Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Quem paga o flautista dá o tom

O melhor da última resolução do PT, na área de mídia, é a defesa da criação de uma rede nacional de TV pública no país – uma BBC brasileira.

A octogenária British Broadcasting Corporation, a contar da era do rádio, é – no mínimo dos mínimos – o modelo menos imperfeito de jornalismo independente de alta qualidade que se conhece na mídia eletrônica em todo o mundo.

A independência da BBC em relação aos governos britânicos e ao Estado monárquico se apóia, de um lado, na complexa arquitetura institucional criada exatamente para esse fim, e, de outro, no fato decisivo de ser sustentada pelo público, literalmente.

Se você mora nas Ilhas Britânicas e tem uma TV em cores, pagará uma taxa anual de 131,50 libras [cerca de R$ 550]. O dinheiro vai todo para a BBC.

Esse é o nó da questão. A experiência das TVs educativas brasileiras, custeadas pelos governos, mostra que, em graus variados, vale o velho ditado americano: ‘Quem paga o flautista dá o tom.’

Ainda hoje, por exemplo, a Folha informa, na coluna Painel:

‘José Serra pretende fazer mudanças na TV Cultura e portanto na Fundação Padre Anchieta, que administra a emissora pública. (…) O calendário da FPA prevê que o novo presidente seja eleito pelo conselho [curador] no final do primeiro semestre.’

A distância entre o Palácio dos Bandeirantes e a TV Cultura sempre foi menor do que entre o Morumbi e a Água Branca, onde governo e emissora têm as suas sedes.

Em outros Estados, a distância é incomparavelmente menor – quando existe.

TV é um brinquedo caro e obviamente não há hipótese de uma rede nacional pública ser bancada no Brasil diretamente pela população, na escala requerida para cobrir a robusta fatura do futuro sistema, criando-se as condições necessárias – e ainda assim insuficientes – para torná-lo autônomo dos governos de turno.

E que ninguém se engane: quaisquer que sejam esses governos, cabendo-lhes arcar com o custeio do sistema, a sua tendência natural será a de ‘privatizar’ politicamente a Rede Brasil, ou como venha a se chamar a BBC brasileira.

Mesmo que o público pagasse a conta, à moda britânica, já não seria fácil blindar o sistema contra a intromissão governamental. Sem isso, então…

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