Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O site YouTube torna-se a nova grande arena na propaganda eleitoral

Os especialistas em comunicação já não têm mais muitas dúvidas. Para eles, um dos segredos da vitória do senador Barack Obama sobre sua rival Hillary Clinton, nas primárias do partido democrata nos Estados Unidos, está no YouTube, uma página para publicação de vídeos na Web e que se tornou famosa no Brasil por conta do episódio Daniela Cicarelli.


 


A televisão comercial está a ponto de perder para o YouTube o privilégio de ser o palco principal dos candidatos norte-americanos em matéria de imagens. Mas esta emergente tendência não marca apenas uma mudança de canal, mas trás embutida uma não menos polêmica mudança de comportamentos, tanto por parte do público como dos candidatos.


 


O crescente uso do Youtube como ferramenta eleitoral marca um fortalecimento do protagonismo dos eleitores durante as campanhas, na medida em que na televisão eles não têm escolha na hora de assistir vídeos de propaganda política, enquanto na Web os internautas decidem o que vão ver e quando. Enquanto na TV, o eleitor é relegado a uma atitude passiva, na Web, ele é um personagem proativo.


 


Obama ganhou de Hillary neste quesito porque apostou na Web desde o primeiro momento de sua campanha. Seu staff e o próprio candidato tinham mais intimidade com a informalidade da internet do que com as luzes e scripts da televisão convencional.


 


Enquanto Hillary Clinton lançou sua campanha usando imagens bem comportadas , Obama foi provocativo e irônico ao anunciar sua candidatura usando o vídeo entitulado Vote Different (vote diferente), que combina  imagens do famoso comercial de lançamento dos computadores Macintosh, em 1984, com um discurso de Hillary.


 


O comercial, que se tornou uma referência na história da publicidade, mostra o desafio de uma mulher (representando o Macintosh) contra uma estrutura massificadora (uma alusão à então toda poderosa IBM) usando como pretexto o livro 1984, de George Orwell. A frase final do vídeo é: “No dia 14 de janeiro, começam as primárias democratas. Você vai ver como 2008, não será igual a 1984”. 


 


Os responsáveis pela comunicação na campanha do senador pelo estado de Illinois, usaram e abusaram do modelo mash up, no qual são feitas modificações sobre um vídeo original para criar uma nova mensagem, geralmente ironizando o conteúdo original.


 


A senadora e seus assessores não se deram conta do efeito viral dos vídeos modificados pelos seguidores de Obama, alguns dos quais chegaram a ter mais de 10 milhões de visitantes.


 


Mas a mudança mais significativa talvez tenha sido a nova postura diante das câmeras. Obama quebrou com o formalismo e introduziu a regra do improviso que se mostrou extremamente eficiente na internet. “ A autenticidade passou a ser muito mais valorizada do que as aparições cuidadosamente planejadas, às quais Hillary estava mais acostumada”, explica Michael Cornfeld , professor da universidade de Washington e analista da mídia.


 


Isto significa que muito provavelmente o estilo das imagens em campanhas eleitorais vai passar por algumas mudanças significativas. Além da informalidade e sentido de humor, os candidatos terão que reagir com muita rapidez à situações inesperadas.


 


Obama passou por maus bocados quando se tornaram conhecidas declarações de cunho racista do seu ex-pastor Rev. Jeremiah Wright, mas não esperou mais que algumas horas para gravar um discurso sobre a polêmica questão do racismo nos Estados Unidos. O discurso foi visto por mais de cinco milhões de pessoas, só no YouTube, e o candidato conseguiu sair incólume do episódio.


 


Já Hillary demorou quase uma semana para apagar o incêndio provocado por equivocadas declarações a respeito de uma visita sua à Bósnia, em 1996.


 


Mas, ainda segundo o professor Michael Cornfeld, o sucesso em vídeos eleitorais num ambiente em que a TV e a Web disputam a atenção dos eleitores, não depende mais do fato do candidato ser telegênico ou não. O fator determinante passa a ser a a capacidade ou não dos candidatos de aceitar a perda de controle sobre as imagens da campanha.


 


Hillary e os democratas mais convencionais mostraram-se claramente desconfortáveis com a irreverência da Web enquanto Obama, por seu menos formal foi mais tolerante e com isto acabou ganhando as preferências dos internautas.


 


Ao que tudo indica, o efeito YouTube ainda vai provocar muita celeuma pois o que está se verificando com uma clareza cada vez maior é a vulnerabilidade dos esquemas tradicionais de campanha eleitoral a medida que aumenta a participação dos eleitores via internet.