Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Foram os ‘erros’ – não o seu ‘uso’

Uma cadeira vazia e uma pilha de dinheiro numa mesa – duas situações fincadas estrepitosamente na mídia, como não podia deixar de ser – acabaram com a certeza proclamada por Lula, dias antes da entrada em cena dessas imagens, de que iria ‘matar’ a eleição no primeiro turno.

Mas tem gente que não aprende.

O presidente da Câmara, Aldo Rebelo, do PC do B de São Paulo, atribuiu o resultado ao ‘uso do dos erros da campanha por parte dos nossos adversários e da mídia’.

Não foram os ‘erros’ em si. Foi o seu ‘uso’.

Queria o quê o nobre parlamentar: que a oposição não fizesse o maior auê com a ausência de Lula no debate da Globo – contra os conselhos dos seus mais próximos interlocutores petistas? E que a mídia não mostrasse nem a cadeira, nem o dinheiro?

No século 19, no zoológico de Paris, uma tabuleta afixada a uma jaula dizia: ‘Cuidado. Animal perigoso. Quando provocado, reage.’

Lula não foi ao debate por que não quis. O dinheiro do dossiê foi para a mídia porque assim quis um delegado que extrapolou de suas funções, como não tinha ido antes porque assim não quis ‘o advogado de Lula’, ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, chefe do chefe dos federais.

Tudo somado e dividido, pode-se resumir o resultado de ontem a uma certeza:

Não foi Alckmin quem ganhou a chance de ir para o segundo turno. Foi Lula quem perdeu a chance de liquidar a fatura no primeiro.

Semana passada, fazendo um desabafo pessoal, escrevi que torcia para que a eleição se resolvesse na primeira rodada. Não por lulismo, mas para não ter de acompanhar a sangueira que vai ser a nova disputa.

Hoje eu não saberia dizer isso melhor do que o colunista Fernando de Barros e Silva, da Folha:

Ilusão imaginar que a disputa agora plebiscitária irá jogar luz sobre problemas e soluções para o país. A divisão dicotômica entre o bem e o mal será radicalizada. A pauta é a do ‘pega ladrão’ contra ‘golpistas não passarão!‘.

Assino embaixo também de seu diagnóstico:

A candidatura Alckmin vem contemplar, mais do que uma demanda ética, o moralismo tacanho de uma classe média que mistura sua justa indignação contra a corrupção com um preconceito inexpugnável em relação ao operário que ascendeu ao topo da República. O governo Lula deu pretextos para o ‘liberou geral’ que os adversários incubavam.

E o pior, olhando em retrospecto, é que Lula não precisava dar os pretextos que deu para fazer o muito que fez de bom pelos pobres do país.

Mas isto os patrulheiros que andaram me chamando de tudo quanto é nome nas últimas semanas, porque me recusava, e me recuso, a aceitar a teoria do ‘complô da mídia’ contra Lula, dificilmente conseguirão entender.

P.S.

Desculpas por publicar apenas hoje comentários enviados no fim da semana. É que o UOL, pelo qual acesso a internet, esteve fora do ar praticamente o domingo inteiro. Por isso eu tampouco pude publicar um artigo que havia preparado para ontem.

Nele eu dizia que a assim como tinha o direito de publicar as fotos do dinheiro que ía comprar o dossiê, a mídia tem a obrigação de ir ao fundo da questão das motivações e eventuais interesses do delegado Bruno em divulgá-las.

Dizia também que se a mídia agiu certo ao cumprir o compromisso assumido com ele de não identificá-lo, errou feio ao não publicar, junto as fotos, o que ele disse ao entregá-las.

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