Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Os riscos de uma idéia razoável

Quando um governo subsidia micro e pequenas empresas em geral, os seus clientes não correm o risco de comprarem delas bens ou serviços cuja natureza e qualidade tenham sido atingidos pelos estímulos concedidos aos fornecedores. Os produtos vendidos por uma pequena confecção beneficiada pelo poder público, por exemplo, não prejudicarão – em razão disso – os seus consumidores.

Mas o mesmo não se pode dizer, necessariamente, dos produtos de pequenas empresas de mídia incentivadas pelo governo com redução de impostos ou aumento da sua participação na distribuição do bolo publicitário oficial, para democratizar a mídia.

A concentração da mídia faz mal à democracia, e são legítimos, em princípio, planos e propostas para contrabalançar essa distorção, cada vez mais acentuada no mundo inteiro – apesar do ilimitado espaço que a internet proporciona à diversidade de informações e opiniões.

Nem por isso devem ser ignorados os potenciais efeitos perversos, por indesejáveis, de qualquer política de apoio a órgãos de comunicação que dão um duro danado para sobreviver, diante do poder esmagador dos colossos do ramo.

Quando o PT propõe, como informa hoje a Folha, que o governo não se guie apenas por critérios de mercado – o poder de penetração de jornais, revistas e emissoras – para escolher onde anunciar, parte de uma realidade inegável.

Como diz o dirigente Valter Pomar, ‘a mídia brasileira é muito monopolista. É um grupo pequeno de empresas controlado por um grupo pequeno de famílias. Isso vai criando uma espécie de círculo vicioso. Como são grandes, recebem uma cota maior, e graças a essa cota maior continuam grandes’.

No entanto, também procede a questão de como saber se o incentivo econômico oficial a órgãos de comunicação presumivelmente independentes – a juízo dos incentivadores, é claro – ‘não transformaria tais veículos menores em órgãos oficiosos do Planalto’, como se pergunta a Folha.

É mais ou menos como dizia o escritor americano Upton Sinclair, citado no admirável filme ‘Uma verdade inconveniente’, sobre o aquecimento global:

‘É muito difícil encontrar alguém que entenda uma coisa quando o seu salário depende de não entendê-la.’

Quando o ‘salário’ de uma pequena organização jornalística depender de ela não ‘entender’ os eventuais malfeitos do governo que o paga, a conta sobrará inevitavelmente para o interesse público.

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