reeleição dos deputados-concessionários. (Ou melhor, dos concessionários-deputados.) A segunda, no alto, mostra como se fazem as leis e as salsichas, na clássica frase de Bismarck: ‘Concessões foram renovadas em bloco’, se lê no título. E no sub: ‘Segundo deputados, nem o relator [dos processos] tem acesso a informações sobre o titular da emissora’. Embaixo, na mesma página, ‘Bancada da comunicação nega que descumpra Constituição’ e ‘Parte dos parlamentares alega que não influi na gestão das emissoras’.

Pense nisso ao sintonizar qualquer das emissoras que constam do listão preparado pelo professor Venício no ano passado, atualizado depois da eleição de outubro. Está no jornal.

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