Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Para entender o giro de Bush

Se você tivesse que ler um único texto do que já foi publicado sobre a viagem de Bush à América Latina, o editorial de hoje do Guardian de Londres, intitulado “Bush rumo ao seu quintal”, poderia ser uma boa pedida. Lá vai:

“George Bush voou ontem para o Brasil, o primeiro trecho de um giro pela América Latina, com uma mensagem simples: os Estados Unidos se preocupam. A viagem de uma seman foi construída para contrabalançar a percepção de que Washington negligenciou o seu quintal desde 11 de setembro de 2001, embora muitos possam estar gratos pelo longo período de negligência. Nesse meio tempo, o equilíbrio de forças na região se deslocou. A mistura de socialismo, populismo, óbolos do petróleo e um fluxo de invectivas anti-Bush, de Hugo Chávez, tem um apelo forte e compreensível além das fronteiras da Venezuela. Houve disparos que por pouco não erraram o alvo na Nicarágua e no Equador, mas Chávez pode contar hoje com o sólido apoio de Evo Morales, na Bolívia, a camaradagem de Néstor Kirchner, na Argentina, e a simpatia da Nicarágua. Se existe uma agenda na visita de Bush, é a da contenção de Chávez.

Enterrado nas areias do Oriente Médio, o presidente americano chegou à tardia conclusão de que também na América Latina a atual política dos Estados Unidos, armada em torno de acordos de livre-comércio e da guerra ao tráfico, não funcionou. Só na Argentina, Chávez usou o seu dinheiro do petróleo para comprar US$ 1,5 bilhão em títulos, socorrer um produtor de laticínios e transportar favelados em aviões para tratamento médico no exterior. A ajuda anual dos EUA à região tem sido de apenas US$ 1,6 bilhão, a maior parte gasta com as forças armadas colombianas.

Em agosto passado, Washington foi acusada de despejar milhões num “programa pró-democracia”, financiando a oposição anti-Chávez. Os clandestinos programas americanos de mudança de regime são maná do céu para Chávez, que já sobreviveu a uma tentativa de golpe em 2002 e foi reeleito no fim do ano passado. Agora, Bush está mudando de tática. Ele descobriu estar preocupado com os milhões [de latino-americanos] que vivem com menos de US$ 2 por dia. Deve ser, em ampla medida, retórica: o que impede os produtores brasileiros de etanol de exportar mais biocombustível para o mercado norte-americano não é falta de demanda, mas as barreiras tarifárias dos EUA.

Ainda assim, o novo pragmatismo de Washington – até onde vá – é bem-vindo. Trabalhando em favor dos EUA é uma disseminada desconfiança de Chávez entre líderes de todas as tonalidades políticas. O presidente brasileiro Lula tem um relação tensionada com o líder venezuelano, e propriedades brasileiras no setor energético foram nacionalizadas na Bolívia. O esquerdista presidente uruguaio Tabaré Vázquez, que lidera uma coalizão que inclui antigos guerrilheiros tupamaros, também está em guarda. Mas os que eles e Felipe Calderón, do México (que deseja um acordo melhor sobre direitos de imigração) necessitam é de uma política americana que consigam apoiar. Qualquer líder latino-americano sabe que Bush tem menos de dois anos pela frente no cargo. Para conquistar as suas simpatias, precisa mostrar que a política americana vai além de sua batalha pessoal com Chávez.”

Pela tradução, L.W.

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